Toffoli e a uberização do pensamento
Jornalista Moisés Mendes critica o desempenho do presidente do STF, Dias Toffoli, na entrevista ao Roda Viva. "Parecia querer dizer que, se dependesse dele, a capacidade de reflexão, de compreensão da realidade e de reação institucional do Judiciário também seria uberizada", afirma
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Por Moisés Mendes, para o Jornalistas pela Democracia
O brasileiro teve a confirmação de que é de distanciamento e de aparente neutralidade o sentimento do presidente do Supremo em relação aos ataques ao Judiciário liderados por Bolsonaro, com o apoio dos militares.
A participação de Dias Toffoli ontem no Roda Viva foi a exibição de um cientista político esforçado, mas confuso na sua tentativa de explicar o que significa a figura de Bolsonaro e por que estamos entregues ao que disse ser, sem originalidade, a uberização da política.
O cientista Dias Toffoli ocupou-se dos dilemas dos tempos bolsonaristas protegendo-se na figura de um professor imaginário. Saiu-se muito mal.
Perguntaram a ele o que acha de Bolsonaro participar de atos que ofendem a mais alta Corte do país. Toffoli deu uma volta e disse que Bolsonaro é a expressão da nova política.
Bolsonaro, explicou o cientista, puxa para a extrema direita, por força centrífuga, quem estava acomodado ao centro. A política sempre fez movimentos contrários, com os eleitos puxando os extremos para o centro e assim viabilizando o poder.
A nova política, disse Toffoli, propicia o surgimento dessas figuras, porque foi uberizada, com a substituição da representação formal pela gritaria de vozes nas redes sociais, pela urgência de demandas não atendidas e pelo desejo de fazer política sem intermediários.
Continuando a aula, para falar da defesa dos índios, Toffoli abordou até os tratados de Madrid e de Santo Ildefonso. Era preciso ir às raízes dos impasses nacionais.
Falou da preservação do diálogo, da autonomia dos poderes, da independência das instituições, mas não falou nada, uma frase sequer, sobre os ataques de Bolsonaro e da extrema direita à autonomia do Supremo.
A impressão final era a de que o comandante da mais poderosa trincheira do Judiciário contra o fascismo pretendia se apresentar ali também como um arqueólogo superficial e apressado desses tempos, um Claude Lévi-Strauss, citado por ele. Mas acabou como um Rolando Lero.
Toffoli sugeria ter lido trechos da Wikipedia, transformados em divagações, para responder a perguntas objetivas como se fosse um sujeito contemplativo dos imbróglios da democracia.
Mas as citações saíam enviesadas e fora do lugar. Como quando disse essa frase: “Tudo que é fruto da cultura humana foi criado pelo homem”.
Toffoli passou a ideia de que prefere ser alguém observando e refletindo sobre o que acontece ao redor, mas sempre distante de qualquer pretensão como protagonista. Ficou clara que essa foi sua opção.
Foi a despedida do ministro que em 24 de setembro deixa a presidência do Supremo e que não iria, na última hora, partir para o ataque. Toffoli jogou, durante todo o tempo que esteve na liderança do Supremo, pensando em não tomar gol.
Mas ontem poderia ter sido pelo menos um pouco retórico, mais discursivo, mais assertivo, para não deixar a imagem final de ausente e assustado.
Toffoli foi distante, professoral, neutro e contemporizador, negando-se sempre a ser personagem de um cenário tumultuado pela centrífuga da extrema direita.
Parecia querer dizer que, se dependesse dele, a capacidade de reflexão, de compreensão da realidade e de reação institucional do Judiciário também seria uberizada.
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