Superficialidade da imprensa na análise do acordo coreano

Não há acordo entre duas partes se elas não tem interesses próprios a serem atendidos. É uma grande tolice achar que a Coréia do Norte vai abrir mão de seus arsenais atômicos de graça. Também é tolice imaginar que Trump fará um acordo que não passe pelo total desarmamento de mísseis de longo alcance da Coréia

Não há acordo entre duas partes se elas não tem interesses próprios a serem atendidos. É uma grande tolice achar que a Coréia do Norte vai abrir mão de seus arsenais atômicos de graça. Também é tolice imaginar que Trump fará um acordo que não passe pelo total desarmamento de mísseis de longo alcance da Coréia
Não há acordo entre duas partes se elas não tem interesses próprios a serem atendidos. É uma grande tolice achar que a Coréia do Norte vai abrir mão de seus arsenais atômicos de graça. Também é tolice imaginar que Trump fará um acordo que não passe pelo total desarmamento de mísseis de longo alcance da Coréia (Foto: Jose Carlos de Assis)


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A suprema imbecilidade da imprensa internacional em relação ao acordo entre as duas Coréias - com destaque para a imprensa brasileira e, em especial, a imprensa televisiva -, se revela no mantra recorrente de que os líderes coreanos do norte são inconfiáveis. Em outras palavras, o acordo não é muito relevante porque por Kim Jong-un ou seus antecessores já descumpriram promessas de paz outras vezes. Com isso estaríamos assistindo a uma palhaçada internacional sem valor objetivo.

Há um estúpido desconhecimento, nesse jogo, das circunstâncias atuais e das próprias condições coreanas internas. Inicialmente, trata-se de um desconhecimento da parte norte-americana, que faz um jogo tão decisivo quanto o de sua contraparte. Creio que, no Brasil, tenho sido dos poucos comentaristas que vêem um lado positivo em Donald Trump no campo internacional. É um homem de negócios, não um geopolítico. Isso, na campanha eleitoral, o distinguiu radicalmente de Hillary Clinton, senhora da guerra, inclusive do assassinato de Kadafi no contexto da chamada Primavera Árabe, ou da matança árabe.

O assassinato de Kadafi, e a derrubada de outros governantes árabes, inclusive do Egito, na chamada Primavera, alertou os coreanos sobre o que os esperava caso afrouxassem as cordas nas relações com Washington. Como conseqüência aceleraram seu projeto nuclear. A estratégia oficial que prevalecia nos Estados Unidos era de "regime change", ou seja, de mudança de regime dos países adversários conduzida por Barak Obama. A resposta de Trump, contra os geopolíticos belicistas, ainda na campanha, era a de respeitar as escolhas políticas dos países. Isso foi consagrado na nova estratégia dos EUA anunciada há alguns meses.

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Creio que o ataque à Síria, sob pretexto de que esta última bombardeou uma cidade de rebeldes com armas químicas, foi um gesto puramente simbólico de Trump. Na verdade, ele pretende apenas fazer o que um oficial havia recomendado para o fim da guerra do Vietnã no início dos anos 70: Declarar vitória e pular fora. Se a situação no Oriente Médio não fosse tão complexa, com tantas interesses envolvidos, países, curdos e terroristas, o presidente norte-americano já teria pulado fora pois sabe que não tem como vencer a guerra.

Para saber o que quer Kim Jong-um, é preciso saber o que quer Trump. No meu entender, ele quer simplesmente fazer negócios, beneficiar o capital americano. Diante do status já consagrado da Rússia e da China no plano do poder internacional, não há muito o que fazer em geopolítica. E sua contra-parte coreana, pensando no legado da família, provavelmente pensa em desenvolvimento e bem estar de sua população. Claro, para chegar ao desenvolvimento é preciso despertar o interesse americano num acordo que vai alem da questão militar, embora com algum conteúdo geopolítico residual.

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Na verdade, a Coréia do Norte é a grande oportunidade de mobilização de mão de obra disciplinada e abundante para exploração do capital no mundo atual. Um empresário como Trump sabe que não se pode deixar a Coréia em mãos exclusivas da China. O país dito miserável tem um tremendo desenvolvimento em informática capaz de invadir sistemas virtuais no mundo todo. Em pequena escala, a Coréia pode ser a China das próximas décadas, oferecendo ao apetite do grande capital internacional, sobretudo norte-americano, uma alta temporária na taxa média de lucro que atenderia seus interesses econômicos.

Não há acordo entre duas partes se elas não tem interesses próprios a serem atendidos. É uma grande tolice achar que a Coréia do Norte vai abrir mão de seus arsenais atômicos de graça. Também é tolice imaginar que Trump fará um acordo que não passe pelo total desarmamento de mísseis de longo alcance da Coréia. Um acordo paralelo poderá ser feito com o Japão nas mesmas bases. Mas a Coréia tem que ser compensada no campo econômico por suas concessões geopolíticas. Enfim, vejo com perspectivas bastante favoráveis o desenvolvimento dessas negociações, ao contrário da grande mídia superficial.

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