Corrupção, faxina e indignação

Mudam os partidos políticos, entra governo, sai governo, mas os esquemas de corrupção não deixam de marcar sua presença



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A noção kantiana de tempo como lugar da história e de espaço como lugar da geografia, nos faz refletir que a corrupção não é um fenômeno novo nem desconhecido. Mas é um fenômeno modificado. Modifica-se no tipo, no contexto, na dimensão e nas suas consequências, exigindo para a sua compreensão a análise da formação social e política dos países e das sociedades.

Como nos mostra Odair da Silva, a corrupção independe de sistemas e regimes políticos, fazendo-se presente nas democracias liberais, no socialismo, no fascismo, no nazismo, na social-democracia, em teocracias, em ditaduras militares e em governos populistas, em maior ou menor grau, de acordo com a partitura e o maestro.

À época do governo militar, ante a ausência de transparência, não tínhamos ideia da proporção do problema e passamos a acreditar e sonhar que a democracia, essa espécie de bálsamo para todos os males, seria a sua solução. Ledo engano, com a democratização a corrupção apenas ganhou novos formatos e incluiu novos atores.

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Mudam os partidos políticos, muda-se a ideologia, surgem novas personalidades políticas, entra governo, sai governo, mas os esquemas de corrupção não deixam de marcar sua presença em todas as instâncias e dimensões do nosso Estado, mas, inegavelmente, dentro da esfera da segurança pública as mazelas são inúmeras, conhecidas e alarmantes.

A corrupção, com certeza, não é uma exclusividade brasileira, mas não é sem sentido que há algum tempo um importante jornal americano publicou que a corrupção seria endêmica no nosso país. Muito embora nos cause indignação ler tal matéria em um jornal estrangeiro, os fatos estão a evidenciar que, infelizmente, em nossa administração pública a corrupção revela-se endêmica e mais comum e organizada do que sonha a nossa vã filosofia.

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Nesse sentido, a execução da juíza Patrícia Acioli, além de expor os profundos problemas de corrupção na polícia e o avanço do crime organizado em nosso país, nos chama a atenção para o fato de que, não raro, na atividade policial, violência e corrupção andam juntas, pois ambas as práticas têm a ver com o descumprimento das leis e das normas de convivência social.

Para o coronel e professor carioca Jorge da Silva, condescender com a violência é estimular a corrupção, constituindo-se em um grande equívoco estimular uma e execrar a outra. Que o diga o ex-comandante geral da PMERJ que nomeou e manteve no comando de um batalhão, sob a alegação de que este vinha obtendo êxito na redução dos índices de criminalidade, um oficial que já respondia a 12 processos administrativos. Deu no que deu!

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Não se trata de buscar justificativas para a corrupção policial ou desculpas para a falta de ações governamentais vigorosas contra ela, mas de chamar a atenção para o fato de que esta não sobrevive sozinha e que, não raro, política de segurança pública de curto prazo é sinônimo de grupos de extermínio.

Robert Klitgaard, em sua obra “A Corrupção Sob Controle”, afirma ser um delito de cálculo e não de paixão, pois, nessa ótica, corrupção tem suas raízes mais ligadas às condições materiais que permitem que ela ocorra do que à carência de princípios morais ou éticos. Assim, de acordo com o pensamento klitgaardiano, o comportamento corrupto envolve principalmente três variáveis: a oportunidade para ocorrer o ato ilegal, a chance de a ação corrupta ser descoberta e a probabilidade do autor ser punido.

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Que bom seria que a corrupção policial fosse um problema em si mesmo, resultado de desvios individuais de caráter, solucionáveis com a mudança dos currículos dos cursos de formação e com a apresentação da declaração de bens para efeitos de acompanhamento da evolução patrimonial dos profissionais de segurança pública, como pretende o Governo do Estado do Rio de Janeiro, por certo, partindo do pressuposto de que cada homem ou mulher é uma ilha e, portanto, o seu comportamento não pode ser direcionado para o bem ou para o mal pelo contexto, pelos exemplos e pelos interesses dos governantes, dirigentes, superiores hierárquicos, colegas e setores da própria sociedade.

Não se muda a cultura de um povo sem mexer na educação. Tarefa dura e de difícil adesão diante do quadro que se apresenta na geração atual. A saída podemos até conhecer, mas como torná-la uma realidade se as suas causas perdem-se na poeira dos anos?

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Como tudo na vida é dual, há um lado positivo na crise ética que vivenciamos, pois a opinião pública se mostra, cada vez mais, intolerante e indignada com a corrupção, apesar de ainda se sentir desanimada com a impunidade.

Embora enraizada na cultura política brasileira, a corrupção policial e sua mãe a corrupção social e política endêmica, podem sim serem debeladas, porém resta uma dúvida: a quem cabe organizar a reação contra a passividade e a naturalização do escândalo que envolve o Estado brasileiro? Sinceramente... Não sei, mas uma coisa é certa, faço minhas as palavras do jornalista Reinaldo Azevedo: “este escriba não acredita no “povo” como ente de valor abstrato, que se materializa na massa na rua. Eu acredito em “povos” dentro de um povo, em correntes de opinião, em militância, em grupos organizados — e pouco importa se o que os mobiliza é o Facebook, o Twitter, o megafone ou o sino de uma igreja. Não existe movimento popular espontâneo”.

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À guisa de conclusão, deixo um alerta para os indignados. Não esperemos que a necessária faxina ética da nossa nação parta dos ocupantes do Palácio do Planalto, pois, como o padre Antonio Vieira confirmou e alertou ao soberano que o mandou identificar corrupção e corruptor no Brasil, neste país “quem tentar corrigir de todo esse mal, corre o risco de ficar sem com quem governar”.

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