Uma Justiça de conveniência

O desgaste da Suprema Corte, com a decisão sobre Renan, é imenso, mas os ministros não parecem preocupados com isso. Ficou bastante claro que o STF manipula a Justiça, com interpretações ao sabor de conveniências, o que o deixa sem credibilidade junto ao povo

O presidente do Senado, Renan Calheiros, anuncia corte de terceirizados e modernização na Comunicação do Senado. À direita, o senador Jorge Viana (PT-AC)
O presidente do Senado, Renan Calheiros, anuncia corte de terceirizados e modernização na Comunicação do Senado. À direita, o senador Jorge Viana (PT-AC) (Foto: Ribamar Fonseca)


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A decisão do Supremo Tribunal Federal que manteve o senador Renan Calheiros na presidência do Congresso Nacional, contrariando liminar do ministro Marco Aurélio Mello que o afastara do cargo, não surpreendeu. Parceiro silencioso do golpe que destituiu a presidenta Dilma Rousseff, o STF não poderia criar obstáculos ao governo Michel Temer, que ajudou a implantar, tirando do comando do Senado outro parceiro, justo aquele que é uma garantia da aprovação das matérias de interesse dos golpistas, entre elas a PEC 55 que congela os gastos públicos. Esqueceram, porém, de avisar o ministro Marco Aurélio, que acabou obrigando a Corte a contornar a situação para não atrapalhar Michel e, ao mesmo tempo, atender a Globo. Com jeitinho o Supremo, após conversas de bastidores com o Planalto, encontrou uma maneira de driblar sua própria decisão anterior, segundo a qual um réu não pode integrar a linha sucessória da Presidência da República. E Renan foi mantido no lugar onde ainda é muito útil aos interesses dos que tomaram o poder, com a ressalva de que não poderá assumir a Presidência.

O desgaste da Suprema Corte, com essa decisão, é imenso, mas os ministros não parecem preocupados com isso. Ficou bastante claro que o STF manipula a Justiça, com interpretações ao sabor de conveniências, o que o deixa sem credibilidade junto ao povo. Após a liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio, verificaram que o substituto de Renan na presidência do Senado era um petista, o vice Jorge Viana, que, se assumisse o cargo, poderia enterrar as matérias que tramitam na Casa, entre elas a PEC 55, frustrando o esforço do governo Temer. Então, era imperioso reverter urgente a situação, derrubando a liminar que o Senado se recusou a cumprir e mantendo o senador alagoano no comando da Casa, agora mais fortalecido por ter peitado a Corte Suprema. Ele deverá, porém, em contrapartida, fazer algumas concessões como, por exemplo, esquecer de novo na gaveta o projeto que pune juízes e procuradores por abuso de autoridade, além do que limita salários, o que significará uma vitória do pessoal da Lava-Jato.

Renan não é nenhuma flor que se cheire, tendo desempenhado um papel decisivo na derrubada de Dilma, mas no panorama atual ele representava o único nome capaz de conter os abusos de juízes e procuradores com a aprovação do projeto de lei que estabelece punição para os excessos. Com a barganha para manter-se no comando do Senado, porém, ele abriu mão desse projeto, frustrando as esperanças dos que imaginavam próximo a vigência de uma lei que colocasse um freio nos abusos. Ele não deverá, no entanto, permanecer muito tempo na presidência do Congresso, não apenas porque seu mandato está expirando mas, sobretudo, porque após cumprir sua tarefa na aprovação das matérias de interesse do governo perderá a utilidade e certamente será descartado, como aconteceu com Eduardo Cunha. Os inquéritos a que responde no STF deverão entrar em pauta e, então, ele será defenestrado, inclusive com a possibilidade de ter o seu mandato cassado. Afinal, ele ousou peitar o Supremo e os ministros, que o engoliram agora, deverão regurgitá-lo mais tarde.

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O fato é que depois desse episódio, em que o Supremo teve de se curvar aos interesses de Temer, a confiança na Justiça, que já estava precária, deteriorou-se de vez. Ficou evidente que é sempre possível alterar-se uma decisão, dar-se um jeitinho, desde que a alteração atenda a injunções de ordem política, conforme os interesses em jogo. Por isso, no âmbito do STF, nem sempre o "pau que bate em Chico bate em Francisco". E a Suprema Corte acabou se caracterizando como um órgão político, confirmando as suspeitas levantadas por ocasião do impeachment de Dilma, quando lavou as mãos feito Pilatos porque apoiava, discretamente, o golpe. Precisamente por não ter mais a austeridade e o respeito de antigamente, quando havia isenção e justiça nas decisões, que não se estribavam em interpretações convenientes mas em provas irrefutáveis, é que deixou de ser observada aquela sentença segundo a qual "decisão judicial não se discute – cumpre-se". Hoje as decisões judiciais são questionadas em todos os níveis, e não apenas por juristas. Justamente pela ausência de força moral, resultante da politização do Judiciário, é que as decisões começam a ser descumpridas.

Enquanto, portanto, o Judiciário não recuperar a confiança da população, com um comportamento sério e imparcial, os questionamentos vão continuar, a cada dia mais contundentes. Para isso, no entanto, é preciso que não apenas o Supremo mas, sobretudo, os juízes, não se deixem mais influenciar por paixões políticas. Veja-se o caso da Lava-Jato, por exemplo, onde o juiz Sergio Moro ganhou fama mundial como caçador de corruptos mas, na verdade, o combate à corrupção é apenas uma cortina de fumaça para encobrir sua verdadeira missão: impedir Lula de voltar à Presidência da República. Afinal por que, apesar das delações, nenhum tucano foi até hoje incomodado? Essa pergunta, repetida muitas vezes, obteve resposta recentemente: a estreita ligação entre Moro e os tucanos, conforme é possível concluir-se da foto da sua conversa íntima com o senador Aécio Neves em recente evento promovido pela revista "Istoé". Sorridentes e falando ao pé do ouvido, revelaram-se velhos amigos. Talvez por ter conhecimento das relações de Moro com o PSDB – o ex-presidente Lula chegou a denunciá-lo como militante do partido – é que o prefeito eleito de São Paulo, João Dória, declarou outro dia que "nenhum tucano será preso". Então é fácil concluir que eles não querem combater a corrupção, mas o petismo. E Lula é o alvo principal.

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