Sindicalista-constituinte da Venezuela explica recuperação de Maduro

Eleito para a Constituinte na lista da Central Sindical Bolivariana, o presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores em Água Potável, Raul Ordoñez, afirma em entrevista a Paulo Moreira Leite, colunista do 247, que o presidente Nicolás Maduro resistiu às tentativas de golpe da oposição porque "nunca se afastou do legado de Ho Chávez". O sindicalista diz a atual recuperação do governo ocorreu em função da Constituinte, "ideia de Maduro que  todos chamavam de  loucura, no início". No depoimento, ele comemora conquistas recentes contra o trabalho terceirizado mas que há "alguma coisa errada na economia".  

Eleito para a Constituinte na lista da Central Sindical Bolivariana, o presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores em Água Potável, Raul Ordoñez, afirma em entrevista a Paulo Moreira Leite, colunista do 247, que o presidente Nicolás Maduro resistiu às tentativas de golpe da oposição porque "nunca se afastou do legado de Ho Chávez". O sindicalista diz a atual recuperação do governo ocorreu em função da Constituinte, "ideia de Maduro que  todos chamavam de  loucura, no início". No depoimento, ele comemora conquistas recentes contra o trabalho terceirizado mas que há "alguma coisa errada na economia".  
Eleito para a Constituinte na lista da Central Sindical Bolivariana, o presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores em Água Potável, Raul Ordoñez, afirma em entrevista a Paulo Moreira Leite, colunista do 247, que o presidente Nicolás Maduro resistiu às tentativas de golpe da oposição porque "nunca se afastou do legado de Ho Chávez". O sindicalista diz a atual recuperação do governo ocorreu em função da Constituinte, "ideia de Maduro que  todos chamavam de  loucura, no início". No depoimento, ele comemora conquistas recentes contra o trabalho terceirizado mas que há "alguma coisa errada na economia".   (Foto: Paulo Moreira Leite)


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       Dias antes das eleições para governos estaduais na Venezuela, marcadas para este domingo, o sindicalista Raul Ordoñez conversou com o 247 em São Paulo”.

       “Acredito que o chavismo ganha 50% dos governos e a oposição faz a outra metade”, diz ele.

       Não é um resultado comparável a última eleição estadual, realizada em 2012, quando Hugo Chávez estava vivo. Em outro momento histórico e político, os aliados de Chávez fizeram 20 governadores – entre 23 possíveis.

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      “Mas o resultado seria muito pior se o governo Maduro não estivesse em recuperação nos últimos meses” adverte Raul Ordoñez.

       Presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores de Água Potável, uma versão local dos funcionários de empresas de saneamento, Raul Antônio Ordoñez Paz é um dos 545 membros da Assembleia Constituinte eleita em julho. Seu nome era o quarto de uma lista de 14 sindicalistas indicados pela Central Sindical Bolivariana para ocupar uma das 173 cadeiras – entre agricultores, pescadores, várias categorias de trabalhadores, indígenas e até cinco empresários – reservadas ao chamado setor social da Assembleia.

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       “Foi a partir da Constituinte que a situação política da Venezuela começou a se modificar”, diz Raul.

       O sindicalista recorda que, entre o 1º de Maio, quando Maduro anunciou a convocação da Constituinte, e a realização das eleições, em 30 de julho, o país enfrentou três meses de conflitos duros e violentos. Num esforço para intimidar a população e estimular o boicote, ocorreram cenas de baderna que produziram um número incontável de feridos e pelo menos 100 mortos.

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       No dia da votação, contudo, uma massa de 8 milhões de venezuelanos saiu de casa para caminhar pacificamente até a cabine eleitoral, deixando clara a vontade de buscar uma saída para a crise através da democracia. Derrotada até pela matemática – o número de eleitores presentes até superou os 7 milhões obtidos pelo principal candidato oposicionista na disputa presidencial anterior-- a oposição se recolheu. Quando a própria Constituinte convocou as eleições para governador, os adversários do governo correram para formar chapas e apresentar candidatos. “Agora reconhecem o trabalho da mesma Comissão Nacional Eleitoral que antes queriam desmoralizar e destruir” ironiza Raul.  

      Não há dúvida de que a eleição para a Constituinte ajudou a reforçar a liderança de Maduro, um herdeiro que levou tempo para ganhar alguma luz própria – fosse por suas próprias limitações, fosse por lideranças rivais que desde o primeiro dia, dentro do próprio governo, trabalham para ocupar seu lugar.

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      “Quando ele lançou a ideia de convocar uma Constituinte, a surpresa foi tão grande que muitos aliados diziam havia que era uma loucura,” recorda Raul Ordoñez. “Até os últimos dias,  estimava-se que o comparecimento não passaria dos cinco milhões, o que teria sido muito ruim. No final, foi uma vitória que mudou a situação do país, invertendo um quadro abertamente desfavorável”. (Aliado histórico e assumido da herança de Chávez, num país  polarizado em todas as esferas Raul Ordoñez fez questão de não se filiar ao PSUV, o partido criado por Hugo Chávez, convencido de que seria a melhor  maneira de manter a independência como liderança sindical).      

       A virada na situação venezuelana pode ser reconstituída e explicada. Em dezembro de 2015, os herdeiros de Hugo Chávez sofreram aquela que foi sua maior derrota eleitoral desde a posse do patrono no palácio presidencial de Miraflores, em 1999. Por uma margem de 56,3% contra 40,9%, a oposição fez uma maioria de 112 a 55 cadeiras na Assembleia Nacional. Recuperando uma força eleitoral que jamais a possuíra, contando com um apoio escancarado de Washington, a partir de 2016 reforçado pela sustentação aberta por parte da diplomacia submissa de Michel Temer, os adversários do chavismo partiram para cima de Maduro, produzindo uma situação artificial de violência, confronto e impasse sob medida para um golpe de Estado.  

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     “Eles cometeram um grande erro”, diz Raul Ordoñez. “Havia um descontentamento real. As pessoas faziam filas para ir às compras.  A inflação chegava a 400% no ano. A oposição fez campanha com a promessa de acabar com as filas. Essa era sua bandeira. Ninguém pode ser a favor de filas, ainda mais num país onde os preços não tem racionalidade nenhuma, e tanto podem refletir uma crise no abastecimento como uma manobra de especuladores. Mas, depois da vitória, a oposição não queria resolver nada disso. Acreditou que podia tentar acabar com o governo. O povo não aceitou”.

      Como boa parte dos analistas, Raul acredita que há dois anos, vivendo um ambiente de dificuldades crescentes, em 2015 uma parte do eleitorado resolveu fazer aquilo que os estudiosos chamam de “voto-castigo” contra Maduro. Apesar de dar seu voto aos adversários, eram cidadãos que continuavam reconhecendo um governo que, entre outras proezas, havia erguido 1,8 milhão de casas populares – uma barbaridade num país com 31 milhões de habitantes, algo como 12 milhões de Minha Casa Minha Vida no Brasil – e em menos de uma década colocou de pé uma política de saúde pública laureada pelos organismos internacionais, a começar pela Organização Mundial de Saúde.   

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     “Esses eleitores não tinham aderido às ideias da oposição. Continuavam a reconhecer o legado de Chávez.  Queriam protestar contra erros de um governo que, no fundo, ainda apoiavam. A oposição não percebeu isso. Partiu para a violência, fechando ruas, jogando bombas, como se fosse fazer uma insurreição com apoio popular. Os venezuelanos não acompanharam, não gostaram e os protestos se voltaram contra a oposição”.

      Nesse momento da conversa, coloco a Raul Ordoñez uma pergunta que, acredito, todo brasileiro faria em meu lugar:

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     -- Como explicar a sobrevivência de Maduro, que enfrentou uma crise econômica muito mais grave do que a brasileira, e uma oposição muito mais radical, e mesmo assim conseguiu sobreviver e reagir, evitando um golpe de Estado que parecia uma fatalidade?

       -- O primordial para nós foi a manutenção do legado de Hugo Chavez, diz Raul.  Maduro não tocou nas políticas sociais. Manteve os programas de saúde, de moradia, a distribuição de cestas básicas para as famílias de trabalhadores. Esse esforço para não abandonar a área social nos permitiu enfrentar as dificuldades. A maioria da população sabia que o governo estava a seu lado.  Isso explica por que, mesmo em 2016, no pior da crise, quando faltava luz, faltava água, o Maduro nunca ficou abaixo dos 18% de aprovação popular.  

       Com base em minhas visitas ao país, e também a partir de relatos de outros visitantes, pergunto pela “politização” da população venezuelana. Assunto presente em muitas conversas, ela costuma ser apontada como uma das razões para explicar a resistência popular para defender um governo ameaçado de forma permanente. Raul recorda que “Chávez foi um presidente que sempre prestou contas ao povo. Estava sempre na TV, explicando o que fazia e por que fazia. Quando uma coisa dava errado, também explicava. Dizia que todo mundo precisava conhecer seus direitos e lutar por eles,” diz, tirando um pequeno exemplar, em capa grossa, da Constituição da Venezuela, que Chávez convocou logo depois de assumir a presidência. “Todo venezuelano anda com um exemplar da Constituição no bolso da camisa”.

            Em sua passagem São Paulo, Raul Ordoñez teve um encontro com Vagner Freitas, presidente da CUT. Na conversa, ele falou de benefícios previstos pela Lei Orgânica do Trabalho, criada em 2012, que garante a estabilidade no emprego – as demissões só podem ocorrer por justa causa – e proíbe a terceirização, o que tem levado integração crescente de trabalhadores em atividades fins, sem intermediários de mão de obra. “De 2012 para cá, só no meu setor, 9 mil terceirizados foram absorvidos,” contou o sindicalista, relata o site da CUT.

           A Constituinte de 2017, destinada a complementar as resoluções daquela organizada em 1999,  que deixou o livrinho que todos carregam, e consultam durante discussões acaloradas, também tem um papel importante na organização da economia. O próprio Raul conta um dado pitoresco: “outro dia em estava em minha cidade, Maracaibo, quando vi uma dúzia de cebolas a venda por 300 bolívares. Um pouco mais adiante, encontrei duas dúzias que custavam 30 bolívares. Alguma coisa está errada, você não acha?”

         O senso comum costuma descrever as dificuldades da economia venezuelana por dois fatores combinados: a queda nos preços do petróleo e a manutenção dos esquemas – aqui chamados de populistas – de distribuição de renda e benefícios sociais. A solução para os problemas, segundo os fanáticos do Estado Mínimo, seria desmantelar os gastos sociais e adaptar a vida dos 31 milhões de venezuelanos a receita disponível do petróleo.

        Professora Titular da Pós Graduação da Universidade Simon Bolivar, a economista Pasqualina Curcio, uma das mais respeitadas do país, joga luzes inovadoras num debate muito mais complicado do que este. Numa série de trabalhos disponíveis na internet, a professora sustenta que o nó venezuelano não se encontra na fartura de petróleo nem no excesso de benefícios sociais, mas numa economia dominada por um gigantesco mercado de negro de dólares, capaz de desafiar o controle de governo e abrir as portas para manobras especulativas de grandes empresas privadas, em especial multinacionais, capazes de orientar a economia para ganhos financeiros sem fim.  

       Pasqualina está convencida de que o desabastecimento frequente das prateleiras venezuelanas “não tem explicação nas teorias econômicas mas se deve à luta política” em curso no país. Trabalhando com dados do Banco Central – referente a entrada e saída de dólares do país – e estatísticas de produção local, a professora sustenta que não há sinais de quedas significativas na importação de produtos de primeira necessidade nem na produção local, muito mais relevante para a vida cotidiana dos venezuelanos do que se imagina. Sua visão é que boa parte dessa produção é subfaturada e/ou contrabandeada em larga escala. Alvo de uma disputa até agora limitada ao meio acadêmico, deste debate está condenado a ocupar uma disputa prioritária nos trabalhos da Constituinte, pois envolve abertura da contabilidade das empresas, o controle efetivo das remessas de capital e outras medidas que sem dúvida irão aquecer, mais uma vez, a luta política em Caracas.     

 

 

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