Wizard, na CPI: frouxidão e desonra elevadas a um novo grau

Até mesmo uma figura inominável como Brilhante Ulstra enfrentou a Comissão da Verdade sem se esconder, sem se esquivar



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O empresário Carlos “Wizard” Martins protagonizou, nesta tarde, um dos episódios mais desqualificantes da história republicana. Outrora arrojado e resoluto, o empresário conhecido pelo pseudônimo do curso de inglês que criou, no final dos anos 80, se revelou o mais indigno dos seres, o mais vergonhoso dos convocados pela CPI e o mais ordinário dos “cidadãos de bem” do país. Ao se calar, apoiado no habeas corpus do Supremo Tribunal Federal (STF) que lhe garantiu o direito de ficar em silêncio, falou muito mais sobre si do que os nove livros de autoajuda que, supostamente, escreveu. Confirmou aquilo de que os menos ingênuos já sabiam: que é um sujeito muito diferente do empresário destemido, do líder nato, cristão abnegado, do filantropo caridoso que dedica “100% do seu – precioso – tempo às causas sociais”. Hoje, até os paralelepípedos das ruas – parafraseando o imortal Nelson Rodrigues – sabem que, se estivesse a bordo do Titanic no momento do naufrágio, Wizard se conduziria da mesma maneira que o personagem Cal Hockley, o aristocrata assustado e sem caráter que, para conseguir um lugar no bote salva-vidas onde eram embarcadas apenas mulheres e crianças, toma um garoto perdido e o apresenta como seu filho a um marinheiro, para conseguir escapar.

Na CPI, Carlos “Wizard” Martins pouco disse e, após sua fala inicial, em que negou a existência, bem como sua participação em um gabinete paralelo, afirmou que, a partir dali, ficaria em silêncio. Foi desancado, espinafrado nas horas seguintes, sem esboçar a revolta daquele que está sendo caluniado, a inquietação de quem é detratado, a insurreição daquele que, injustamente, é injuriado e maldito. Aguentou tudo com semblante tranquilo, como é próprio a quem não tem hombridade, como ocorre a quem só conhece a dignidade quando paga para um biógrafo lhe atribuí-la. Até mesmo os moradores de rua, os desvalidos, são tomados de uma força extraordinária, ao serem acusados imerecidamente. Mas este não foi o caso…

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Hoje, qualquer brasileiro que se preze, que tenha o mínimo de dignidade e entendimento da corrupção que se instaurou com este desgoverno, desde o seu início, gostaria de fazer como a personagem Rose DeWitt Bukater, noiva de Hockey no filme “Titanic”. Ela põe fim ao relacionamento com o frouxo, quando este tenta subornar um oficial no desespero do naufrágio, lançando-lhe uma escarrada épica na face. Nesta noite e amanhã pela manhã, todo cidadão íntegro, toda mulher distinta, todo indivíduo decente deste país irá dormir e/ou acordar com um desejo incontido de cuspir na cara de Wizard, de desferir-lhe o mais degradante insulto que existe, o pior agravo de que se tem notícia, desde que o mundo é mundo.

E o que mais inspira esse anseio é o fato de todos saberem que, da mesma forma que ocorreu com o personagem fanfarrão de “Titanic”, o empresário não esboçaria a menor reação. Ao contrário, viveria os anos que lhe restam com a cusparada ainda escorrendo pelo rosto, porque é assim que ocorre com os pulhas: eles sabem que aquilo – aquele cuspe – os atinge por merecimento, que aquela afronta lhes é condigna e, mais do que isso, lhes é justíssima. Se vivêssemos em um país de gente esclarecida, ninguém mais, em hipótese alguma, compraria qualquer produto ou serviço que remetesse a Wizard – nominalmente, os produtos da marca Mundo Verde, os cursos de inglês das redes Wise Up e Number One, os lanches de lojas das redes Pizza Hut, Taco Bell e KFC que o têm por trás.

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Trata-se, repito, do capítulo mais aviltante, mais infame, desonroso e degradador de que se tem notícia, nos quase 132 anos de Brasil republicano. Até mesmo uma figura inominável como o torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, um marginal de altíssima periculosidade que, para a paz da sociedade, habita as profundezas do inferno há mais de cinco anos, teve comportamento mais digno ao ser inquirido pela Comissão da Verdade. Não negou o pacto do demônio da ditadura, não se calou e enfrentou as acusações sem se esconder, sem se esquivar. Por pior que Ustra tenha sido, como cidadão brasileiro e ser humano, teve uma condução infinitamente superada em relação à palhaçada, à molecagem, à truanice de Carlos “Wizard” Martins. Este último passa à posteridade como uma vergonha, uma desgraça, uma lástima para esposa e filhos – se estes tiverem caráter e discernimento, é claro.

Vendo seu papel, hoje, na CPI da Covid, não há quem o prefira em relação a Lázaro Barbosa. Se um Pôncio Pilatos contemporâneo juntasse o povo na praça, amanhã, entregando à turba a escolha entre Lázaro e Wizard, a multidão pediria a soltura do primeiro. O silêncio pusilânime de Wizard elevou a desonra a um novo patamar e será uma cruz que ele terá de carregar para sempre, enquanto existir um homem de virtude que lembre do quão reles e vil ele foi, diante de um país inteiro, de mais de 200 milhões de pessoas. De todos os miseráveis que esta nação viu nascer, morrer ou apenas passar por suas terras, este é, sem dúvidas, o mais baixo de todos.

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