A fome que mata
Mas por que motivo o resto mundo parece não enxergar o que acontece no continente africano? Será que é por causa da pele preta da população predominantemente negra?
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A fome assusta, choca, impacta. Mas pior do que tudo isso, a fome mata. E dentro de tudo o que é possível se considerar como morte natural, a fome não parece estar na lista. Não pode estar, ou, pelo menos, não deveria. A fome não deveria matar. Alimentação é um direito do ser humano. Mas muita gente, milhares, morre de inanição, desnutrição, numa quase total ausência de alimentos. A miséria é uma realidade que assola a humanidade em praticamente todos os cantos do mundo, mas o continente africano, esse parece carregar sobre si as dores da humanidade. Mais especificamente, seis países do continente africano sofrem com a miséria estrema: Etiópia, Somália, Sudão, Moçambique, Malavi, Libéria e Angola.
Não bastasse o tormento de não terem o que comer, vivem o horror da guerra civil, que perdura por anos e anos naquele continente. A cada ano, 27 milhões de africanos, na grande maioria crianças, estão ameaçados de morrer de fome. Dos 800 milhões de habitantes, pelo menos 150, vivem em debilitante escassez de qualquer tipo de comida. São privações de todas as naturezas, verdadeiras penúrias materiais e, porque não dizer, na alma.
A Organização das Nações Unidas não trabalha com números precisos sobre a quantidade de mortos na Somália, uma das regiões mais afetadas. No Chifre da África, segundo a ONU, há 11,5 milhões de pessoas que necessitam de assistência urgente, sendo 3,7 milhões na Somália, que se tornou um grande campo de refugiados a céu aberto. A ONU pediu US$ 1,9 bilhão para combater a situação na Etiópia, Quênia e Somália, ode a miséria atinge os piores picos. Mas até agora, menos da metade do valor requisitado foi financiado.
Todos os dias chegam à Somália pessoas de todo canto do gigantesco continente, sobretudo das regiões assoladas pelos violentos conflitos, como o Quênia, onde famílias inteiras são dizimadas e outras destruídas pela separação de entes queridos, que se perdem nas travessias. São milhares de esposas que perderam os esposos, filhos que se perderam dos pais. Crianças desnutridas lotam os hospitais e morrem aos montes, diariamente, para serem enterradas num canto qualquer da terra árida, cavado pela própria família, sem direito a uma cerimônia religiosa, alguém que lhes encomendem a alma, sem nenhum mínimo de "direito humano".
Na África, a situação parece surreal, se assemelha a uma grande produção de um cineasta angustiado, que deseja transpor à grande tela, desesperadamente, o seu imaginário dantesco de miséria absoluta. Mas, infelizmente, o surreal na áfrica é cotidiano e ocorre em cenas bem reais.
O povo africano geme. O povo está seco, apático, sem alma nos olhos. As mulheres são como bambus curvados, que perderam o viço na pele. Elas já não têm mais lágrimas nos olhos. Seus rostos tristes, desfigurados pela falta de comida e de água, não retratam mais nada, nem beleza nem nenhum tipo de sentimento. Elas jazem em vida, uma vida que desconhece o prazer, o sorriso, a satisfação do açúcar. Sobrevivem pelo instinto e nos faros desacostumados de temperos e iguarias, perseguem um alimento qualquer, que possa matar a fome de seus filhos e delas mesmas, uma fome que se perdura por dias e dias. O flagelo é diário, a fome é continuada, e quando o alimento chega, não dá se quer para matar saciar a vontade de comer, que dirá a fome.
Mas por que motivo o resto mundo parece não enxergar o que acontece no continente africano? Apesar dos relatos diários, como duas reportagens exibidas recentemente aqui no Brasil, pelos competentes jornalistas, Roberto Cabrini, no SBT, e Gerson de Sousa, na Record, os dados apresentados pela Organização das Nações Unidas? Por que tão pouco ou quase nada se faz?
Será que é por causa da pele preta da população predominantemente negra? A tez escura é a responsável pelo destino desgraçados de milhares de seres humanos que padecem o flagelo daquela que é a necessidade mais básica no sentido mais restrito da palavra? Eu me pergunto se aquele povo tivesse olhos azuis e cabelos corridos, se o mundo não se compadeceria de sua fome, de sua sede, de sua total falta de condições mínimas, dignas, de higiene? O que acontece com os olhos do mundo que insistem em não ver o que acontece com o povo da África?
A fome mata, meu senhor, a fome mata. E deve ser muito ruim morrer de fome, sem comida, sem água e sem dignidade, doutor. Será mesmo que é por que eles são pretos? Alguém, por favor, salve a África de si mesma e de seu destino de morrer de fome e de sede.
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