Sinais de insatisfação

Uma análise isenta e cuidadosa das recentes declarações de dois membros da mais alta corte de Justiça do país – os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello – revela que eles não estão imunes à influência da mídia e, portanto, seguem a mesma linha de pensamento das manchetes



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Uma análise isenta e cuidadosa das recentes declarações de dois membros da mais alta corte de Justiça do país – os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello – revela que eles não estão imunes à influência da mídia e, portanto, seguem a mesma linha de pensamento das manchetes. A fala do presidente do Supremo Tribunal Federal, ao contrário da interpretação de alguns colunistas, não contém nenhum duro golpe nos golpistas, mas um indisfarçável descontentamento com o governo da presidenta Dilma Roussef. Ele disse: "Temos de ter a paciência de aguentar mais três anos sem nenhum golpe institucional". Se ele pede paciência para "aguentar" é porque não está gostando do governo, mas entende que é preciso respeitar a Constituição e esperar o término do mandato dela, sem nenhuma tentativa de impeachment, até porque não existe base legal para semelhante iniciativa.

Como guardião da Constituição, o ministro Lewandowski não admite nenhuma agressão à Carta Magna, como a interrupção do mandato legítimo da Presidenta, mas as suas palavras deixam evidente a sua insatisfação com o governo de Dilma, talvez pelo veto ao aumento pretendido pelo judiciário. Acredita, no entanto, na formação de novo equilíbrio de forças a partir das eleições municipais do próximo ano. "Devemos esperar mais um ano pelas eleições municipais", ele recomendou. Ou seja, insatisfeito com o governo do PT o presidente do STF aparentemente tem esperanças de que o quadro político comece a mudar com o pleito de 2016, quando outro partido poderá dar um passo importante na corrida pela conquista do poder nas eleições presidenciais de 2018. O ministro, pelo visto, quer mudanças, mas dentro da legalidade.

Por sua vez, o ministro Marco Aurélio Mello foi mais explícito e contundente em seu descontentamento ao afirmar que "hoje não há governo no Brasil". E acrescentou: "Não se consegue tocar medidas econômicas e financeiras indispensáveis à suplantação da crise mais séria, que é econômica e financeira". O ministro simplesmente repete o discurso da oposição, cujo sistemático ataque ao governo, desde o início do segundo mandato da presidenta Dilma Rousseff, é amplificado pela mídia. Constata-se, com as suas declarações, que ao bater diariamente na mesma tecla, a mídia conseguiu não apenas convencer parte do povo, mas também figuras de destaque da vida nacional que, por sua inteligência, nível de instrução e posição no contexto institucional, imaginava-se tivessem mais discernimento na análise da situação política do país.

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Marco Aurélio disse que a crise política deriva da desarmonia entre os poderes. Ora, até onde é possível perceber, não existe desarmonia entre os poderes, mas entre pessoas eventualmente ocupando cargos nos poderes. É o caso, por exemplo, do deputado Eduardo Cunha que, desde o início do seu mandato na presidência da Câmara, tem se empenhado em criar dificuldades ao governo, com o apoio da oposição e da mídia, produzindo um clima de instabilidade no país. Não é o poder legislativo, o Congresso Nacional, que no Brasil é constituído pela Câmara e Senado. Todo o ruído contra o governo é produzido na Câmara por Cunha, que agora, com a descoberta da sua fortuna em bancos suíços, acumulada com dinheiro suspeito, ficou sem moral para continuar sua cruzada contra Dilma e está na iminência de perder a presidência da Casa e o mandato.

Todo mundo sabe, também, que essa alardeada crise, trombeteada diariamente pela imprensa, na verdade é política, fabricada pelo senador Aécio Neves e seus acólitos, inconformados com a derrota nas eleições presidenciais do ano passado. Não fora o apoio da mídia, dando ampla cobertura e repercutindo as manifestações dos oposicionistas, não haveria crise nenhuma. Ao contrário do que o ministro afirmou, existe governo, sim, com todas as instituições funcionando plenamente, apesar dos obstáculos criados por oposicionistas descomprometidos com os interesses maiores da Nação. Ele exagerou na sua declaração, visivelmente influenciado pelo noticiário da grande mídia, de certo modo surpreendendo e decepcionando os que o imaginavam com maior acuidade e moderação na análise da situação.

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O que mais preocupa na declaração do ministro Marco Aurélio, no entanto, foi a afirmativa de que o Bolsa Família, o mais importante programa social do governo petista, criou uma "casta de acomodados" e agravou os problemas do país. Ora, esse programa é reconhecido mundialmente como um dos mais importantes do planeta no combate à pobreza, o que valeu ao ex-presidente Lula vários títulos concedidos por diversos países. Com semelhante declaração o ministro revela-se contrário ao Bolsa Família e, mais do que isso, o considera um problema, quando, na verdade, ele é visto mundialmente como solução. O ministro revela, desse modo, que se deixou influenciar e está afinado com a visão retrógrada, segundo a qual o programa estimulou a preguiça e a vagabundagem entre os brasileiros pobres. "Casta de acomodados" é piada.

Prova da influência da mídia na ótica dos dois ministros do Supremo é que os estrangeiros, que não sofrem diariamente o massacre do noticiário oposicionista, não têm a mesma visão do Brasil. O ex-presidente americano Bill Clinton, por exemplo, em recente conferência em Brasilia, disse que "é natural que eventos negativos dominem as manchetes, mas o futuro é forjado pelas perspectivas de longo prazo", acrescentando que há "poucos lugares no mundo" para ser tão otimista como no Brasil. Ele disse ainda que "há mais notas positivas do que negativas sobre o Brasil, cujo barco não está afundando". Depois de afirmar que os desafios econômicos que o Brasil enfrenta deveriam ser vistos com mais tranquilidade, Clinton concluiu: "Eu conclamo vocês a refletir sobre as notáveis mudanças que ocorreram no país durante os últimos 20 anos".

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Na verdade, o brasileiro tem o mau hábito de falar mal do seu próprio país, mas felizmente ainda existem muitos, entre eles intelectuais e personalidades de reconhecido saber, que não se deixaram induzir pelo pessimismo disseminado pela mídia e tem consciência de que o quadro, para outros desastroso, foi pintado com tintas de ódio e ambição e não corresponde à realidade do país. Ninguém tem dúvidas de que o Brasil está precisando de reformas, inclusive no setor de comunicação, até porque a dinâmica da vida exige permanente aperfeiçoamento das instituições, mas daí afirmar-se que está sem governo vai uma abissal diferença. A presidenta Dilma e demais integrantes do governo, no entanto, devem estar atentos a esses sinais de insatisfação, até porque agora não partiram da oposição, mas de dois integrantes da mais alta corte de Justiça do país, sobre os quais não pesa nenhuma suspeita de preferências político-partidárias.

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