Um golpe “belo, recatado e do lar”
A teoria mais plausível é a de que a defenestração de Cunha na véspera do afastamento quase que irreversível de Dilma por seis meses constitua-se em uma espécie de higienização do golpe, com vistas a dar uma aparência de limpeza a um processo imundo
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Abaixo, a explicação (esquisitíssima e pouco crível) do ministro Teori Zavascki para ter demorado quase cinco meses para julgar pedido da Procuradoria Geral da República feito ao STF em meados de dezembro do ano passado a fim de que a Corte afastasse Eduardo Cunha da Presidência da Câmara e do Congresso nacional:
"Esse é o relatório do caso, cumprindo registrar que o pedido foi formulado em dezembro de 2015, às vésperas do recesso do Judiciário e das férias forenses, de modo que o seu processamento somente pôde ocorrer, de modo efetivo, a partir de fevereiro do corrente ano, quando se oportunizou ao requerido o exercício da defesa e do contraditório, na forma recomendada pela Constituição Federal. Ademais, uma sucessiva ocorrência de fatos supervenientes – registrados ao longo da presente decisão – determinou que apenas em data recente o pedido veio a ostentar as adequadas condições para ser apreciado, o que a seguir se faz"
O diabo mora nos detalhes. As "adequadas condições" a que se refere o ministro seriam Cunha defenestrar Dilma antes da degola? É o que muita gente pensa, que esperaram Cunha fazer o trabalho sujo de conduzir um processo viciado contra a presidente da República para depois descartarem-no como o lixo que é.
Outros pensam que o afastamento de Cunha é jogo de cena e não ocorrerá, pois bastará Gilmar Mendes pedir vistas do processo para que tudo volte à estaca zero. Como se sabe, Mendes não se furta a interromper processos de interesse da sociedade com o propósito escancaradamente cristalino de procrastinar resultados que considera adversos aos próprios interesses.
A teoria mais plausível, porém, é a de que a defenestração de Cunha na véspera do afastamento quase que irreversível de Dilma por seis meses constitua-se em uma espécie de higienização do golpe, com vistas a dar uma aparência de limpeza a um processo imundo, enlameado de alto a baixo por estar jogando no lixo 54 milhões de votos sem preenchimento dos requisitos constitucionais para que seja levado a cabo.
Há, porém, quem ainda acredite no STF e sonhe com uma decisão corajosa e correta daquela Corte após o afastamento de Cunha – se Gilmar não lhe devolver o mandato e o cargo. A decisão do Supremo afetaria também atos cometidos pelo (momentaneamente) ex-presidente da Câmara. Atos como a instalação do processo de impeachment...
Em um mundo ideal – em que a justiça prevalecesse –, ao considerar que Cunha não tem condições morais de estar à frente da Casa dos Representantes do povo o Supremo deveria determinar que um processo da gravidade do afastamento de uma presidente eleita e reeleita pela maioria dos brasileiros voltasse à estaca zero, na Câmara.
Contudo, com o que menos se pode contar hoje, no Brasil, é com justiça por parte de um Judiciário posto de cócoras por enormes manifestações de rua financiadas sabe-se lá por quem e popularizadas por impérios de mídia.
Seja como for, o efeito imediato dessa decisão oportunista – ainda que correta no mérito, não no timing – sobre Cunha é conferir ares de funcionamento normal às instituições na antevéspera de uma decisão do Senado que jogará no lixo 54 milhões de votos, número que corresponde à maioria do eleitorado brasileiro.
O golpe encabeçado por Michel Temer, assim, assume as supostas qualidades atribuídas pela mídia amiga à sua mulher. O Brasil está sofrendo um golpe travestido, com carinha de recatado, todo envergonhado. Um golpe belo, recatado e do lar, como convém a esses grupos hipócritas que apoiam esse ato criminoso.
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