Uma geringonça brasileira é possível?
Portugal tornou-se um exemplo de governo de esquerda ao promover o fim dos cortes em pensões, aposentadorias e salários, reverter a precarização das relações trabalhistas, buscar justiça tributária e fiscal e ainda reforçar a educação pública. A pergunta que emerge é sobre a viabilidade de repetir a experiência no Brasil de hoje, assolado pelo neoliberalismo sem rumo do governo golpista
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Há uma tensão permanente entre a tendência à acumulação infinita, própria capitalismo e a orientação por justiça social, marca da democracia. Contudo o capitalismo, por apresentar grande capacidade de adaptação, tem se mantido praticamente hegemônico desde o século 16. Sempre que emerge uma resistência, institucional e politicamente consistente o capitalismo se reinventa, sem perder sua característica essencial.
Aconteceu na Europa dividida pelo Muro de Berlim, onde o capitalismo, por assim dizer, fez concessões em termos de direitos sociais e econômicos para impedir que suas classes populares se motivassem pelo modelo existente no lado oriental.
Em 1989 ocorreu a queda do muro e pouco tempo depois, mais precisamente em 1993, o capitalismo triunfante conseguiu organizar a União Europeia, e a partir daí estabelecer o que se convencionou chamar de troika – equipe composta pelo FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia.
Em decorrência dessas mudanças institucionais começou um verdadeiro ataque aos direitos individuais, especialmente nas dimensões social e econômica. Na Europa a força dessa tríade se fez sentir principalmente na Grécia, Irlanda, Portugal e também na Espanha, impondo a perspectiva neoliberal, na forma de medidas de austeridade composta por restrição dos direitos da classe trabalhadora e privatizações. O resultado foi uma forte recessão e desemprego em massa.
Da forma muito semelhante, no Brasil após um curto período de alívio para as classes populares, empreendidas nos governos do Presidente Lula e no primeiro mandato da Presidenta Dilma, adveio o golpe midiático, jurídico e parlamentar, em 2016 e, como consequência, a imposição do receituário neoliberal por um governo ilegítimo e corrupto.
Contudo, esperança no ar, soluções de caráter progressista voltam a se apresentar como viáveis na prática. É o caso da chamada "geringonça" em Portugal cujo principal objetivo foi o de travar as medidas de austeridades impostas pela troika.
Tornou-se um exemplo de governo de esquerda ao promover o fim dos cortes em pensões, aposentadorias e salários, reverter a precarização das relações trabalhistas, buscar justiça tributária e fiscal e ainda reforçar a educação pública.
A pergunta que naturalmente emerge é sobre a viabilidade de repetir a experiência no Brasil de hoje, assolado pelo neoliberalismo sem rumo do governo golpista. Possivelmente a resposta possa ser encontrada a partir do exame dos equívocos estratégicos cometidos pelos governos populares que possibilitaram a reação conservadora.
Há quem aponte que o erro fundamental do governo progressista teria sido o de governar à moda antiga com novos objetivos. Objetivos esses de caráter progressista, facilitados por um cenário econômico internacional favorável, gerado em especial pelo extraordinário desenvolvimento chinês.
O contexto propiciava um autêntico jogo de ganha-ganha – os mais ricos nunca ganharam tanto e por isso toleraram a implantação de políticas públicas que tornaram o Brasil exemplo de redução da pobreza.
Entretanto, assim que o contexto se alterou, principalmente em decorrência da crise de mundial de 2008 e queda nos preços das commodities, além de outros elementos, gradativamente o conservadorismo foi mostrando o seu ressentimento e o preconceito de classe, tudo exacerbado pela mídia oligopolista, inviabilizando qualquer orientação republicana. A culminância foi o já mencionado golpe de 2016. E em verdadeiro "déjàvu" o resultado tem sido recessão profunda e enorme desemprego, em paralelo a lucro imoral do setor rentista.
Se por um lado é importante reconhecer e aprender com nossos erros, também importa dar um passo adiante naquilo que acertamos, propondo novos desafios e diferentes formas de governar, incorporando novas práticas àquilo que já foi consolidado com sucesso.
A construção de uma saída segura para este momento se dará, sobretudo, a partir de uma visão compartilhada entre a sociedade e a classe política, que renove as esperanças, reforce a democracia representativa, mas também pavimente com solidez a estrada que levará à retomada do desenvolvimento com justiça social.
Democratizar o sistema fiscal e o sistema político de modo a minimizar a influência da dimensão econômica na política; revolucionar a Democracia para salvá-la. Construir um novo pacto, que certamente será alcançado com uma Constituinte, visando fortalecer as instituições da República, com todos os poderes submetidos a um controle externo.
Para esse desiderato teremos que unir todos os partidos e movimentos progressistas, juntar as esquerdas, aglutiná-la em torno de um projeto de reconstrução nacional.
É possível sim criar uma geringonça à brasileira!
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