Tarefa fundamental é isolar o fascismo

Segundo o colunista Marcelo Zero, as últimas manifestações "foram convocadas pelo capitão com o objetivo principal de emparedar as instituições democráticas, especialmente o Congresso Nacional, que demonstra alguma independência, face ao festival inacreditável de absoluta incompetência do governo"

Tarefa fundamental é isolar o fascismo
Tarefa fundamental é isolar o fascismo


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A tarefa fundamental e inadiável das forças que ainda têm um compromisso mínimo com a democracia é isolar politicamente o neofascismo tupiniquim.

A total ausência de real compromisso democrático das nossas forças políticas conservadoras tradicionais foi o que permitiu a ascensão de um mentecapto extremamente perigoso, que ameaça acabar com o que restou da nossa democracia, após o golpe de 2016 e a prisão política de Lula.

As últimas manifestações, apesar de seu volume apenas mediano, mesmo nos maiores redutos bolsonaristas, foram convocadas pelo capitão com o objetivo principal de emparedar as instituições democráticas, especialmente o Congresso Nacional, que demonstra alguma independência, face ao festival inacreditável de absoluta incompetência do governo.

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Nisso, não há surpresa alguma. Bolsonaro fez toda a sua longa carreira política de deputado do baixo clero como opositor ferrenho da democracia. Sempre elogiou a ditadura e os torturadores. Sempre defendeu, sem pejo algum, o extermínio, físico ou político, dos diferentes.

A imprensa sabia disso, os partidos políticos conservadores sabiam disso, os “formadores de opinião” sabiam disso, Sérgio Moro e seus procuradores sabiam disso, a justiça sabia disso, os donos do capital, mais que ninguém, sabiam disso perfeitamente.  Até as capivaras do Lago Paranoá tinham conhecimento do assunto.

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Contudo, todos resolveram apoiá-lo, com intuito de derrotar o professor universitário e implementar uma agenda ultraneoliberal de destruição de direitos e da soberania. Inocentes, nessa história sórdida, só as pobres capivaras e as forças políticas progressistas que brava, mas isoladamente, se opuseram à tragédia anunciada.

O que causa alguma surpresa, no entanto, é o apoio tácito que boa parte da imprensa conservadora e comercial deu às novas manifestações contra a democracia. Em nome da “necessidade” de se aprovar o fim da Previdência e as demais pautas destrutivas da agenda ultraneoliberal, transmitiram as manifestações ao vivo e buscaram inflar o fascismo nas ruas. Mais uma vez, demonstram que não têm compromisso efetivo com a democracia.

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Tentaram disfarçar as manifestações pelo fechamento do Congresso e do STF como manifestações contra a “velha política”, e tentaram justificá-las dizendo que a vertente antidemocrática foi minoritária.

Não foi. O cerne das manifestações foi antidemocrático. Sob a desculpa do combate à “velha política” e à “corrupção”, o querem mesmo é abolir ou levar à inanição às instituições democráticas e instaurar um Estado policial.

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Nesse sentido, as manifestações foram tão democráticas quanto as que o partido nazista promovia na Alemanha, na década de 20 e 30 do século passado. “Povo na rua” nem sempre é sinal de democracia. Pode ser o contrário. Naquela época, as manifestações nazistas também eram apresentadas como manifestações contra a velha política e a corrupção.  Nazismo e fascismo eram o “novo”.

Alguns argumentam que as manifestações, por seu volume modesto, foram um fracasso, que Bolsonaro cometeu um erro tático, etc.

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É possível. Bolsonaro, por absoluta mediocridade e incompetência, e também por seu claro vínculo com as milícias, perde popularidade em ritmo de blitzkrieg.

Não obstante, seria um erro crasso menosprezar seu potencial destrutivo.

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Estamos em época de crise extremamente grave e crônica. Em cenários semelhantes, a volatilidade política é imensa.

Nas eleições de 1928, o partido nazista teve menos de 3% os votos. Julgaram que Hitler estava acabado. Bismarck até revogou a proibição de Hitler fazer comícios na Prússia, pensando que o perigo havia passado.

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Quatro anos depois, no entanto, Hitler fez um retorno triunfal, obtendo mais de um terço dos votos. Poucos meses depois, chegou ao poder. Bastou o agravamento da crise econômica, a partir de 1929, para que os inimigos da democracia triunfassem.

A persistência do impasse econômico e político no Brasil pode, sim, levar a “soluções” autoritárias”. Há o risco sério de que o ressentimento e a frustração da população sejam dirigidos não contra o governo fascistoide, mas contra o que restou da democracia e suas instituições. Sob a desculpa de se acabar com a “velha política”, pode-se acabar, de vez, com a política. 

A atual tutela militar sobre o poder civil, a falta de compromisso democrático de boa parte das nossas oligarquias, a ânsia por aprovar a agenda ultraneoliberal, a crise persistente e a criminalização da atividade política promovida pela Lava Jato compõem um cenário propício para aventuras de todo tipo.

A última pesquisa feita no Brasil pelo Latinobarômetro (2018) demostra que o apoio popular à democracia em nosso país é atualmente muito tênue. Ante a pergunta, você considera que a democracia é preferível a qualquer outra forma de governo?, apenas 34% responderam afirmativamente. Ou seja, praticamente dois terços dos brasileiros admitem apoiar ou, ao menos, suportar um regime autoritário, caso julguem que a democracia (ou a “velha política”) tenha fracassado.

Bolsonaro demonstrou que está disposto a jogar a população contra as instituições democráticas. Está saindo da retórica para a ação. À medida que a crise avança e seu governo se paralisa, cresce a tentação de se apostar numa solução autoritária.

Nesse quadro, há de ocorrer uma reação firme das forças democráticas. Já passou do tempo de haver uma articulação, no Congresso e na sociedade civil, de todas as forças que ainda tem compromisso com a democracia.

Dizem que a grande astúcia do Diabo foi convencer de que ele não existia.

O neofascismo ou protofascismo brasileiro em senso lato existe. Está no poder e demonstra ser extremamente perigoso.

A democracia brasileira ainda existe, parcialmente. Mas o que restou dela corre o risco de não mais existir.

 

 

 

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