Uma política de pés de barro
Pobre de um país que enveredou por semelhantes e catastróficos desatinos! As energias da existência, felizmente, não se erguem contra nós. Há improvisos, talentos para encontrar saídas, gente de qualidade nos confrontos entre as propostas, enquanto, a cada dia, definimos o que nos importa na seleção do que interessa e do que devemos descartar
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Avocar leis inexistentes e usar agressividade para afirmar pontos de vista, no espaço da democracia política, pega mal. São estratégias de pés de barro. Sustentam-se por algum tempo, intimidando as pessoas, para logo cair na desmoralização dos dirigentes. O povo pode parecer bobo. Nunca, no entanto, por muito tempo. Logo percebe a diferença entre a verdade e a ficção. O próprio encaminhamento dos debates basta, frequentemente, para separar o joio do trigo. Estão nesta linha os discursos de Braga Netto, o Ministro da Defesa, em Resende, para jovens ingressados na carreira militar, e os desabafos de Bolsonaro cada vez que algo lhe desagrada. Ambos, em tal plano, caminham sobre o fio da navalha, o primeiro defendendo as Forças Armadas com conceitos que não se amparam na Constituição; e o segundo, com suas diatribes contra os ministros do Supremo, quando o que lhe chega deles não corresponde aos seus interesses.
A democracia representativa promove, como não se ignora, diversas maneiras de atuação, umas fantásticas, corajosas, militantes e belas no contexto da sua atualidade. E outras, gritantes, mal ajustadas, pobres de espírito, sem consistência e prontas para se diluir às primeiras brisas da manhã. Na CPI da Covid, circulam exemplos destas particularidades, dependendo dos talentos em foco no calor das informações. Ao analista, chama a atenção, em contraste com as monótonas canções inconformadas de um senador do Rio Grande do Sul ou da fragilidade das delicadezas apenas para constar do representante de Santa Catarina, a elegância e a firmeza de Alessandro Vieira, de Sergipe. Ele não perde a calma, mesmo em momentos de indignação. Em vez disso, argumenta, amparado na verdade. Não há moleza nos seus exercícios de retórica: há convicção e apoio nos documentos, com a inevitável dedução em favor de formas de continuar. Depoentes tiram proveito, muitas vezes, do modo como se desdobram os argumentos. Com ele, não. É preciso, lúcido, inteligente.
Nada parece mais diverso disso no que ocorre nos corredores do poder. Na residência oficial, já imaginamos a fúria pelas contrariedades transbordando pelos jardins e estrangulando as emas, se elas não fugirem a tempo. Em seu comportamento, essas aves não se revelam muito diferentes do que se passa com a população. O político que atingiu o seu alto cargo através do voto, na liturgia em vigor, reclama a cada instante contra as descobertas da CPI, pelas mãos de Omar Aziz, Randolfe Rodrigues e Renan Calheiros, para não mencionar mais uma vez Alessandro Vieira ou a bancada feminina, com destaque para Eliziane Gama ou Simone Tebet. Nelas antevê as avalanches que se anunciam pela frente. Medidas afirmativas já não se colocam em suas mãos; recorre às ameaças... de punir ministros do Supremo, como se isso dependesse de suas manobras, antes de um golpe de Estado para a imposição de uma ditadura. Na visão apocalítica e paranoica que o aflige, as armas se acham a seu lado.
Pobre de um país que enveredou por semelhantes e catastróficos desatinos! As energias da existência, felizmente, não se erguem contra nós. Há improvisos, talentos para encontrar saídas, gente de qualidade nos confrontos entre as propostas, enquanto, a cada dia, definimos o que nos importa na seleção do que interessa e do que devemos descartar. As esperanças permanecem a favor da sensatez, das manifestações de alegria, contra os apelos da morte. Não devemos perder a cabeça. Que o faça quem já não a tem sobre o pescoço...
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