Sobre a humildade
Que o governo da presidenta é um desastre em termos de comunicação não há a menor dúvida, mas falar fino com uma patota de arrogantes é patético
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Vovó detestava arrogância, mas nos dava sempre um conselho: “não sejam arrogantes com as pessoas humildes, nem sejam humildes com as pessoas arrogantes.”
Vovó dizia que até a humildade tinha limites, e sentenciava: “quem abaixa demais a cabeça acaba por mostrar o furico.”
Outro dia, o ministro da justiça foi à revistaveja mostrar o traseiro. Dessa vez ele veio a uma coletiva de imprensa, acompanhado de outro ministro, e mais uma vez abaixou demais a cabeça.
Na segunda-feira foi a mandatária que se inclinou aos microfones.
Que o governo da presidenta é um desastre em termos de comunicação não há a menor dúvida, mas falar fino com uma patota de arrogantes é patético.
Explico-me, mas antes de ir à presidenta, vou às ruas.
Abrem-se as cortinas. Cansada de ir à academia para caminhar numa esteira, a elite branca de olhos claros e sobrenome europeu decidiu ter o seu dia de pedestre.
E lá estavam eles a desfilar pelas ruas, sempre a olhar para as câmeras das Globo. A plenos pulmões, xingavam palavrões e cantavam o hino nacional, protagonizando um bisonho espetáculo de rave cívica.
Os cartazes não diziam coisa com coisa, uns queriam salvar a democracia pedindo uma ditadura militar; outros diziam Fora Lula, fora de onde?; alguns falavam em liberdade de imprensa enquanto imprensavam jornalistas da mídia livre; muitos tinham erro de ortografia e concordância; a maioria continha palavrões.
A bisonha patota bizarra bradava contra a corrupção, trajando uma blusa da seleção brasileira com o símbolo da CBF no peito, só faltou pedirem Ricardo Teixeira para presidente.
Simão Bacamarte, o alienista de Itaguaí, não hesitaria em encerrá-los, todos, na Casa Verde.
Ali marchavam, com garbo, os fiéis seguidores de Lobão, o licantropo profeta do ódio, o que escreveu o Manifesto do Nada na Terra do Nunca.
Cai o pano.
Saio das ruas e volto à presidenta.
Após a rave cívica, Dilma foi à TV e estendeu a mão aos desaforados. Falou fino e baixou a cabeça.
Engoliu a isca da humildade.
Atentai bem. Dilma falava à Nação no Dia Internacional da Mulher, enquanto essa gente do emblema da CBF batia panelas nas varandas chamando-a de vaca, puta e filha da puta.
Nas ruas, agora, empunhavam cartazes pedindo a sua morte, seu impedimento e a sua prisão.
É pra essa gente arrogante que a presidenta tem que se mostrar humilde?
O que tenho eu se madame quer bater panela na janela? A panela é dela, e ela que se entenda com os seus vizinhos.
Querem sair por aí com a camisa canarinho levantando cartazes? Desde que não quebrem nada nem ninguém, que o façam a vontade. É um direito.
Agora deixe que digam, que pensem, que falem...
Dilma deve se voltar para os que precisam do e de governo, devem se voltar aos movimentos sociais, às periferias, aos estudantes e trabalhadores menos abastados e dar respostas a eles, mais programas sociais, mais conquistas para negros, para mulheres, para pessoas com deficiência, garantia de emprego e renda, reforma agrária, inclusão de índios...
Se toda vez que madame bater panela na janela, e os revoltados online ficarem offline para caminhar nas ruas, o governo der uma entrevista coletiva para acalmá-los, eu vou acabar ficando furioso.
Dilma venceu a eleição há 5 meses. Amealhou 54 milhões de votos, a maioria, não pode ficar refém da turma da CBF, dos sociopatas de plantão e dos sonegadores da mídia velha.
Tem muita gente disposta a defender o governo Dilma, agora ela deveria ter a humildade de pedir que o defendam.
Quanto à turma da janela e da panela, um samba: “nessa vida não existe coisa mais feia, do que gente que vive chorando de barriga cheia.”
Palavra da salvação.
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