Caso nos EUA expõe riscos da delação premiada, dizem especialistas

"Quem pode comprar a liberdade com a palavra dirá a palavra que quiserem ouvir". A afirmação é do advogado Arnaldo Malheiros Filho, ao comentar o caso nos Estados Unidos em que um assassino teve sua imunidade garantida após delatar uma inocente; para o jurista Lenio Streck a delação premiada é uma resposta "eficientista" para o problema da incompetência do Estado em combater o crime; na opinião do criminalista Alberto Zacharias Toron, o caso americano demonstra os perigos de se alicerçar uma condenação com base apenas na delação

"Quem pode comprar a liberdade com a palavra dirá a palavra que quiserem ouvir". A afirmação é do advogado Arnaldo Malheiros Filho, ao comentar o caso nos Estados Unidos em que um assassino teve sua imunidade garantida após delatar uma inocente; para o jurista Lenio Streck a delação premiada é uma resposta "eficientista" para o problema da incompetência do Estado em combater o crime; na opinião do criminalista Alberto Zacharias Toron, o caso americano demonstra os perigos de se alicerçar uma condenação com base apenas na delação
"Quem pode comprar a liberdade com a palavra dirá a palavra que quiserem ouvir". A afirmação é do advogado Arnaldo Malheiros Filho, ao comentar o caso nos Estados Unidos em que um assassino teve sua imunidade garantida após delatar uma inocente; para o jurista Lenio Streck a delação premiada é uma resposta "eficientista" para o problema da incompetência do Estado em combater o crime; na opinião do criminalista Alberto Zacharias Toron, o caso americano demonstra os perigos de se alicerçar uma condenação com base apenas na delação (Foto: Gisele Federicce)


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Conjur - "Quem pode comprar a liberdade com a palavra dirá a palavra que quiserem ouvir". A afirmação é do advogado Arnaldo Malheiros Filho, do Malheiros Filho, Meggiolaro e Prado Advogados, ao comentar o caso nos Estados Unidos em que um assassino teve sua imunidade garantida após delatar uma inocente. De acordo com especialistas consultados pela revista Consultor Jurídico, o caso mostra os perigos da delação premiada e reforça o entendimento de que os depoimentos não devem ser a única base para uma condenação, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal.

Na história ocorrida nos EUA, os exames de DNA provaram a inocência de uma mulher, depois de ela passar 13 anos na prisão. E que o verdadeiro culpado era seu ex-namorado. No entanto, os promotores não puderam processá-lo, porque haviam garantido a ele imunidade, em troca de seu testemunho contra ela no julgamento.

"O inusitado dessa notícia — e o impacto que ela provoca — reside no fato de retratar um acontecimento verídico. Não estamos diante de uma discussão teórica sobre os vários aspectos que envolvem o instituto da delação premiada. É a realidade se sobrepondo às suposições, e nos lembrando que as delações são feitas por seres humanos, com todas as suas imperfeições. Desacompanhadas de provas sólidas, podem sim causar impunidade, injustiças e tragédias", afirma a advogada Sônia Ráo, do Ráo, Pires e Chaves Alves Advogados.

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Incompetência do Estado

Para o jurista Lenio Streck a delação premiada é uma resposta "eficientista" para o problema da incompetência do Estado em combater o crime. Ou, como ele mesmo define, um modo de cortar caminho. "É como as universidades que, em vez de colocarem professores competentes, dão aos alunos a possibilidade de delatar seu professor sem se identificar. É o incentivo para que os alunos não assumam suas responsabilidades", compara.

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Segundo Streck, o caso noticiado pela ConJur não é incomum pois o mote aplicado nessas situações é o de que os fins justificam os meios. "É o utilitarismo penal. Só que as vezes os fins não falsos. Pode haver vingança por parte do delator. E até pode fazer chantagem. Há pouco controle sobre a delação nos EUA. O controle maior é o das eleições do Procurador, na maioria dos casos". No Brasil, o jurista aponta que a delação vem apresentado problemas, como, por exemplo, as informações do delator serem desmentidas pelos delatados.

A falta de controle a delação premiada faz o jurista levantar uma série de questões: "Poderia o delator receber prêmios (já que é esse o nome do instituto) sem que a finalidade tenha efetivo fundamento? Qual é o controle sobre o objeto das delações? E se não forem confirmadas? Basta um depoimento para condenar alguém? Por exemplo, nos EUA o testemunho foi suficiente. O delator tem presunção de veracidade? Por que, por exemplo, alguém que poderia ser condenado a 200 anos recebe uma benesse de uma pena de menos de cinco anos? E por que não dez anos? Qual é o critério? Qual é o tamanho da régua do MP? Qual é o controle social sobre as delações? Em um país que até hoje não conseguiu criar critérios para aplicar a insignificância no furto, por que acreditar que conseguiremos construir critérios para controlar a delação premiada?," conclui.

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Outras provas

O criminalista Alberto Zacharias Toron, do Toron, Torihara & Szafir Advogados, afirma que o caso americano demonstra com clareza os perigos de se alicerçar uma condenação com base apenas na delação. "Não por acaso, o Pleno do nosso Supremo Tribunal Federal tem importante precedente indicando que 'a delação de corréu e o depoimento de informante não podem servir como elemento decisivo para a condenação, notadamente porque não lhes são exigidos o compromisso legal de falar a verdade' (AP 465/DF, rel. Min. Carmén Lúcia, DJ 30/10/2014)", lembra.

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Na opinião de Toron, a decisão do Supremo é clara no sentido de que não se pode confiar na delação sem outros elementos de prova. Entretanto, para ele, o que o ocorre nas ações penais, como a operação "lava jato", é exatamente o contrário. "Há caso em que se processa determinada pessoa porque produziu notas fiscais para viabilizar pagamentos de propina, mas outra pessoa, com conduta idêntica, vem a ser ouvida como testemunha e, no Brasil, do quanto se saiba, a outorga deste tipo de imunidade processual não tem lugar. O princípio da obrigatoriedade é o que vigora entre nós", complementa Toron, que defende executivos da empreiteira UTC Engenharia na "lava jato".

O advogado Rodrigo Dall'Acqua (foto), sócio do Oliveira Lima, Hungria, Dall'Acqua e Furrier Advogados, aponta que é preciso cautela no uso da colaboração premiada. "Qualquer testemunho prestado por meio de recompensa deve ser ser visto com extrema cautela pelo Judiciário e nunca, jamais, pode servir de base para uma condenação criminal. O Estado deve saber que sempre pode estar sendo ludibriado ao barganhar com um criminoso que busca benefícios legais."

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No entendimento do promotor de Justiça André Luis Mello há um erro técnico restringir a 'colaboração premiada' apenas à delação, pois ela atualmente engloba também a confissão. "Ou seja, não é apenas delatar outros, mas confessar. O primeiro passo para alguém querer ser 'ressocializado' é confessar seus pecados (crimes). A Lei fala atualmente em colaboração premiada e não apenas em delação premiada".

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