Louvação compulsória

Ministério Público dá bola dentro ao questionar a legitimidade da frase “Deus seja louvado” nas notas de real



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Quando surge a notícia de que o Ministério Público ajuizou uma ação civil pública em que pede que as notas de real sejam impressas sem a expressão "Deus seja louvado", muita gente torce o nariz e pensa: "Lá vem aqueles ateus pentelhos de novo."

De tempos em tempos volta o debate sobre o fato de o Brasil ser ou não um país laico. Apesar de a própria Constituição de 88 assegurar que não há uma religião oficial, uma breve circulada pelos órgãos públicos revela uma profusão de crucifixos dependurados. E o mesmo documento invoca "a proteção de Deus" já no preâmbulo.

Ocorre que esses símbolos representam todos os cidadãos, inclusive os que preferem viver num regime dessacralizado. Ao questionar a legitimidade da frase "deus seja louvado" nas cédulas usadas por todos os brasileiros, o Ministério Público está simplesmente exercendo um direito legítimo num país republicano.

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Deus não é o tipo de cara que Se importa se o Seu nome está ou não impresso no vil metal dos seres humanos. Se fosse possível consultá-Lo, é bem provável que declinasse do privilégio, e até apoiasse a ação civil do Ministério Público. "Não precisa disso", diria Ele que, de tão humilde, se priva de ficar por aí aparecendo. Sua obra fala por si mesma, eis o fato.

Se a louvação compulsória fosse mesmo extinta do dinheiro, caberia à Casa da Moeda e ao Poder Executivo a tarefa de inventar novas mensagens, provavelmente de caráter pedagógico, que estimulassem a multiplicação da cidadania entre todos. Bem mais útil: "Jogue o lixo no lixo", "não maltrate os animais/destrua a natureza", "Respeite os sinais de trânsito" ou, pra delírio dos politicamente corretos, "Se for dirigir, não beba."

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Se isso teria ou não algum efeito prático, é outra história. Ao lançar a campanha "Conte até 10", por exemplo, o Governo Federal espera reduzir o número de homicídios cometidos "por impulso." O sonho quixotesco da campanha é supor que uma pessoa, na iminência de cometer um homicídio, vá deixar de fazê-lo não porque pode ser condenada a quarenta anos de reclusão, mas porque viu Anderson Silva garantir na televisão que o negócio, nessas situações de stress, é ficar calmo.

Inútil por inútil, nada se compara ao enorme desperdício de tinta que é imprimir "Deus seja louvado" em todas as notas que saem da Casa da Moeda. Botando o preto-no-branco, já que estamos falando de dinheiro, mais útil seria gravar logo "Não se esqueça de contar o troco" ou fazer lotes de edições comemorativas, com expressões como "Fluminense Campeão Brasileiro."

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A coisa tornar-se-ia uma espécie de mercado paralelo pra colecionadores, como acontece com os selos. O dinheiro ia valer ainda mais dinheiro. E Ele seria louvado em outro lugar.

Já foi fartamente provado que quase ninguém sabe cantar o hino nacional inteiro, cheio de frases barrocas e arcaísmos. Tampouco o lema positivista "Ordem e Progresso" reflete honestamente o caráter dos nossos conterrâneos, como já foi dito nos livros de Sergio Buarque, Gilberto Freire e outros sociólogos e antropólogos que investigam o caráter do brasileiro. Podemos, sim, criticar esses símbolos. Eles não são sagrados. E representam todos.

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Símbolos inatacáveis e figuras insatirizáveis pertencem a outro lugar do mundo.

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