Delator de Duque e Baiano vende suas joias: cavalos
Julio Camargo, primeiro delator da segunda leva de prisões da Operação Lava-Jato, coloca todos os seus 130 cavalos de corrida à venda; ele entregou ex-diretor Renato Duque e o lobista Fernando Baiano, e se comprometeu a devolver aos cofres públicos R$ 40 milhões; elo entre a Petrobras e o poderoso banco de fomento japonês Eximbank, que financiava projetos encaminhados pela sua Toyo Setal, Camargo está solto graças ao acordo de delação; cordato, educado e discreto, ele é dono do renomado Haras Old Friends e da melhor égua em atividade no Brasil, a invicta Sai de Baixo, avaliada em pelo menos R$ 1 milhão; nome ficou emblemático da situação que ele vive; exclusivo
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Marco Damiani, 247 – Um lote com 130 dos melhores cavalos de corrida e reprodutores Puro Sangue Inglês (PSI) do Brasil vai a martelo nos próximos dias 11 e 12, nas antevésperas do Natal. Motivo: a Operação Lava-Jato. A tropa campeã pode valer, por baixo por baixo, cerca de 10 milhões de reais. Ocorre que o dono do renomado Haras Old Friends, promotor do leilão total de seu plantel, que inclui a melhor égua brasileira da atualidade – a invicta, recordista de velocidade e agora emblemática Sai de Baixo - é o empresário Julio Camargo.
Duas semanas atrás, Camargo foi forçado a deixar a tranquilidade das cocheiras e a emoção das pistas para ir parar nas primeiras páginas dos jornais ao assinar o primeiro termo de delação premiada na segunda leva de prisões pela Lava-Jato. Ele se tornou, diante do juiz Sergio Moro, um dos mais valiosos elementos da investigação. Cordato e discreto, Camargo delatou ninguém menos que o ex-diretor da Petrobras Renato Duque e o lobista Fernando Baiano, que até então não figuravam entre os suspeitos. Na sua confissão, o empresário aceitou devolver aos cofres públicos R$ 40 milhões, produto que ele reconheceu como sendo de comissões ilegais. Está, para isso, vendendo as jóias de sua coroa de um dos reis do turfe nacional.
Na estrutura investigada pela Lava-Jato, Camargo, assim como no exclusivo e fechado mundo do turfe brasileiro, tornou-se um campeão. Tanto que, em troca de contar o que sabe, ele não foi preso. Responsável pela Toyo Setal, o empresário intermediava contratos de milhões e bilhões de dólares entre fornecedores de alta tecnologia para a Petrobras e o riquíssimo banco de fomento japonês Eximbank. Num diferencial estratégico espetacular, ele conseguia apresentar à estatal empresas que participavam da construção de navios, plataformas e refinarias petrolíferas que já chegavam à Petrobras com contratos de financiamento com o Eximbank praticamente assegurados. Um negócio sofisticado, mas que seria absolutamente limpo não fossem as propinas milionárias pagas no meio do percurso.
MAIS DE R$ 100 MILHÕES EM PROPINAS - A lista de malfeitos apresentada na delação de Camargo e de seu sócio Augusto Mendonça Neto na Toyo Setal é farta. Ambos confessaram terem pago entre R$ 40 milhões e R$ 50 milhões de propina ao então diretor de serviços da Petrobras Renato Duque. E não apenas. Outros US$ 40 milhões (equivalentes a R$ 104 milhões) foram, segundo eles, para Fernando 'Baiano' Soares. Eles disseram à PF que Duque, junto com o então gerente de serviços da estatal, Pedro Barusco, e a intermediação de Baiano receberam o seguinte em propinas:
R$ 6 milhões por obras na Revap (Refinaria Henrique Lage);
R$ 3 milhões pelo gasoduto Cabriúna 2;
R$ 2 milhões pelo Gasoduto Urucu, em Manaus;
e R$ 32 milhões pela refinaria Presidente Getúlio Vargas, no Paraná.
A partir da base financeira que lhe foi proporcionada por seus negócios com a Petrobras, Camargo despontou nos últimos vinte anos como um dos mais bem sucedidos criadores de cavalos de corrida do Brasil. Sua base é Bagé, na plana e fria campanha gaúcha, de topografia e clima ideias para os PSI. Em associação com o Haras Mondesir, do empresário carioca Antônio Joaquim Peixoto de Castro, cujas raízes vem do tempo do presidente Getúlio Vargas, e o TNT, do banqueiro carioca Gonçalo Torrealba, Camargo já trazia ao Brasil, no ano 2000, um dos mais famosos garanhão americanos de então, o craque Royal Academy, para cobrir suas éguas e de seus amigos. Em edição da revista Exame daqueles tempos, Camargo foi citado na reportagem Fábrica de Cavalos como um criador atento aos bons negócios desse rico mercado. Apareceu assim:
"Estamos investindo na melhoria do plantel", diz Camargo. O empresário, que escolheu Bagé depois de ter lido um estudo americano recomendando a área como uma das melhores do mundo para criação de PSI, é dono da Treviso Empreendimentos, sediada em São Paulo. Ele representa fabricantes de equipamentos, como a Pirelli, e prestadores de serviço na área de extração de petróleo. Camargo montou seu haras em 1994.
GENTLEMAN PODEROSO - Porém, para somar os R$ 40 milhões que já se comprometeu a devolver aos cofres públicos, Camargo terá de vender mais do que 'apenas' seus campeões e ótimos reprodutores. A própria sede do Old Friends, que pretende encerrar atividades com o leilão integral de seu plantel, deverá ser posta à venda em seguida. O leilão, já se espera, será um sucesso que vai atrair os grades criadores do país. Ainda na terça-feira 25, uma comissão do Associação Paulista do Puro Sangue (APPS) inspecionou os cavalos que irão a martelo e rasgou elogios para a qualidade da criação. Dali saiu, afinal, a melhor égua brasileira da atualidade, a já citada Sai de Baixo, nada menos que a recordista dos 1.000 metros na grama do hipódromo de Cidade Jardim, em São Paulo, vencedora do Grande Prêmio Proclamação da República, corrido no dia 16 deste mês, e invicta nas temporadas 2014/2015, com quatro vitórias seguidas. Um fenômeno que pode valer, com tranquilidade, R$ 1 milhão.
Julio Camargo, entre os turfistas, sempre foi um gentleman. São amigos e vizinhos dele na imponente sede do Old Friends, em Bagé, nomes famosos como o banqueiro Julio Bozano e o presidente da CSN, Benjamin Steinbruch, ambos apaixonados pelos cavalos de corrida. A conjunção de tantas estrelas faz com que Bagé seja chamada de 'avenida Vieira Souto dos criadores de cavalos de corridas'. Camargo já foi presidente de entidade de criadores e seu haras emprega pelo menos uma centena de funcionários. O problema, para ele, é que entre seus 'velhos amigos' estavam também executivos que jogam pesado e sujo.
Abaixo, o show de Sai de Baixo, de Julio Camargo, no Grande Prêmio Proclamação da República, no domingo 16 de novembro, quando bateu o recorde de Cidade Jardim para a distância de 1.000 metros: "Eguaça essa potranca. Essa criança corre!", comentou o locutor.
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