Sororidade

Fui ao ato das mulheres contra o inominável, tudo lindo! Fui às lágrimas: não saía da minha cabeça a imagem criada por Lula antes da sua prisão: “Vocês podem arrancar uma, duas flores... mas não podem impedir a chegada da primavera”. A primavera chegou chegando, e elas estavam lá



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Fui ao ato das mulheres contra o inominável, tudo lindo!

Fui às lágrimas: não saía da minha cabeça a imagem criada por Lula antes da sua prisão:

“Vocês podem arrancar uma, duas flores... mas não podem impedir a chegada da primavera”.

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A primavera chegou chegando, e elas estavam lá.

Atifiquei, gritei palavras de ordem, solidarizei-me com as irmãs de luta e fui dormir.

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E dormindo sonhei.

“Quero uma imagem/símbolo do dia 29/10 para grafitar nessa parede, tem uma sugestão?”

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Perguntou-me uma garota de cabelos cacheados e tiara de lenço na cabeça, enquanto sacudia as latas de tinta.

A parede de tintura descascada, carcomida pelo tempo e pelo abandono, estava repleta de marcas de tiro.

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“Uma imagem/símbolo?”, eu perguntei.

Ela ficou sacudindo o spray, a esperar.

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“Lembra da pintura do Caravaggio, a mulher com o busto nu, a bandeira da república francesa na mão, pisando em corpos...”

“A imagem/símbolo da revolução francesa... já sei”, ela me cortou. e começou a rascunhar na parede, enquanto falava comigo:

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“Foi lindo o ato, eu queria ter estado lá, mas sei que estive no coração de muitas das que ergueram os punhos nas ruas do Brasil e do exterior.”

Aí ela falou sobre a luta da mulher negra e pobre, da mulher com deficiência, da mulher acima do peso padrão, da mulher trans, da lésbica, da travesti... falou-me da diversidade que compõe o mosaico feminino.

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“Quando nos vestiram de rosa, não nos deram uma cor, nos forçaram ao monocromatismo”, ela seguia. “vermelho é cor de puta!”

Eu falei, “e preta é a cor do alvo no tiro ao alvo.”

Ela completou: “mentiram que éramos inimigas, que tínhamos que ter inveja umas das outras, que éramos um sexo frágil... mentiram que mulher ama sapatos, mas só quem ama sapatos é a mulher ocidental, porque exposta às propagandas que propagam que ela ama sapatos... a mulher sujeito é a antítese do homem abjeto”

Enquanto falávamos, ela desenhava. primeiro veio a pilha de corpos de homens no chão.

De pé apenas três mulheres. uma segurava um livro em cada mão, uma delas erguida aos céus.

A outra, de lado, mostrava o muque do braço, arregaçando a manga da camisa.

A terceira trazia um estandarte onde se lia: Declaração Universal dos Direitos da Mulher.

Aí, ela olhou pra mim e perguntou: “sabe por quê o lema da bandeira francesa tem a palavra fraternidade?”

Eu botei a mão no queixo, esperando.

Ela continuou: “fraternidade é a irmandade entre os homens. vem do latim Frater, que quer dizer irmão; por isso, Fratello em italiano.”

Compreendi a parada e disse a ela: “então, não é em busca de fraternidade que vocês estão?”

“Claro que não. é a fraternidade que une os eleitores do Coiso”, ela respondeu sem me olhar, ainda pintando.

“Fraternidade é o que vocês homens buscaram a vida toda. nós queremos sororidade. irmã em latim é Soror; por isso, irmã em italiano é Sorella. só a sororidade nos salva!”

Ela terminou o desenho e flutuou pelos ares como se ave fosse, pluma no céu plúmbeo.

Dei três passos pra trás e contemplei o desenho finalizado.

Não era a Marianne com a bandeira da França na mão, pisoteando os corpos.

Era a Marielle.

Com os cabelos cacheados e a tiara de lenço na cabeça, erguendo uma bandeira lilás com o símbolo feminino desenhado.

Ela escreveu em letras garrafais sobre o grafite: IGUALDADE, LIBERDADE E SORORIDADE.

Só me dei conta quando a mulher sumiu: a moça da pintura era a mesma que pintava.

Palavra da salvação.

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