Uma dimensão do terror na ditadura
Nesta semana, ao pesquisar sobre história brasileira, descobri o que eu não buscava. É natural, isso acontece com todo o mundo. Mas ocorrem, às vezes, descobertas sobre as quais possuíamos apenas uma intuição, e não tínhamos a certeza. E pude ver em palavras vivas de outra pessoa o que sabia e não provava
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Nesta semana, ao pesquisar sobre história brasileira, descobri o que eu não buscava. É natural, isso acontece com todo o mundo. Mas ocorrem, às vezes, descobertas sobre as quais possuíamos apenas uma intuição, e não tínhamos a certeza. E pude ver em palavras vivas de outra pessoa o que sabia e não provava.
Isso me vem a propósito do depoimento do advogado Glauco Gonçalves, ex-preso político, na Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara. Em determinado ponto, ele fala do que gostaria de esquecer, ou do que pensava ter esquecido sobre o terror na ditadura:
“É bom a gente conversar assim, porque eu não tive, de lá pra cá, de 73 pra cá, essa conversa com ninguém. É porque é um assunto que a pessoa procura deixar na caixinha”.
Então, entre muitos pontos fundamentais sobre a repressão política, ele se refere ao terrorismo que atingia pessoas além da esquerda, mas que ainda assim foram machucadas pelos torturadores da ditadura. São casos que distendem a dimensão do terror até a margem do tragicômico.
Assim fala Glauco Gonçalves sobre o que viu na sua prisão em 1973:
“Fizeram um interrogatório perto dum quarto, uma cafua pra lá, eram móveis velhos, eu fiquei em pé o dia todo e vendado. Eu passei uma noite toda vendado. Aí, depois eu me encostei num móvel, e quando fui lá pro interrogatório, tinha uma moça que era funcionária do antigo Banco Econômico, mas ela não tinha nada com a coisa, ela dizia:
- Olhe, a minha atividade é só fumar maconha!.
Ela só fumava maconha. Mas não tinha nada desse movimento e a moça foi torturada por causa disso. Depois, eu não sei se foi nessa mesma noite ou foi na noite seguinte...
Eu passei dois dias pra ser interrogado. Então chegou um homossexual. Ele gritava: ‘Eu não sou comunista, não, eu sou veado’. Agora sabe o que aconteceu? O infeliz... Eu fui interrogado por Fleury no segundo dia. Eu ouvi de noite o interrogatório do homossexual, ele gritava:
- Eu não sou comunista não. Eu sou veado! Eu não sabia. Eu achei lindo o soldado e tirei uma fotografia!
O coitado tirou uma fotografia do sentinela porque achou o sentinela bonito. Inocente. Foi tirar uma fotografia do soldado. Esse rapaz foi barbarizado lá.
A repressão fazia o que queria”
Acredito que não é preciso ser mais eloquente. Não é preciso circular essa memória com a moldura de um comentário. O trecho acima do depoimento de Glauco Gonçalves fala melhor sobre o terror geral da ditadura.
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