Senado vai legalizar a inquisição cultural no Brasil?
Se a Comissão levar adiante essa ação insana estará contribuindo para insuflar os ânimos entre democratas conscientes e grupos de inspiração e técnicas fascistas que ganham cliques nas mídias sociais ultimamente reproduzindo práticas comuns da Inquisição, a queima em fogueiras em praça pública de bonecos de seus desafetos: intelectuais, artistas, cientistas políticos e sociais, todos defensores da democracia.
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A Nação brasileira deve se unir e dar um basta imediato ao retrocesso que avança a passos largos sobre todos nós.
Retrocesso político, social, econômico e cultural. Quero hoje, no entanto, chamar atenção para o mais sórdido e mais enganoso aspecto de tentativa de dominação de um povo: o cultural.
Fiquei pasmo ao ver nos jornais que a Comissão Parlamentar de Investigação (CPI) dos Maus-tratos no Senado aprovou na quarta-feira, 8, o pedido do senador Magno Malta (PR-ES) para que sejam levados para depoimento, em condução coercitiva, o artista Wagner Schwartz e o curador da mostra Queermuseu, Gaudêncio Fidélis.
Que bestialidade é essa? O que tem a ver a CPI dos Maus Tratos com uma exposição de arte, onde transformou-se em tempestade o fato de um ator estar nu deitado inerte no chão de uma sala, onde só entrava quem quisesse?
Se permitirmos que a direita reacionária se fantasie de defensores da arte, da “boa” cultura, e dos “bons” costumes, e não nos indignarmos à altura, amanhã baterão a nossa porta para nos levar porque temos na parede uma obra de arte de um nu, dita imoral pelos cães de guarda do golpe que conhecem e usam muito bem as técnicas facistas de controle de opinião.
Na verdade, não estão preocupados com crianças eventualmente em exposições de arte verem nus, mas sim obedecem a uma estratégia definida: se entrincheiraram no tema da moral para atacar e destruir
todos aqueles que tem alguma visibilidade para defender o país contra o avanço do roteiro do golpe da quadrilha de Temers, Aécios, Jucás...
Quem são estas pessoas? artistas, atores, intelectuais, reitores, professores, cientistas.
A censura foi uma das armas das quais o regime militar se valeu para calar seus opositores e impedir que qualquer tipo de mensagem contrária a seus interesses fosse amplamente divulgada.
O regime militar usou de critérios políticos para censurar o jornalismo, ao passo que, na censura de artes e espetáculos, serviu-se principalmente de critérios morais.
Exatamente o que está voltando a acontecer agora.
Que tipo de resultados os senadores da CPI pretendem obter levando coercitivamente duas figuras do mundo das artes para depor na CPI?
Uma vez que a exposição já ocorreu o que os senadores podem lhe perguntar? Se estão arrependidos como era feito na Inquisição para serem inocentados e ganharem o reino dos céus?
Ou querem atrair para si um resto das luzes imundas que o MBL e sua turma jogou amestradamente sobre a questão e ganhar votos do público retrógrado moralista do país?
Quem sabe os senhores senadores pretendem encampar na Comissão a missão do Serviço de Censura de Diversões Públicas (SCDP) do Ministério da Justiça da época da ditadura?
A censura prévia ou em visitas de surpresa na calada da noite era feita para jornais, rádios, tevês, cinemas, teatros. Eram os deuses a decidir o que se podia ou não publicar, exibir, apresentar, cantar.
As vezes entravam inesperadamente na hora do fechamento dos jornais para checar manchetes e alterá-las. Muitas vezes proibiam uma reportagem inteira e só restava ao editor publicar na última hora uma poesia ou uma receita. Ao ver uma poesia na página de política o público já sabia que na noite anterior o censor havia visitado a editoração, a diagramação ou até mesmo o jornal já na gráfica.
Quantas músicas de Chico Buarque, Caetano Veloso, Milton Nascimento, Rita Lee, Geraldo Vandré e dezenas de outros foram proibidas de serem tocadas nas rádios? De serem gravadas pelas gravadoras ...
Estaremos, senhores senadores, caminhando de novo para isso, com a cumplicidade de vossas excelências?
O que poderão dizer a um curador de arte do quilate de Gaudêncio Fidelis, a não ser tentar humilhá-lo, levando-o coercivamente a prestar depoimento numa comissão onde nenhum dos senadores é especialista em artes?
Cuidado, senhores senadores.
Não contribuam para transformar o Brasil num imenso país dominado pelo pânico, terror e medo como nos tempos da Inquisição, onde todos aqueles que pensavam diferente da Igreja Católica tinham seus corpos queimados vivos e ouviam na hora da morte que sua alma também arderia no fogo do inferno.
A liberdade de expressão e manifestação é garantida por nossa Constituição. Assim como aqui vai visitar uma exposição quem quer, na Europa só visita museus com as pinturas das mulheres nuas de Renoir quem quer.
Só visita o Museu D’Orsay, em Paris, e suas centenas de esculturas de nus quem quer, cuja última campanha, inclusive, foi “Traga seu filho para ver gente pelada”.
Nascemos e morremos nus, e o nu sempre foi tema das artes em todos os tempos.
A verdade é que a direita brasileira instalada nos três poderes e na sociedade tem exercido com maestria após o impeachment de Dilma Rousseff a arte do descumprir a lei, burlar a lei, cometer ilícitos em nome de leis inexistentes, abusando de autoridade.
Se a Comissão levar adiante essa ação insana estará contribuindo para insuflar os ânimos entre democratas conscientes e grupos de inspiração e técnicas fascistas que ganham cliques nas mídias sociais ultimamente reproduzindo práticas comuns da Inquisição, a queima em fogueiras em praça pública de bonecos de seus desafetos: intelectuais, artistas, cientistas políticos e sociais, todos defensores da democracia.
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