Zé Trovão e o para-raios

Nada de mandar invadir o STF, nada de pedir a cabeça do careca numa bandeja de prata, nada de chifradas contra o sistema; apenas saliva e perdigotos. O gado mugiu decepcionado

Zé Trovão
Zé Trovão (Foto: Reprodução)


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"o mito é o nada que é tudo” Fernando Pessoa

O mito se desmancha em praça pública.

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Garganta profunda, o Necrarca, com os chifres de fora, insuflou o gado bípede numa cruzada contra Alexandre, o Glande.

É que o capa preta está numa queda de braço contra os fascistóides; alguns deles já foram mandados à tranca. 

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Até pouco tempo eram gritantes, bravateiros, soltadores de foguetes, rasgadores de placas e lançadores de perdigotos; hoje, silentes, veem o sol em um novo formato geométrico, bola de ferro nos calcanhares.

Há, ainda, os que usam uma tornozeleira eletrônica, como papagaios domésticos; os chifres retráteis recolhidos.

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Jogaram tocos de cigarro no chão e agora a cobra tá fumando.

Xandão é a cobra.

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Bravateiro, o Necrarca disse que defenderia seu rebanho, baixou uma MP que pregava a Liberdade de Pressão e liberou os malucos para afrontarem a Suprema Corte nas redes sociais.

Montado num jumento e com uma bandeira na mão, o Napoleão de Hospício bradou que no dia 7 de setembro Brasília iria tremer; povo na rua, chifres de fora, armas em punho, confronto direto.

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Ônibus foram fretados, distribuíram camisetas e cem lascas para os manifestantes da terceira idade.

Os mais endinheirados se locomoveram em caminhões caríssimos, SUVs, Pick UPs, carrões de luxo e bufantes motocas se dirigiram à Capital Federal.

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Ao som do berrante presidencial, o rebanho marchou unido até a Esplanada; “vai ser gigante”, tuitavam.

Jornalistas jornaleiros, comentaristas de zap zap, filósofos de buteco e cientistas políticos de twitter anunciavam o apocalipse.

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Vai ter golpe, medravam.

O ar, em Brasília, estava mais seco que o do Deserto do Saara, o sol lançava incandescentes chibatadas no lombo das bestas-feras verdeamarelizadas.

Resiliente, a turba enfrentou gás lacrimogêneo, derrubou barricadas, mandou PM baixar arma e invadiu a esplanada ao som de buzinaços de caminhões e bufas de vuvuzelas.

Zé Trovão, foragido da polícia, dividia o protagonismo com o Necrarca. Ele seria o convocador dos caminhoneiros caminhantes.

Mas o Bozo tinha uma vantagem, ele era um golpista presencial. 

Microfone em punho, mandou um ultimato ao ministro Fucks: ou ele enquadra Xandão ou... ou... ou...

O discurso foi reticente, frouxo, gargântico e capitulante.

Nada de mandar invadir o STF, nada de pedir a cabeça do careca numa bandeja de prata, nada de chifradas contra o sistema; apenas saliva e perdigotos.

O gado mugiu decepcionado.

Jornalistas jornaleiros, bem como filósofos de butiquim e cientistas políticos de zap zap correram para apagar seus prognósticos apocalípticos; era só mais uma bravata.

Fon, fon, fon, fon.

O Necrarca, mais uma vez, mostrou que é um mito feito de cuspe.

O nosso Capitólio capitulou e o próximo capítulo será a prisão de Zé Trovão.

Sabendo que terá o mesmo destino de Sara Winter, Eustáquio, Daniel Silveira e Bob Jeff, e sabendo que será abandonado pelo Necrarca tal qual foram os citados personagens, Thunder Joe resolveu esticar a corda.

Desobedecendo o chefe, ele propôs a própria cruzada, orientando os caminhoneiros a bloquearem avenidas Brasil afora, até que Alexandre de Moraes, cabisbaixo, saia algemado do palacete.

Veja você.

O Presida soltou um áudio desautorizando o futuro presidiário, mas Thunder Joe, incrédulo, acha que foi trollagem do Marcelo Adnet, disse não acreditar em áudios com voz do líder enchifrado, quer um vídeo.

O Necrarca cagou pra ele.

Caminhões começam a circular, o locaute vai sendo desfeito e, assim, estabelece-se um novo confronto, agora a queda de braço será entre Zé Trovão e o Para-raios.

Quem vencerá?

Se eu fosse ingênuo, faria essa pergunta aos cientistas políticos do twitter, aos jornalistas jornaleiros e aos fiofólogos de cabaré, mas eu prefiro ouvir os sábios.

Mandei um zap para o polímata versado em efeitos climáticos, o cacique de bunda de fora, o homem da tanga de penachos.

“O trovão”, explicou-me pelo zap o sapientíssimo Cacique Papaku, “é um fenômeno sonoro gerado por descargas elétricas na atmosfera”.

E mandou um sticker do The Flash.

“Provoca muito ruído”, continuou o selvagem, “assusta velhinhas, cachorros e crianças, mas passa com a velocidade de um raio”. 

Outro sticker, dessa vez de um The Flash da Caravana Furacão.

“O trovão é um retardatário, seu ruído sempre é precedido por um rasgo luminoso no céu, o qual chamamos de relâmpago; a luz, você sabe, é mais rápida que o som, por isso a discrepância”.

O que o senhor quer dizer com essas enigmáticas palavras?, perguntei .

“Muito barulho por nada”, resumiu.

E nada mais foi dito, nada mais lhe foi perguntado.

Oremos ao senhor.

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