Volta a hora da esquerda com Lula
"A reaparição do Lula muda os termos dos debates e dos enfrentamentos", escreve o sociólogo Emir Sader. "O fato de que políticos de direita como o FHC, o Delfim, o Rodrigo Paes, Gilberto Kassab, optaram por votar no Lula no segundo turno, representa uma importante defecção para a direita", acrescenta
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O retorno pleno do Lula à vida política recoloca os termos dos enfrentamentos políticos. Até ali, o centro dos choques se dava no marco da direita, entre o Bolsonaro e os setores de direita que, apoiando sua política econômica, divergem do seu estilo de governo. Entre Bolsonaro e o Judiciário, entre Bolsonaro e o Congresso, entre Bolsonaro e a mídia.
Diante desses embates, a esquerda tinha que se posicionar, sempre contra Bolsonaro. Mas não era protagonista. Fazia uma frente concreta, em que a hegemonia, quem colocava os termos do confronto com Bolsonaro, era a direita. O horizonte da luta era limitado pela direita contra a extrema direita, que não tocava na política econômica do governo. Se chocava com as tendências autoritárias do Bolsonaro.
A reaparição do Lula muda os termos dos debates e dos enfrentamentos. O fato de que políticos de direita como o FHC, o Delfim, o Rodrigo Paes, Gilberto Kassab, optaram por votar no Lula no segundo turno, representa uma importante defecção para a direita e uma disposição de considerar o Lula como opção menos ruim, comparada com o Bolsonaro.
A divisão da direita é um sintoma mais da perda de narrativa e de capacidade hegemônica da direita. Seu discurso de luta contra a política e a corrupção perdeu capacidade de conquistar a manter adesões majoritárias na sociedade. O desalento com Bolsonaro não impede que continue a ter, pelo menos nas pesquisas, nível de apoio que, da mesma maneira que em 2018, faz dele o principal adversário da esquerda, do PT e do Lula. Os outros, em geral candidatos a expressão de uma suposta terceira via, se dividem, não conseguem agregar apoios políticos e sociais significativos. Mantêm suas candidaturas, porque acreditam que, em algum momento, a direita pode abandonar maciçamente Bolsonaro e buscar alternativas.
A esquerda precisa compreender a nova possibilidade que se apresenta para ela e estar à altura dos desafios. Antes de tudo, como frisa o Lula, se concentrar agora nas necessidades urgentes da população: auxílio emergencial, emprego, vacinas. Identificar-se com as urgências da massa da população, abandonada pelo governo.
A luta pela queda do Bolsonaro não deve ser abandonada pela esquerda. O controle do Congresso pelo Bolsonaro se mostra mais frágil diante do descontrole da pandemia, expressa em declarações, especialmente do presidente da Câmara, em quem o Bolsonaro deposita a confiança para brecar o impeachment. Revela como o Centrão está afetado pelo desgaste do Bolsonaro e o abandonará se esse desgaste abalar seus apoios eleitorais.
Um impeachment depende de um outro fator ausente por enquanto: a quarentena impede que a rejeição do Bolsonaro promova grandes mobilizações de rua. Os panelaços são uma mostra de como essa rejeição se estende e se torna mais vigorosa. Mas o clima de que a maioria não aguenta mais o Bolsonaro, requer mobilizações de rua, que não devem retornar por alguns meses ainda.
Mas alguma circunstância pode acender a chispa que alastre rapidamente um clima que torne viável o impeachment. A maioria do empresariado está muito descontente. A grande maioria da mídia, também. Será indispensável que a base parlamentar de apoio do Bolsonaro se quebre.
Mais além dessa possibilidade, que poderia fazer o Brasil ser poupado dos sofrimentos atuais, a esquerda tem que pensar na possibilidade de que a disputa política se derive para as eleições de 2022. Para esse momento, a primeira atitude responsável da esquerda tem que ser a da unidade de todas as forças, que hoje só pode se dar em torno do Lula, o grande candidato da esquerda.
Com uma proposta ampla de reconstrução do País, um País destrocado de todos os pontos de vista, que a esquerda vai receber como herança dos seis anos de destruição neoliberal do Brasil. Não se trata apenas de uma frente política de forcas, mas também de uma grande aliança social em torno dos que estão a favor do restabelecimento da democracia, da reconstrução econômica e social do País, da retomada do desenvolvimento econômico, com políticas sociais de distribuição de renda e geração de empregos.
A esquerda tem que voltar a se apresentar ao País como a única forca que pode congregar a maioria do País para afirmar a democracia, para fazer a economia crescer, a desigualdade ser combatida frontalmente, a imagem do Brasil no mundo ser recuperada no mundo. Necessitamos uma grande vitória, tomara que já no primeiro turno, porque será uma derrota não apenas da extrema direita e da direita, mas especificamente dos militares, que se uniram à aventura do governo Bolsonaro.
Necessitamos afirmar uma grande maioria para restabelecer a democracia, para promover a desmilitarização do Estado brasileiro, para terminar com a financeirização da economia e voltar a impor uma dinâmica produtiva, de luta contra as desigualdades, de geração de empregos, de promoção dos direitos sociais de todos os brasileiros.
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