Vencemos a primeira grande batalha contra o golpe
Pede-se que faça política, que se encontre com juristas que tem visão crítica do que está acontecendo. Que os ouça. Que seja visto se reunindo com eles. Que os prestigie. Que organize seminários para debater o sensacionalismo penal brasileiro. Que faça críticas à judicialização da política
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Vencemos a primeira grande batalha contra o golpe.
Mas é claro que o golpismo não vai evaporar de uma hora para outra.
As lideranças do PSDB não querem perder o capital político das manifestações.
Não querem ser chamados de "traíras" ou "cagões".
Mesmo sabendo que não haverá impeachment, vários caciques tucanos voltaram a pregar o golpe, de olho no eleitorado coxinha que foi às ruas no último domingo.
Aquilo foi um show de horrores, uma quantidade incrível de freaks desfilando nas ruas.
Mas freaks também votam.
Felizmente as grandes forças econômicas que apoiavam o golpe já tiraram o corpo fora.
Outras devem fazê-lo ainda esta semana.
O Valor informa hoje que as Confederações Sindicais patronais, como a CNA e o CNI, devem apresentar um documento em conjunto, amanhã, repudiando o impeachment.
A FIESP e a FIRJAN, as mais poderosas federações industriais do país, já o fizeram na semana passada.
Os golpistas amanheceram hoje atordoados com o duro editorial do New York Times contra o impeachment de Dilma Rousseff. Foi engraçado ver alguns coxinhas, desesperados, comentarem no blog que era mentira, que o editorial não existia, que minha tradução não era exata. Cadê o link, perguntavam, sem ver que os links do Cafezinho tem cor verde e o link em questão estava em destaque, no início do artigo, como sempre está.
O Cafezinho não publica nada sem link, e se o fizer, me avisem que foi um esquecimento imperdoável. Procurarei sempre dar ainda mais destaque aos links que dão origem às matérias. E minha tradução foi bastante elogiada.
O golpe agora vai focar nas conspirações midiático-judiciais.
A inação e a incompetência do ministro José Eduardo Cardozo ainda são o maior perigo para o governo da presidenta Dilma.
Não pedimos para o ministro "interferir" ou "melar" nenhuma investigação. Muito pelo contrário.
Pede-se que faça política, que se encontre com juristas que tem visão crítica do que está acontecendo. Que os ouça. Que seja visto se reunindo com eles. Que os prestigie. Que organize seminários para debater o sensacionalismo penal brasileiro. Que faça críticas à judicialização da política.
Que nos ajude a derrotar também essas conspirações judiciais.
Quer dizer, a inação de Cardozo é o segundo maior perigo.
Em primeiro lugar vem a inação da própria presidência da república no campo da comunicação política, que é inexistente.
Dilma foi eleita com a bandeira da mudança e não teve a sensibilidade sequer de mudar as cores do blog do Planalto.
Vencidas essas primeiras grandes arremetidas golpistas, outro perigo que correrá o governo e a democracia brasileira é que a presidenta e seu entorno se deixem engolfar novamente pela arrogância.
A brecha para respirar permitida pelo fiasco das manifestações (fiasco não tanto pelo número de gente, que foi grande, mas por sua pobre homogeneidade: eleitores do Aécio mesclados a um bando de loucos furiosos) deve ser usada para reformular as estratégias de política e comunicação.
Agora mesmo, por exemplo, estou sabendo que membros da Advocacia Geral da União (AGU) estão em pé de guerra contra o governo, e que o pensamento de que houve um sucateamento da corporação pelo governo Dilma tornou-se hegemônico. Tudo isso por falta de política e comunicação, visto que os governos Lula/Dilma foram os que mais aumentaram os salários dos integrantes da AGU.
Aliás, é incrível que o governo não saiba sequer capitalizar isso: durante as gestões petistas, a estabilidade econômica (estabilidade real, não baseada em aumento de dívida pública, como foi a de FHC) permitiu a elevação dos salários da elite do funcionalismo público brasileiro. Juízes e procuradores estão entre os mais bem pagos do mundo.
Há uma burocracia cada vez mais poderosa, mais despolitizada e mais reacionária que, se não fizermos política, submeterá a república a seus caprichos. Tudo isso também por falta de comunicação, visto que esta burocracia é ávida leitora de Globos e Vejas.
Por que o governo não promove seminários para discutirmos o Estado brasileiro, para botarmos na mesa, com franqueza, a questão dos salários, das carreiras, das autonomias, comparando com o nosso passado, com outros países, e discutir soluções à luz do interesse coletivo, não dos interesses corporativos?
Ou o governo vai esperar sofrer um golpe interno, vindo do próprio serviço público, para só depois pensar nisso?
Voltando ao golpismo e às maneiras de combatê-lo, finco o pé na necessidade de preservar a presidenta dessas agendas excessivamente burocráticas e, sobretudo, de qualquer discurso cerimonial. Sua imagem tem de ser trabalhada com muita competência.
Dilma é profundamente tímida, e não adianta forçar soluções "lulistas" para seus problemas de comunicação, a saber, viajar pelo Brasil fazendo discursos que ela não sabe fazer. Além disso, o Brasil mudou. A classe média cresceu. É preciso falar à classe média com mais carinho, mais atenção, mais inteligência.
Não valeria a pena organizar entrevistas e cerimônias mais fechadas, nas quais a presidenta possa ficar mais à vontade?
Se a democracia depende disso, não valeria a pena chamar especialistas? Alguém já calculou o prejuízo causado ao Brasil pela falta de comunicação do governo?
Quanto ao PT, minha sugestão é que abandone o vitimismo e também invista na política. Luis Nassif escreveu há pouco um duro artigo em que chamou o petismo de militância sem partido. Eu acrescentaria: sem lideranças.
É uma asserção cruel, mas verdadeira. Nas grandes capitais, por exemplo, qual é agenda de debates do PT? Nunca houve. O PT desapareceu há tempos do cenário político brasileiro. Só ouvimos falar do partido em cerimônias faustosas, organizadas em hoteis de luxo, como as duas que ocorreram este ano.
Com quase todas as suas ex-lideranças atrás das grades, em prisão domiciliar, condenadas ou acusadas, o PT comemorou seus 30 anos com uma festa de luxo, completamente alienada dos problemas do país, do governo e do seu próprio partido. Quer dizer, todos sabiam dos problemas, mas a imagem da festa foi alienada. Não se pensa a mensagem, o símbolo.
Depois o congresso do partido aconteceu num hotel de luxo em Salvador. Um congresso amorfo, tímido, mais uma vez fechado à sociedade.
E pensar que o PT foi, nos últimos dez anos, o partido que mais recebeu recursos partidários. Poderia ter feito tanta coisa, mas preferiu gastar em supérfluos, ao invés de investir em estruturas permanentes, que pudessem sobreviver ao período de vacas magras. O PT tem obrigação de se preparar, e ajudar todo o campo popular neste sentido, para os tempos difíceis que possivelmente vem por aí, e a saída está na política, na renovação de quadros, na organização de uma intensa e ampla agenda política, voltada para fora do partido, não para dentro.
A começar pela comunicação. O PT acha que comunicação é fazer um site mais bonito. Há tempos deixou de investir em estruturas de investigação, jornalística e criminal (tanto para encontrar seus próprios criminosos, quanto para encontrar os do adversário), em formação de novos quadros, em escolas políticas, em cineclubes, em rodas de leituras, em bibliotecas,e tc.
Deixou se relacionar com suas (ex) bases.
O antipetismo não nasce à tôa. É o sintoma de um partido que - talvez por pura arrogância - entrou num processo de decadência fulminante justamente no momento que poderia ter atingido o seu apogeu.
Tudo isso, porém, obedece às regras que a própria sociedade inventa, e a dinâmica da política nos permite imaginar que tudo pode ser diferente daqui para a frente, se quisermos.
Esse é o aspecto da democracia que deveria nos entusiasmar mais: podemos fazer diferente, e rápido, basta querermos. Isso vale para governos, sindicatos, partidos, para qualquer tipo de organização.
Vencemos, com muita luta, a primeira batalha contra o golpe.
Virão outras batalhas, outras lutas, outras vitórias.
A manifestação do próximo dia 20, por exemplo, será um momento importante nessa luta.
O governo bem que podia ajudar, pela política, lançando iniciativas que agradem o seu próprio eleitorado, visto que, fundamentalmente, será uma manifestações de seus próprios eleitores.
É hora de aproveitar a perplexidade do adversário e mudar.
Rápido.
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