Um vexame que poderia ter sido evitado

O vexaminoso espetáculo da denúncia de três procuradores paulistas, motivo de críticas duras e sonoras gargalhadas em função de uma denúncia pedante, sem fatos nem provas contra Lula, poderia ter sido evitado se, em 23 de fevereiro, o Conselho Nacional do Ministério Público tivesse prestado a devida atenção aos argumentos da defesa. Numa ação tratada com descaso pela mídia grande, os advogados alegaram aquilo que ficou comprovado na semana passada -- que o procurador Cassio Conserino não demonstrava isenção para investigar o caso.



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      Cabe um merecido alívio pela reação de pasmo e indignação diante da denúncia oferecida contra Luiz Inácio Lula da Silva por três integrantes do Ministério Público de São Paulo. Num editorial que resumiu um ponto de vista geral, a Folha de S. Paulo escreveu:

     “Com promotores assim, nenhum cidadão está livre de ter sérios problemas na Justiça. Quando a sede de celebridade se junta à ignorância, e esta a uma feroz paixão persecutória, um trio de horrores ganha forma.”

       É preciso manter uma postura de cautela diante destas manifestações, contudo. O inesquecível vexame dos três procuradores produziu compensadoras gargalhadas, mas poderia ter  sido evitado se, em 23 de fevereiro, o Conselho Nacional do Ministério Público tivesse aplicado o artigo 103 da Lei Orgânica do MP e afastado os procuradores do caso.

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       O argumento da defesa de Lula  – tratada, à época, como simples recurso protelatório – dizia, com a elegância necessária aos textos jurídicos, que o procurador Cassio Conserino não tinha condições de ficar à frente do caso. Questionava-se, ali, a isenção de Conserino para conduzir uma denúncia gravíssima contra Lula, lembrando que fora escolhido sem passar pelo método clássico para escolha do promotor natural – o sorteio

       Ao lado de mal sucedidas demonstrações de pedantismo ignorante, destinado a alimentar uma retórica de condenação contra o acusado sem apoio em fatos, a denúncia contra Lula foi a confirmação, linha por linha, daquilo que os advogados do ex-presidente diziam.

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      O pedido de prisão preventiva apenas coroou uma grande extravagância.

      Nada disso teria ocorrido se, em vez de solidarizar-se, num voto unânime, favorável a Cassio Conserino, o CNMP tivesse assumido uma postura prudente, dedicando a devida atenção aos argumentos da defesa. Teria sido uma demonstração de independência e responsabilidade num caso que diz respeito aos grandes destinos do país, o que inclui o futuro do governo Dilma Rousseff, a eleição de 2018 e muitas outras questões de importância prioritária para mais de 200 milhões de brasileiros. A manutenção de Conserino foi resolvida numa sessão com a presença de Rodrigo Janot, o procurador geral da República. Também estava presidente Marcos Elias Rosa, procurador geral do MP paulista, escolhido para o posto pelo governador Geraldo Alckmin, depois de ficar em segundo lugar na lista da categoria. Sem fazer nenhuma ilação indevida, nem insinuações fora de hora, cabe recordar o fato de que Alckmin é um dos fortes presidenciáveis do PSDB em 2018, Se estiver no pleno exercício de seus direitos políticos, o acusado Lula representa o nome mais forte do Partido dos Trabalhadores, hoje e um dos mais difíceis adversários de um eventual candidato Alckmin.

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       É bom advertir que as mais sonoras gargalhadas não devem esconder um fato essencial. Seguindo o curso da legislação, a denúncia tomará seu caminho normal e deverá ser examinada pela juíza Maria Priscilla Ernandes Veiga Oliveira, que já pediu segredo de Justiça e informa que não tem prazo para tomar uma decisão. Considerando todas as angulações, jurídicas e políticas, que envolvem o caso, é imprudente antecipar qualquer decisão por parte da juiza  Maria Priscilla. Mesmo considerando todas as críticas que podem ser feitas a denúncia, vale à pena recordar o ditado, mais aplicável a Justiça do que a outras instituições: ri melhor quem ri por último.

        Também vale uma observação distanciada sobre a reação crítica em relação aos procuradores paulistas. Me parece repentina demais para ser inteiramente sincera. Faz um contraste absoluto com o silêncio obsequioso oferecido pela mídia grande a decisão de 23 de fevereiro, quando o Conselho Nacional do Ministério Público tomou uma decisão surrealista. Reconheceu que não se havia aplicado os critérios usuais para a escolha do procurador natural mas, sem argumentos plausíveis, decidiu não mexer nos casos em andamento – o que representou um voto de confiança para os procuradores que investigavam Lula, e até haviam antecipado a decisão de oferecer denúncia contra ele, o que configura novo absurdo.

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        A verdadeira explicação para a repulsa geral contra a denúncia deve ser procurada, talvez, fora dos tribunais, dos escritórios de advocacia e das redações. Entre a decisão de 23 de fevereiro e 10 de março, quando a denúncia foi anunciada em entrevista coletiva, ocorreu um fato decisivo. Em 4 de março, a Polícia Federal foi a casa de Lula com um mandato de condição coercitiva para que fosse prestar depoimento aos procuradores da Lava Jato. Sem que ninguém pudesse antecipar, ocorreu uma reação popular no país inteiro, em defesa dos direitos do presidente e em repúdio por uma medida truculenta, sem qualquer justificativa real. Em 2005, quando foi ouvido num caso no qual poderia ser acusado de tentativa de obstruir a justiça, como você pode ler em nota publicada em 4 de março neste espaço, o também ex-presidente FHC foi interrogado em casa, educadamente, por três delegados da Polícia Federal.

        Se esta análise está correta, a crítica de última hora à denúncia do MP paulista deve ser interpretada a partir da demonstração de força dos brasileiros que foram as ruas para defender Lula. Essa reação tornou o pedido de imediata prisão preventiva uma proposta de alto risco político, capaz de produzir uma mobilização popular de envergadura, que poderia  colocar em questão a realização de um projeto cada vez mais visível – chegar a Lula de qualquer maneira para garantir que seja excluído de nossa vida política.  

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        Essa é a questão.    

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