Nunca se chegou tão perto de punir os corruptores
Sob a batuta do juiz Sergio Moro, Paulo Roberto Costa delatou a maior empreiteira do País, a Odebrecht, que lhe pagou uma propina de US$ 23 milhões; com isso, a empresa de Emílio e Marcelo Odebrecht concorre para ser a primeira da fila a ter seus responsáveis presos como corruptores; "Não há brechas para nulidades", diz um dos investigadores do caso; empresa alega que não pagou, mas a delação de Costa prevê que, em caso de mentira, ele volta imediatamente para a cadeia; ou seja, em quem você acredita?
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247 – Pela primeira vez na história, o Brasil está perto de prender corruptores – aqueles personagens até aqui nunca punidos por alimentar os corruptos, provocar sobrepreços e garantir reservas de mercados. A oportunidade está aberta pelo meticuloso trabalho do juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, considerado a maior referência contra crimes financeiros do País. Ele guiou com rigor e precisão a delação premiada do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e obteve como resultado desse trabalho um calhamaço de documentos como depósitos milionários feitos nas contas dele no exterior, extratos bancários com a movimentação ilegal e notas fiscais comprobatórias de sobrepreço em obras e serviços prestados. No rol dos corruptores, 13 empresas, entre as quais as cinco maiores empreiteiras brasileiras – Camargo Corrêa, OAS, Queiroz Galvão, Andrade Gutierrez e Norberto Odebrecht. Destas Big Five, a Odebrecht, considerada a Big One, pode ser a primeira da fila a ter responsáveis presos. A empreiteira tem em Emílio Odebrecht o presidente do seu Conselho de Administração e no filho dele, Marcelo Odebrecht, o presidente executivo.
- Temos um caso completamente diferente de todos os outros dessa espécie, diz uma fonte ligada às investigações, comparando as operações Lava Jato e Castelo de Areia. Nesta última, deflagrada em 2009, o início de operações policiais a partir de escutas telefônicas levou a Justiça a anular a maior parte das investigações, que implicaram um vice-presidente e um integrante do conselho de administração da empreiteira Camargo Corrêa. Agora, como diz o investigador, é diferente.
- Não há espaço para nulidades porque pelo menos noventa por cento das provas são documentais. Tudo o que Costa falou veio acompanhado por provas muito fortes.
Ao confessar que juntou, em contas bancárias nas Ilhas Cayman e na Suíça, o equivalente a R$ 63,9 milhões como produto de "atos criminosos", Costa, no papel de corrupto, apontou, com os documentos que guardou, os corruptores. Ele se comprometeu a promover "todos os atos necessários" para a repatriação do dinheiro aos cofres da União. Ao concretizar essa promessa oficial, estará feita a maior recuperação de dinheiro fruto de corrupção já vista no Brasil. Para se ter uma ideia, nos dez anos de funcionamento do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional (DRCI) do Ministério da Justiça, tudo o que se conseguiu trazer de volta do exterior foram R$ 40 milhões.
Emílio e Marcelo Odebrecht têm 23 milhões de dólares em motivos para se preocuparem. Assim que iniciou a delação, depois de cinco meses preso, Costa informou que, em 2010 e 2011, recebeu como um mimo US$ 23 milhões da Odebrecht, que ele logo depositou no exterior. A empreiteira não queria ser incomodada em seus negócios. Agora, com todo o rastreamento de sua movimentação bancária, como datas de depósitos, pagamentos e saques, os investigadores acreditam que falta pouco para implicar diretamente, como corruptores, os cabeças da empreiteira baiana.
As provas estão aparecendo, também, pelo cruzamento das informações dadas por Costa e, no mesmo sistema de delação premiada, pelo doleiro Alberto Yousseff. As denúncias só se fortaleceram.
- O mais interessante é que a prova é feita em cima do 'caixa 1'. As empresas de Youseff emitiram notas para a contabilidade oficial dessas empresas, empreiteiras e consórcios, porque isso tem de ser colocado no Imposto de Renda", diz o investigador.
No caso das operações por meio do doleiro, o golpe em cima da Petrobras não era nem o de sobrepreço, mas sim de obras e serviços não realizados.
Os Odebrecht, assim como os titulares das outras quatro grandes empreiteiras, incluídas no total de 13 empresas citadas como corruptoras por Costa, têm mesmo uma parada indigesta pela frente. Defendidos pelo ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, que também advoga para a Camargo Corrêa, Emílio e Marcelo terão, a certa altura do processo, de se avistar com o juiz Moro. Titula da Vara Federal de Curitiba, ele é considerado o mais implacável especialista do País em crimes financeiros. Ao conduzir o maior julgamento de doleiros do País, entre 2003 e 2007, no chamado caso Banestado, Moro promoveu 97 condenações sob acusação de remessa ilegal de US$ 28 milhões ao exterior. As multas aplicadas pela Receita Federal, com base no julgamento, chegaram a R$ 8,4 bilhões. O caso introduziu uma série de atualizações no Direito Pena brasileiro. Dos Estados Unidos, por exemplo, o juiz Moro conseguiu obter nada menos que um contêiner em documentos.
Caso o juiz Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, que tem a palavra sobre um possível desmembramento do julgamento do caso, os Odebrecht não têm como escapar de Moro. Mas se Zavascki requisitar todo o processo para o STF, pai e filho terão um caso a ser defendido no próprio Supremo, à vista, ao vivo, da Nação, via TV Justiça. Nos dois casos, uma situação nada agradável.
Após dezenas de casos de corrupção que ocuparam a mídia nos últimos 20 anos, como o dos Anões do Orçamento, do juiz Nicolau dos Santos Neto, do TRT paulista e da Pasta Rosa, finalmente chega-se ao ponto que não somente os corruptos, mas os corruptores poderão sentar no banco dos réus e, dali, irem para a cadeia. Os titulares das Big Five e, em particular, os chefes da Big One estão na alça de mira da Justiça.
Em nota, a Odebrecht alega não ter pago a propina de US$ 23 milhões. No entanto, a delação premiada prevê que, em caso de incriminação falsa, Paulo Roberto Costa volta imediatamente para a prisão.
Se ele já aceitou devolver todos os recursos desviados, é difícil acreditar que ele possa estar mentindo.
No caso da Odebrecht, há ainda um complicador adicional. Em qualquer empresa do mundo, uma propina tão grande, de US$ 23 milhões (equivalente a R$ 57 milhões) seria paga sem o conhecimento dos donos?
Num país que passou a aplicar recentemente a "teoria do domínio do fato", é difícil imaginar que o juiz Sergio Moro perderá a chance de punir tubarões tão vistosos.
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