Um 25 de abril de tristeza
Fui atropelado por uma notícia da mais pura tristeza: morreu Harry Belafonte
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Era para ser um dia de festa, pela Revolução dos Cravos chegando aos 49 anos e o Chico enfim recebendo seu prêmio Camões.
Mas no meio da manhã fui atropelado por uma notícia da mais pura tristeza: morreu Harry Belafonte.
Pode ser que no Brasil de hoje pouca gente saiba dele. Mas para as gerações que vieram antes da minha, e também para as que vieram logo depois, Belafonte foi uma figura imensa, iluminada e luminosa.
Uma das muitas alegrias que a vida me deu foi ter conhecido Harry Belafonte em agosto de 1978, em minha primeira viagem a Cuba.
Fiquei então sabendo que ele e uma das filhas eram frequentadores assíduos já fazia um tempo.
Amigos cubanos me contaram que ele era dos pouquíssimos artistas que era pago, e em dólares.
Geralmente quem ia se apresentar em Cuba não cobrava nada, só um cachê simbólico para os músicos.
E o que Belafonte fazia com os dólares que recebia? Distribuía para grupos de teatro da periferia, para escolas de música do interior, para bibliotecas longínquas.
Foi em Cuba que nos encontramos ao longo dos anos. Recordo que em 1992, durante o Voo da Solidariedade que levou para a Ilha donativos em penca e grandes nomes brasileiros como Antonio Callado e Leonardo Boff, ele apareceu várias vezes para apoiar nossa iniciativa.
Num desses encontros aconteceu uma coisa hilária: estávamos sentados no chão de uma boate esperando para assistir a um grupo de instrumentistas cubanos quando ele passou no escuro e pisou na minha mão.
Belafonte se agachou para pedir desculpas e me reconheceu. “Pisei justo no meu amigo brasileiro!”, disse.
Flutuei de orgulho enquanto Ziraldo dizia estar corroído de inveja...
Até meados daquela década de 1990 foram muitos os encontros. Depois ele passou a se dedicar mais à África, principalmente ao Quenia, onde passava longas temporadas.
Além de todos os seus feitos musicais – foi o primeiro intérprete a bater a casa do milhão de discos vendidos – Belafonte foi um ativista rigoroso e exemplar, em defesa da causa negra.
Amigo de Martin Luther King, foi quem apresentou o pastor a John e Robert Kennedy.
Cada vez que Luther King ia preso, era Belafonte quem pagava a fiança. Esse é apenas um entre milhares de exemplos de sua militância generosa e incansável.
Se fez também um ativista pelo fim do apartheid na África do Sul, e amigo de Nelson Mandela.
Até o fim esteve na mesma trincheira de sempre. Bateu duro em presidentes como George W. Bush e, claro, Donald Trump.
Neste 25 de abril seu coração incansável foi enfim descansar.
Curiosamente, há poucos dias mandei para uma jovem amiga muito querida canções de Belafonte. E ela se encantou.
Hoje vou mandar mais.
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