Uma sugestão ao presidente Lula

Com a volta de Lula, o Brasil retoma não apenas seu espaço no cenário global, mas muito especialmente entre as comarcas dessa Nossa América

Luiz Inácio Lula da Silva
Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Lula Marques / Agência Brasil)


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 A esta altura, creio que o que menos faz falta ao presidente Lula, no aluvião de pendências que desabam em cima dele a cada minuto de cada hora de cada dia, são sugestões.  

 Por que então invado esse turbilhão trazendo mais uma?  

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 Lula sabe que ao longo desse tempo todo em que nos conhecemos jamais deixei de dizer a ele, quando consultado, o que sei e penso de determinado assunto. E se agora não houve consulta alguma, venho por dever de lealdade.  

 Eu me sinto na obrigação de trazer a ele o que penso e sei sobre a Nicarágua de Daniel Ortega e sua excelentíssima esposa, Rosario Murillo.

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Com a volta de Lula, o Brasil retoma não apenas seu espaço no cenário global, mas muito especialmente entre as comarcas dessa Nossa América.

E é exatamente por isso que eu creio que ele e seu governo deveriam se manifestar, de maneira clara e contundente, sobre o que acontece na pequena e tão vilipendiada Nicarágua, um país que faz parte da minha mais cálida e profunda memória. Frequentei assiduamente os anos da Revolução Sandinista (1979-1990), participei da maneira que pude, e jamais deixei de acompanhar o que acontece por lá.

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E o que acontece a partir de 2006 e principalmente depois de 2018 mostra que não tem fim a traição de Daniel Ortega a tudo aquilo pelo qual ele em priscas eras, e milhares de nicaraguenses depois, lutaram.

Se há décadas Daniel Ortega foi um combatente heroico pelo seu país, agora deveria se apresentar como Daniel Somoza, em menção à dinastia que devastou seu país desde o primeiro deles, o patriarca Anastasio Somoza, até a vitória da Revolução Sandinista, em 1979. Foram trinta e sete anos de somozismo, agora ressuscitados por Ortega.

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Um rápido recorrido por suas últimas façanhas mostra que Ortega, sua senhora esposa e seu bando não matam aos milhares no estilo Pinochet ou Videla: preferem calar seus adversários em prisões de extrema crueldade, ou com humilhações insuperáveis, numa violência que na maioria das vezes é silenciosa e implacável.  

Agora mesmo seu regime expulsou mais de 300 adversários, entre eles muitos antigos companheiros de batalha. Até quem comandou ações guerrilheiras que libertaram o próprio Daniel e seu irmão das masmorras somozistas foi despachado.

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Os novos punidos – vale reiterar: mais de trezentos – tiveram não apenas todos os seus bens desapropriados: perderam até mesmo a nacionalidade.

Li a lista dos alcançados por essa medida cruel. Lá aparece o escritor Sérgio Ramírez, meu amigo há décadas. Foi a figura civil mais relevante da Revolução Sandinista, e integrou a Junta de Governo depois da vitória. Já estava exilado, agora perdeu a nacionalidade e, claro, tudo que deixou em Manágua: casa, livros, quadros, memórias de uma vida digna.

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Entre os punidos estão figuras cuja atuação foi crucial para libertar o país das garras de Somoza, como o comandante guerrilheiro Victor Hugo Tinoco e a comandante Dora Maria Téllez, de trajetória heroica.  

Também eles foram privados de tudo, exceto de algo que falta a Daniel Ortega e Rosario Murillo: dignidade, integridade.

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Outro dos punidos, o bispo católico Rolando Álvarez, se negou a sair do país. Resultado: foi condenado a 26 anos de cadeia e levado para o Cárcere Modelo, conhecido como “El Infiernito”.

Daniel Ortega mandou fechar dezenove entidades empresariais. Já havia feito a mesma coisa com emissoras de radio, jornais, associações de direitos humanos, sindicatos, entidades estudantis, organizações não-governamentais, igrejas católicas, enfim, tudo que não preste a ele a devida vassalagem. Agora, rompeu com o setor privado. O que resta a ele?

Dora María Téllez, a heroica “Comandante Dois”, tem a definição perfeita para o que aconteceu na Nicarágua depois da derrota para a centro-direita, em 1990: o “Orteguismo” se instalou na Frente Sandinista como um parasita, e acabou devorando a derradeira e a mais bela Revolução dos nossos tempos.

É verdade que ao longo de anos e anos a Nicarágua sandinista padeceu a cruel violência e o boicote radical de Washington. Que os terroristas infiltrados, a maioria deles pagos pelos dólares que se opunham aos sandinistas, trataram de arrasar tudo que viam pela frente. E que exaustos de tanto horror e esperançosos de paz, em 1990 os nicaraguenses votaram na liberal Violeta Chamorro para presidente, derrotando Ortega.  

O antigo comandante guerrilheiro voltou bem diferente à poltrona presidencial em 2006, quando o projeto da Revolução de 1979 já estava se esfacelando.

Tornou a se eleger três vezes. Na mais recente, cumpriu o sonho de Jair Messias: mandou prender os adversários que ameaçavam sua vitória. E ganhou, claro.

Sim, sim: hoje, ele bem que poderia se chamar Daniel Somoza.  

É tão asqueroso e repulsivo como aqueles que ajudou a derrotar em 1979. E em total cumplicidade com a esposa Rosario Murillo, persiste nesse voo rumo à mais imunda maré de excremento que enconbrirá suas figuras para sempre.

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