Maioria do STF descriminaliza aborto de anencéfalos

Por oito votos a dois, num julgamento histrico, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a interrupo da gravidez de feto anencfalo (sem crebro) no aborto e, portanto, no pode ser criminalizada

Maioria do STF descriminaliza aborto de anencéfalos
Maioria do STF descriminaliza aborto de anencéfalos (Foto: Nelson Jr./SCO/STF)


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Fernando Porfírio _247 - Por oito votos a dois, num julgamento histórico, o Supremo Tribunal Federal decidiu, nesta quinta-feira (12), que a interrupção da gravidez de feto anencéfalo (sem cérebro) não é aborto e, portanto, não pode ser criminalizada.

O julgamento durou dois dias. No primeiro, terminou com o placar de cinco a um a favor da ação para permitir que gestantes de fetos anencéfalos tenham o direito de interromper a gravidez. Apenas o ministro Ricardo Lewandoski havia votado contra.

O julgamento foi concluído com o voto do presidente do STF, ministro Cezar Peluso. Ele acompanhou seu colega Ricardo Lewandowiski. Para os dois, permitir o aborto de anencéfalo é dar autorização judicial para se cometer um crime.

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“Este é o mais importante julgamento na história desta Corte, porque nela se tenta definir no fundo o alcance constitucional do conceito de vida e da sua tutela normativa”, afirmou Peluso ao iniciar seu voto.

De acordo o presidente do STF, a vida humana não pode ser “relativizada” segundo o que chamou de “escala cruel” para definir quem tem ou não direito a ela. Para Peluso, outras doenças fatais encurtam o tempo de vida e, nem por isso, autorizam a relativização do direito à vida. “O feto anencefalo tem vida e, ainda que breve, sua vida é constitucionalmente protegida”, disse o ministro.

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O primeiro a votar nesta quinta-feira foi o futuro presidente da corte suprema do país, ministro Ayres Britto. O voto de Britto definiu o resultado do julgamento. O ministro entendeu que não é razoável obrigar uma mulher a carregar em seu ventre um feto cuja possibilidade de vida não existe.

Segundo Britto, a gestação de feto anencéfalo não passa de uma fraude, de “um arremedo de gravidez”. O ministro ressaltou que não há normas que identifiquem o início da vida. “À luz da Constituição não há definição sobre o início da vida. É estranho criminalizar o aborto sem a definição de quando se inicia a vida humana”, afirmou.

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Sobre os fetos anencéfalos, Ayres Britto afirmou que não é possível confundir embrião de vida humana com vida humana embrionária. “O crime deixa de existir se o deliberado desfazimento da gestação não é impeditivo desse organismo se transformar em uma pessoa humana”, sustentou.

Na opinião do ministro, a interrupção de gravidez de feto anencéfalo só pode ser chamada de aborto de forma coloquial. “Dar à luz nestes casos chega a ser um paradoxo. Um eufemismo. Não vai dar à luz coisa nenhuma”.

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Os ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes sugeriram que o Ministério da Saúde e o Conselho Federal de Medicina adotem medidas para viabilizar o aborto nos casos de anencefalia para as mulheres que fizerem esta opção. Segundo eles, é importante que haja certeza na identificação do problema e que o médico que fará o aborto não seja o mesmo que fez o diagnóstico.

Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes lembrou que desde 1940 (com a edição do Código Penal), a sociedade brasileira convive com a descriminalização do aborto em casos de estupro e de risco à saúde da mãe. Por isso, em sua opinião, a possibilidade de aborto de fetos anencéfalos está autorizada desde então, tendo em vista que, comprovadamente, gestação nesses casos traz graves riscos à saúde da gestante.

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“O aborto de fetos anencéfalos está certamente compreendido, parece-me, entre as duas excludentes da ilicitude, já previstas no Código Penal. Todavia, era inimaginável para o legislador de 1940 prever essa circunstância, em razão das próprias limitações tecnológicas existentes”, afirmou Gilmar Mendes.

Celso de Mello citou resolução do Conselho Federal de Medicina que considera o feto anencéfalo como natimorto. “Não pode ser considerada na tipicidade penal a conduta da mulher gestante e de quem a auxilie no processo de antecipação terapêutica do parto [no caso de anencéfalos].”

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Na quarta-feira (11), o relator Marco Aurélio de Mello, Rosa Maria Weber, Joaquim Barbosa, Luiz Fux e Carmen Lucia, votaram a favor da descriminalização no caso de interrupção de gravidez de fetos anencéfalos. A maioria defende como inconstitucional a interpretação segundo a qual a interrupção de gravidez de fetos sem cérebro é conduta tipificada no Código Penal.

O ministro Dias Toffoli se declarou impedido por ter atuado no parecer elaborado pela Advocacia-Geral da União (AGU) a favor da ação. Na época o agora ministro ocupava o cargo de advogado-geral.

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Segundo Lewandowski, não se trata de interrupção de gravidez de anencéfalo, mas sim de aborto em uma condição não prevista pelo Código Penal. “Até agora os parlamentares decidiram manter intacta a lei penal, excluída as duas hipóteses [estupro e risco de vida da mãe]”, disse. O ministro afirmou que o Supremo só pode legislar de forma negativa, “para extirpar do texto jurídico o que contradita ao texto constitucional".

O relator da ação, ministro Marco Aurélio de Mello, afirmou que dogmas religiosos não podem guiar decisões estatais e fetos com ausência parcial ou total de cérebro não tem vida. “Hoje é consensual no Brasil e no mundo que a morte se diagnostica pela morte cerebral. Quem não tem cérebro não tem vida”, disse. “Aborto é crime contra a vida em potencial. No caso da anencefalia, a vida não é possível. O feto está juridicamente morto”.

A ministra Rosa Maria Weber admitiu que conceitos científicos são mutáveis e considerou que anencéfalos podem sobreviver por meses – o que médicos negam. Mas acabou votando a favor da interrupção da gravidez nesses casos “porque não está em jogo o direito do feto, mas sim da mulher”.

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