Traidores da democracia

A semana transcorreu com o ódio do golpismo destilando seu veneno, por meio da mídia empresarial

Congresso Nacional e a marca da Globo
Congresso Nacional e a marca da Globo (Foto: Divulgação | Marcello Casal Jr/Agência Brasil)


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“Ser um aliado dos EUA não significa ser um seu vassalo. Temos o direito de pensar por nós mesmos. Sem autonomia estratégica em relação aos EUA, há o risco de a Europa sumir da história”. (Emmanuel Macron)

“A linguagem sempre revela o que uma pessoa tem dentro de si ou que conserva inconscientemente”. (Victor Klemperer) 

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A semana transcorreu com o ódio do golpismo destilando seu veneno, por meio da mídia empresarial, controlada pela classe dominante, mediante coberturas impressas e digitais dos jornais Estadão, Folha de São Paulo, entre outros, disparando sua artilharia, de forma sintonizada, tentando denegrir os excelentes resultados da viagem do Presidente Lula à China, na qual realizou acordos de investimento com aquele país, da ordem de R$50 bilhões, mantendo diálogos estratégicos com as gigantes Huawei e Shein, além de participar da posse de Dilma Rousseff, eleita como a nova presidente do New Development Bank (Banco Brics), cujo mandato se estenderá até 2025, instituição criada em julho de 2014, aqui em Fortaleza – CE, em virtude da VI Cúpula dos BRICS, grupo de grandes países composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. 

Em apenas 100 dias de governo, o Presidente Lula moveu-se intensamente no tabuleiro da política internacional, num contexto de forte tensão entre os gigantes EUA, Rússia e China, conseguindo resgatar rapidamente a dignidade internacional do Brasil (tornado um pária pelas mãos dos quatro anos de desgoverno militar bolsonarista), colocando-o novamente ao centro da cena geopolítica, com suas viagens a Argentina, Uruguai, EUA e recentemente à China e Emirados Árabes, exibindo de forma altiva a defesa estratégica dos interesses brasileiros.

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Em seu discurso oficial na posse de Dilma, em 14/04/23, na cidade de Xangai, o Presidente Lula denunciou abertamente: “É um sonho de todos os países emergentes ter um instrumento de investimento no seu desenvolvimento. Nenhum governante pode trabalhar com uma faca na garganta por estar devendo. Não cabe aos bancos asfixiar as economias dos países, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) está fazendo agora com a Argentina”. Lula destacou que o sonho de criar o Banco Brics visa dar vida a um instrumento de desenvolvimento que seja forte, que empreste dinheiro na perspectiva de ajudar e não na perspectiva de asfixiar os países pobres e os países em desenvolvimento. O Banco Brics surgiu assim como inovação, uma ferramenta para a redução das desigualdades entre países ricos e países emergentes, que se traduzem em forma de exclusão social, fome, extrema pobreza, imigrações forçadas. Ainda em sua explanação oficial, Lula colocou em xeque a existência do dólar como moeda única na realização das transações comerciais entre países: “Eu me pergunto, toda noite, por que é que todos os países estão obrigados a fazer seu comércio lastreado no dólar? Por que é que nós não podemos fazer o nosso comércio lastreado em nossas moedas? Por que é que nós não temos o compromisso de inovar? Quem é que decidiu que era o dólar a moeda, depois que desapareceu o ouro como paridade? Hoje um país precisa correr atrás de dólar para poder exportar, quando ele poderia exportar na sua própria moeda. Por que um banco como o Brics não pode ter uma moeda que possa financiar a relação comercial entre Brasil e China, entre Brasil e os outros países dos Brics? Os bancos centrais certamente poderão cuidar disso”.

Diante desta enxurrada de saldos favoráveis, a imprensa golpista pôs-se a maquinar. A Folha de São Paulo/Uol, representante do capital financeiro, pela lavra de um de seus porta-vozes, Josias de Souza, estampou em manchetes garrafais: “O nome do problema é Lula”, e não o golpismo neofascista instalado no GSI/Abin do general Heleno (o pequeno), e em outras estruturas do poder, desde o Golpe de 2016. Por sua vez, o Estadão, representante do capital agrário, que em 08 de outubro de 2018, classificou como “Uma escolha muito difícil” o voto no representante da democracia (Haddad) ou o voto no líder do neofascismo brasileiro (Jair), estampou neste mês o seguinte editorial: “Um governo envelhecido aos 100 dias”.

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Na esteira dos ataques ao governo Lula, na segunda-feira, 17, John Kirby, porta-voz de Segurança Nacional da Casa Branca (EUA), de forma truculenta, declarou que o Presidente Lula emitiu “comentários simplesmente equivocados”. Em sua viagem à China e aos Emirados Árabes, como Europa e os EUA continuam contribuindo para a continuidade da guerra, Lula voltou a defender a negociação da paz entre Rússia e Ucrânia, com a reunião de países neutros. Os ataques truculentos de Kirby serviram de “password” para na quarta-feira, 19, a rede de televisão CNN Brasil publicar, às pressas, um vídeo editado, obtido de imagens “exclusivas” (fornecidas por quem? Pelo GSI do Heleno, o pequeno?), edição conduzida de modo a alterar o sentido da realidade para convencer os espectadores a crer na narrativa da cumplicidade do general da reserva Gonçalves Dias (nomeado ministro por Lula em 01/01) com o vandalismo perpetrado pelos golpistas bolsonaristas no dia 08 de janeiro. “Coincidência”, ou não, estava programada para a tarde daquela mesma quarta-feira 19 uma sessão da Comissão de Segurança Pública da Câmara Federal, dominada pelos deputados neofascistas bolsonaristas, convocando Gonçalves Dias para prestar esclarecimentos sobre o vídeo editado.

Importante recordar que o GSI – Gabinete de Segurança Institucional – havia sido extinto por Dilma Rousseff. Sua função original, no tempo de sua criação no governo de Fernando Henrique Cardoso, era a de desenvolver uma inteligência anti-crise (alimentar, hídrica, energética etc.) capaz de munir o presidente a tomar atitudes em tempo hábil no enfrentamento de tais contextos adversos. Ocorre que Michel Temer ressuscitou o Gabinete, nomeando para o seu comando o general Sérgio Etchegoyen, sobrinho do Doutor Bruno, que o remodelou aos moldes do Gabinete Militar, dos tempos da ditadura 1964-1985, com muito mais poder e autonomia, incorporando-lhe a Abin (que Dilma havia submetido à Secretaria de Governo), turbinando as atribuições de inteligência e contra-inteligência, monitorando cidadãos brasileiros. (VICTOR, Fábio. O Poder Camuflado. Cia. das Letras, 2022). Segundo o historiador Chico Teixeira, são cerca de 11.000 cidadãos brasileiros que são atualmente monitorados pela Abin. Esta estrutura de inteligência foi a responsável pela chegada de um sem-fim de generais e oficiais aos postos no Executivo federal, conforme o roteiro político previamente concertado na caserna, tornado explícito com a eleição em 2018 do capitão Bolsonaro. Cerca de 6.800 militares, pelas informações do TCU, foram colocados em cargos de direção no governo Bolsonaro.

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Este estado de golpe continuado não acontece por acaso. Importante lembrar as palavras professadas pelo candidato dos militares à presidência do Brasil, Jair Bolsonaro, em 23 de maio de 1999, no programa Câmera Aberta, da Band: “Através do voto, você não vai mudar nada neste país. Nada, absolutamente nada. Você só vai mudar quando uma dia nós partirmos para uma guerra civil aqui dentro. E fazendo o trabalho que o regime [ditadura] militar não fez. Matando uns 30 mil, começando com FHC [Fernando Henrique Cardoso, então presidente do Brasil]. Não deixar ir para o exterior não. Matando”.

Outra declaração, não menos importante, e histórica, foi a de Sérgio Etchegoyen, meses antes da intervenção federal no Rio de Janeiro em 2018: “Nós precisamos agir. Nós precisamos fazer. Estamos numa guerra. Vai acontecer, é previsível que aconteçam coisas indesejáveis, inclusive injustiças. Mas ou a sociedade quer ou não quer”. (VICTOR, Fábio. op. cit.).

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Como lembra Victor Kemplerer (1881-1960), professor doutor de filologia românica, as palavras podem ser como minúsculas doses de arsênico que quando engolidas de maneira despercebida parecem ser inofensivas, mas passado algum tempo, o efeito do veneno se faz notar. 

Para o Dr. Goebbels, é preciso falar ao povo para mais bem calar o povo. Manter a massa na ignorância, intimidá-la contra qualquer reflexão. Para isso é preciso martelar sempre, repetidamente, as mesmas teorias simplistas, reducionistas, negacionistas que não podem ser rebatidas, inclusive alterando o sentido das palavras para alterar o sentido da realidade. Por exemplo, no caso alemão, a palavra fanático em vez de significar um crente irreflexivo-sectário-extremista, passou a ser uma pessoa corajosa que se entrega com paixão à causa nazista. Além disso, a linguagem fascista centrava-se na arenga, no berro, no incitamento. Com o adversário, não discuta; ofenda-o. Fundamental é falar alto, vociferar, sem prestar atenção ao que se diz. Não dar margem à consciência crítica, elegendo sempre um inimigo comum. 

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Ou como no dizer de Etchegoyen, “é preciso agir, mesmo que aconteçam coisas indesejáveis e injustas”. Ou seja, coisas criminosas. Não é preciso pensar sobre isto.

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