As políticas sociais no Brasil: estímulo à acomodação ou emancipação?

Ajudamos pessoas, equivocadamente, quando na verdade elas deveriam trabalhar? Ou, simplesmente, buscamos direitos de cidadania constituídos em lei?



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A crítica que se tece às políticas sociais no Brasil, em especial ao Programa Bolsa Família, não é novidade em nossa história. Desde as primeiras experiências do capitalismo de livre mercado, os sujeitos que não conseguiam uma inserção no mundo do trabalho e demandavam ações protetivas, muitas vezes ficavam à mercê da filantropia e da caridade.

As questões que se colocavam eram se tais ações não reproduziriam a acomodação das pessoas, uma vez que receberiam incentivos e assim deixariam de buscar um trabalho. A ideia inicial era que as pessoas que recebessem algum tipo de ajuda compensassem de alguma maneira, geralmente um trabalho forçado, num capitalismo sem lei.

No mesmo período somente dispunham de direitos civis e políticos os sujeitos pertencentes à nobreza e a burguesia. Os trabalhadores eram desprovidos de direitos protetivos, o que viria a ocorrer somente no final do século XIX.

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Ao fazer uma análise acerca dos nossos dias, lembramos que tem se disseminado a ideia de que os beneficiários do programa bolsa família deveriam trabalhar para compensar a ajuda recebida, e até deveriam ter o direito ao voto cassado em virtude do recebimento de qualquer tipo de auxílio estatal. Observamos uma revisitação dos velhos discursos do livre mercado.

Isso nos faz refletir acerca do direito social às pessoas: ajudamos pessoas, equivocadamente, quando na verdade elas deveriam trabalhar? Ou, simplesmente, buscamos direitos de cidadania constituídos em lei mediante sangue, suor e lutas históricas e até uma reparação mínima de séculos de dominação, subalternidade, exploração, exclusão e injustiças?

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Pensemos acerca dessas questões: Pensemos em 500 anos de exploração das riquezas do país por uma elite branca, latifundiária e empresarial gerindo a nação somente em busca de benefícios próprios.

Pensemos num sistema capitalista injusto, perverso, selvagem, com terceirizações, precarizações, subemprego, com jornadas de trabalho extensas em troca de baixos salários, de modo que as pessoas não conseguem refletir sobre sua condição de miserabilidade.

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Pensemos um sistema capitalista que diz que todos podem alcançar o sucesso, mas, que omite a informação fundamental de que não há lugar para todos no sistema.

Pensemos numa desresponsabilização estatal, historicamente constituída no país, deixando os sujeitos sem um sistema educacional de qualidade, um sistema de saúde que cuide de verdade e uma sensação de insegurança permanente.

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Pensemos em quem cuida de nossas crianças: um sistema educacional perverso, com aprovação automática e desmotivador, ou um poder paralelo presente, atraente, concedendo benesses em troca da lealdade, mas, com repressão?

Pensemos no estímulo de séculos ao consumo de substâncias psicoativas legalizadas e na disseminação sem precedentes da drogadição, acarretando conflitos familiares, sofrimento mental, e com lideranças políticas que se privilegiam de tais práticas.

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Pensemos numa mídia de massa poderosa que atua como aparelho ideológico do status quo, que padroniza o comportamento das pessoas, estimula o consumo, o hedonismo, e em nenhum momento a emancipação ou o esclarecimento das pessoas, sempre à procura do lucro às custas da dominação.

Pensemos na herança maldita da escravidão que assolou a maior parte do povo brasileiro por séculos de história, lembrando que muitos de nós hoje somos oriundos de uma libertação inconclusa e jamais houve uma preocupação com pobres e trabalhadores deste país.

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Pensemos que em nenhum momento 'ninguém conversou' com o menino ou a menina que sofre violência física, psicológica e até abuso e exploração sexual, que está em situação de rua, faz uso de substâncias psicoativas ou imerso no tráfico de entorpecentes, que reproduz o pensamento mesquinho do prazer ou da vantagem econômica.Ninguém disse para esses meninos que há outro mundo, que a vida pode ser diferente, que o mais gostoso da vida é o encontro com o outro, é a solidariedade, é dar o melhor de si,é a humanidade.

E pensemos nas mulheres (filhas, esposas ou mães) esquecidas, maltratadas, vítimas das circunstâncias adversas, que muitas vezes carregam o fardo das consequências das opressões e imposições da vida.

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Não é novo o pensamento liberal que preconiza que a ajuda às pessoas pobres e vulneráveis estimula a acomodação, a dependência, fazendo-nos pensar que ajudamos pessoas, quando na verdade, elas deveriam trabalhar. Mas, trabalhar como, se não há espaço para todos? Como lutar em condições de igualdade por uma vaga no mundo do trabalho diante de tamanha adversidade?

A história sempre é contada pelo lado dos vencedores. Quantos índios restaram para contar sua versão? Quantos negros resistiram e puderam ter suas histórias imortalizadas? Quantos pobres e trabalhadores puderam ter sua trajetória de luta e exploração ressignificada?

As pessoas que contestam as políticas sociais, na verdade, desejam ver os pobres de volta ao trabalho escravo, numa xenofobia disseminada pelos intelectuais do capital à opinião pública, que a classe média reproduz pelo consumo e sem reflexão.

Diante de tantas mazelas históricas, é inconteste que as pessoas precisam ser ajudadas. O Estado deve proteger os seus cidadãos. O imposto de cada um deve servir à proteção de todos nós, sobretudo, dos nossos pares que sofrem e estão excluídos. Esse é o estado democrático de direito o qual vivemos.

Pensemos do outro lado, pensemos ao contrário, pensemos na dívida histórica da nação com as classes trabalhadoras e no direito social como um ideal irrevogável de cidadania, e pensemos que podemos construir um novo projeto de sociedade para todos nós.

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