Falta d'água iminente: realidade ou ficção?

Deveríamos acordar e pensar em como seria se um dia descobríssemos que nossas reservas de água potável chegaram ao fim



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Uma vez a cada tanto, deveríamos acordar e pensar em como seria se um dia descobríssemos que nossas reservas de água potável chegaram ao fim e que sob regime de racionamento tivéssemos cota de água apenas suficiente para matar a sede e não morrer. Não é difícil imaginar. Levantar e não poder tomar banho, lavar louças, roupas, ou aguar nossas plantas. Bastariam alguns dias, e, com certeza, as flores estariam secas, as moscas teriam tomado conta da cozinha e nós, transformados em criaturas sujas e malcheirosas. Filme de ficção apenas? Nem tanto.

O território do Distrito Federal apresenta hoje demandas para medidas de proteção e recuperação ambiental em todo o seu perímetro, de parte dos órgão governamentais, e, principalmente, de iniciativas da sociedade. Neste momento em que a humanidade enfrenta o desafio da preservação dos recursos hídricos, dramático em face do processo de desertificação que ocorre em várias regiões do mundo, é de extrema importância compreender a necessidade de preservação das águas da região do Cerrado do Planalto Central.

A existência aqui das nascentes das três principais bacias hidrográficas do País, Amazônica, Platina e a do São Francisco, foi argumento constante na nossa história para a decisão política da escolha do local para a construção de Brasília. Memórias registradas em constituições brasileiras, mapas e documentos deixam claro esse discernimento.

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Botânicos, geógrafos, historiadores e políticos acreditavam que instalar aqui a capital contribuiria, também, para a proteção desse gigantesco rendilhado de mananciais e pequenos cursos d'água do DF por onde escoam anualmente quase 10 bilhões de metros cúbicos de água, e cujas principais nascentes se encontram hoje dentro da Estação Ecológica de Águas Emendadas, criada exatamente para este fim. Lá, partindo de uma só vereda, vertem para o Norte as nascentes do rios Maranhão/Tocantins e para o Sul a dos rios São Bartolomeu/Paraná).

A história, no entanto, não confirmou a crença da ocupação com preservação dos mananciais. O Cerrado, segundo maior bioma brasileiro e considerado a savana mais biodiversa do planeta, perdeu grande parte de sua cobertura vegetal nos últimos 50 anos, devido a um crescimento de 650% em sua ocupação urbana, ao rápido avanço da fronteira agrícola e da pecuária extensiva na região. Aqui no DF, os mapas do Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Distrito Federal- IBRAM mostram que 70% da cobertura vegetal já desapareceu, apesar de 93% do nosso território estar protegido legalmente por 33 unidades de conservação.

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O desmatamento e a ocupação desordenada representam uma ameaça constante e estão, obviamente, diretamente relacionados com a preservação das nascentes e rios locais e com a quantidade e qualidade da água usada para o abastecimento da população. As potencialidades hídricas da região, tem sido desde a sua ocupação, e mais especificamente nos últimos 20 anos, desordenadamente destruídas, sem a busca de um aproveitamento econômico equilibrado.

Diagnósticos ambientais realizados recentemente apontam para uma triste conclusão: a quantidade de água existente no lençol freático na região do DF diminuiu muito nos últimos 40 anos; o nível das águas de Lagoa Bonita, por exemplo, baixou cerca de 5 metros e muitas das nascentes dentro da Estação Ecológica de Águas Emendadas desapareceram ou secaram. Se dentro de uma área protegida isso acontece, imaginemos fora.

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Nas últimas décadas, vários governos do Distrito Federal vem permitindo que invasões ilegais em áreas de proteção ambiental aconteçam, cresçam e se instalem de maneira irreversível. Áreas rurais se urbanizam e condomínios irregulares se multiplicam. A ilegalidade virou moda e prova de inteligência. Se posso invadir porque vou trabalhar para comprar um terreno e pagar por ele?

Os parcelamentos irregulares, que em 1987 eram 15, dentro da Área de Proteção Ambiental-APA do São Bartolomeu, em 22 anos passaram a 513, grande parte deles em áreas supostamente protegidas. E os invasores, como qualquer ser humano deste século, querem luz, querem asfalto, querem água. Invadem e depois reclamam que não tem hospital , escola e segurança pública perto de suas casas.

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Até quando vamos permitir que Brasília e seu entorno cresça indefinidamente e sem planejamento ? As invasões acontecem porque existem bandidos vendendo lotes ilegais; cidadãos desonestos comprando mesmo sabendo que estão agindo fora da lei; e governos com políticas eleitoreiras dando lotes em troca de votos para aqueles cidadãos que na sua simplicidade e ignorância acreditam que o Estado deve ser o grande provedor e que o voto é uma moeda de troca e não o mais básico ato político de regimes democráticos.

Esta situação não pode se estender para sempre. Cabe ao governo criar políticas públicas de planejamento urbano e fiscalização mas nós devemos nos perguntar o que fazer para que nossos filhos e netos não sofram com a falta d'água no Distrito Federal. Para que a ficção não se transforme em realidade, devemos sim contribuir: recuperar matas ciliares ao invés de desmatar, não invadir, construir ou poluir áreas de nascentes, não furar poços artesianos sem a devida autorização, não abandonar torneiras abertas na pia, no chuveiro, nas mangueiras dos jardins, nas calçadas. Cada um de nós deve passar a olhar uma conta de água alta, não apenas como prejuízo ao bolso, mas como um ataque ao planeta, à biodiversidade do Cerrado, e a este bem precioso que hoje usamos como se suas reservas não tivessem fim.

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Estudar e preservar o Cerrado e sua importância para a segurança hídrica do País, é matéria que já deveria ter sido incluída, como premissa constitucional, nos currículos escolares, a exemplo do que já ocorreu com a floresta Atlântica e a Amazônia. Seguindo este caminho estaríamos contribuindo para a revelação de uma das nossas mais complexas e desconhecidas realidades vitais.

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