Valorização do Real é subproduto da Guerra na Ucrânia



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Maria Luiza Falcão Silva

Aparentemente moedas de países exportadores de petróleo, metais e commodities como milho e trigo, produzidos em grande escala pelos países envolvidos na guerra, têm sido beneficiadas com o conflito no Leste Europeu. Temores de interrupção da oferta empurram os preços desses produtos para cima. O barril do petróleo Brent atingiu níveis inimagináveis, algo em torno de 130 dólares, valor que nos remete à crise de 2008. Aumentam os preços dos combustíveis. O preço do trigo e o do milho bateram recordes, e o dos fertilizantes, também. Empresas que utilizam esses produtos como matérias-primas, mundo a fora, perdem valor de mercado nas Bolsas de Valores. Incerteza aumenta e a aversão ao risco também. O Brasil, nesse cenário, tornou-se uma espécie de porto seguro. Fica muito longe do palco da guerra e apresenta algumas condições favoráveis para refúgio de capital estrangeiro especulativo.

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A alta dos preços das commodities, concomitantemente com a subida dos juros no Brasil, com o argumento de conter a inflação, enquanto os juros estão em patamares muito baixos no resto do mundo, se traduzem em influxo de dólares, ou seja, na entrada de muito dinheiro no Brasil quer pelo lado do comércio exterior, quer pelo lado dos investimentos. Juros altos tornam mais atraentes estratégias especulativas que buscam lucrar com diferenciais de juros entre países. Enquanto aqui a taxa Selic está em 10,75% ao ano, na maior economia do mundo, os Estados Unidos, os juros estão num intervalo próximo de zero. Quando há aumento de disponibilidade de moeda estrangeira em um país, o resultado esperado é a valorização da moeda doméstica, no nosso caso específico do real.

Além disso, investidores externos ficaram mais animados com os dados recém-divulgados sobre a economia brasileira. O Produto Interno Bruto (PIB) registrou, em 2021, crescimento de 4,6% de acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), maior taxa desde 2010. Houve expansão nos três principais setores de atividade econômica, liderado pelo setor de serviços (+ 4,7%), seguido pela indústria (+4,4%) e pela agropecuária (+0,6%).  Lucros exorbitantes da Petrobras atraem recursos estrangeiros para o mercado de ações de empresas de petróleo e gás e ligadas ao agronegócio. 

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Os investidores estão satisfeitos, os trabalhadores não têm motivos para comemorar: i) novos aumentos na taxa básica de juros se traduzem em mais endividamento público, mais restrições ao crédito, queda no nível de investimentos e possivelmente na atividade econômica.  A taxa de investimentos públicos no Brasil caiu muito nos últimos anos e o desemprego hoje atinge mais de 12 milhões de trabalhadores. Menos investimentos implicam em mais desemprego; ii) as consequências de uma moeda valorizada são conhecidas. De forma bem geral, as exportações de mercadorias e serviços são desestimuladas e as importações estimuladas; fortalece o turismo para fora e o turismo interno sofre perdas; ganham os que devem em moeda estrangeira e perdem os que são credores. No caso das exportações brasileiras, centrada em commodities cujos preços estão crescendo por falta de produtos em decorrência da guerra, os mecanismos de mercado descritos podem não funcionar.

A recente valorização do real frente ao dólar pode ser transitória. Rumores de que o Federal Reserve Bank (FED), banco central dos Estados Unidos, pode, a qualquer momento, aumentar a taxa de juros dos títulos americanos geram ansiedade no mercado. Aumento da taxa de juros norte-americana desloca capitais na direção dos EUA.  O atual cenário no Brasil é, portanto, de incertezas por todos os lados. Mas, ainda assim, muito menos do que nos países europeus e outras economias emergentes que ficam mais próximas do conflito. 

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Por quanto tempo? Impossível prever. 

Será bom ou ruim para o Brasil? No atual cenário de guerra, de desorganização das cadeias produtivas globais, de alta dos preços das commodities agrícolas - a cotação do trigo no atacado já atingiu o maior patamar desde 2014; de disparada do preço do petróleo e gás impactando o preço de gasolina, óleo, gás de cozinha; de falta de fertilizantes que vão, certamente, comprometer o fornecimento de alimentos, apontando para desabastecimento e de produtos para exportação, pode ser muito ruim.

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As soluções não são de curto prazo. Independente do real valorizado a inflação avança, o desemprego não diminui, a fome aumenta, a insegurança alimentar é ameaçada. Muitas empresas ficam sufocadas com juros maiores sobre capital de giro e falta de matérias primas. No front externo, nossas exportações se tornam menos competitivas embora o resultado sobre a receita de exportações dependa das elasticidades da demanda e da oferta (há dois efeitos em questão, redução da oferta e aumento de preços), e as importações mais baratas de produtos da indústria manufatureira só tendem a agravar quadros da desindustrialização em curso. 

Há ganhadores? Claro que sim. Os mesmos. Os que especulam nos mercados financeiros e acionários. Os que se beneficiam dos aumentos nos preços do petróleo e lucros da Petrobras e não se dispõem a repartir os ganhos com a sociedade. 

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E o que fará o Banco Central do Brasil cujo objetivo maior é assegurar o poder de compra da moeda? Aumentar a taxa de juros, para controlar o nível dos preços quando a inflação decorre de aumentos nos custos de produção e, portanto, pelo lado da oferta? Será ineficiente. O resultado se traduzirá em redução no nível de atividade, mais desemprego, mais sofrimento e mais valorização do real caso o FED não aumente a taxa de juros nos Estados Unidos. 

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