Um “compromisso histórico” a ser lembrado

Não tenho dúvidas quanto à urgente necessidade, na atualidade brasileira, da construção de um “compromisso histórico” que aglutine em torno de si o conjunto das forças sociais e políticas que visualizam na defesa da democracia e dos direitos humanos previstos na Constituição Federal de 1988 os fundamentos da resistência às forças neofascistas

(Foto: Reuters | Mídia Ninja)


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Para Enrico Mondaini.

O Trilhas da Democracia de domingo (29/9) entrevistou a deputada federal Marília Arraes, do Partido dos Trabalhadores do estado de Pernambuco. A conversa com a neta de Miguel Arraes girou em torno do tema da “construção da unidade democrática”, numa conjuntura marcada pela ofensiva das forças neofascistas, que têm no governo Bolsonaro um ponto de referência e, também, de apoio.

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Nas próximas linhas, pretendo revisitar brevemente uma experiência política, completamente esquecida, que marcou a história italiana de meados dos anos 1970. Uma experiência que, com toda a certeza, tem muito mais a dizer a nós brasileiros situados no campo político da esquerda democrática do que a “operação mãos-limpas”, coordenada pelo então magistrado do Ministério Público italiano, Antonio di Pietro, nos anos 1990, e que tanto iluminou o “lava-jatismo” do ex-juiz federal Sérgio Moro.

Refiro-me, aqui, às reflexões levadas a cabo pelo secretário-geral do Partido Comunista Italiano, Enrico Berlinguer, logo após a trágica experiência vivida pelas esquerdas chilenas na sequência da deposição do presidente Salvador Allende e o consequente trágico encerramento do governo da Unidade Popular, em 11 de setembro de 1973, por meio do golpe de Estado liderado pelo general Augusto Pinochet – recentemente saudado por Jair Bolsonaro na abominável ofensa feita à ex-presidenta socialista do Chile, Michele Bachelet, e à memória do seu pai, o brigadeiro Alberto Bachelet.

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Na ocasião, de maneira extremamente veloz, Berlinguer captou na grave derrota sofrida pelas esquerdas chilenas um recado que deveria ser decifrado pelas esquerdas italianas, em nome da preservação do tecido democrático nacional. A conclusão a que chegou Berlinguer foi a de que havia se tornado urgente a reconstrução dos laços de união existentes entre as forças responsáveis pela derrota do fascismo na Segunda Guerra Mundial – as três grandes forças de caráter democrático e popular italianas que pegaram em armas na Resistência às tropas de Benito Mussolini: comunistas, socialistas e católicos.

O termo criado por Berlinguer para assinalar tal necessidade política não deixava margem à dúvida: o risco à democracia duramente conquistada nos anos de Resistência não deveria ser desprezado – muito pelo contrário, ele se mostrava cada vez maior em função das ações terroristas patrocinados por agrupamentos extremistas de direita e de esquerda, em conluio com partes consideráveis do próprio aparelho estatal italiano.

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Assim, não restava outra opção aos comunistas italianos (que, à época, controlavam 1/3 do eleitorado italiano) a não ser defender a necessidade do estabelecimento de um “compromisso histórico”, que reunisse às esquerdas comunista e socialista o centro democrata-cristão. Com isso, os comunistas italianos nunca se tornaram uma força de governo, em grande parte devido ao clima de Guerra Fria vivido à época, mas deram uma decisiva contribuição para que o Estado democrático de direito italiano fosse preservado.

Não tenho dúvidas quanto à urgente necessidade, na atualidade brasileira, da construção de um “compromisso histórico” que aglutine em torno de si o conjunto das forças sociais e políticas que visualizam na defesa da democracia e dos direitos humanos previstos na Constituição Federal de 1988 os fundamentos da resistência às forças neofascistas e, ao mesmo tempo, os pilares da reconstrução da nação após o desastre causado pela fúria penal-neoliberal de um governo que faz da apologia à violência a sua forma de ser.

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