Sem pós-graduação não há ciência: pelo reajuste imediato dos salários de pesquisadores
O urgente reajuste do salário de pesquisadores da pós-graduação é apenas a ponta do iceberg, afirmam Carla Teixeira e Carolina Giovanetti
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Por Carla Teixeira e Carolina Giovanetti
O investimento em ciência e educação é a chave para o desenvolvimento de qualquer país que almeja a soberania e a independência. Atualmente, mais de 90% do conhecimento científico produzido no Brasil é realizado dentro das universidades federais por jovens pesquisadores em formação. Os estudantes de pós-graduação que contam com financiamento de suas pesquisas recebem recursos das agências federais como CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), ou de fundações de fomento estaduais.
Para ter sua pesquisa financiada pelas agências, o pesquisador precisa consentir com uma série de exigências: dedicação exclusiva sem qualquer outra fonte de renda, cumprimento de obrigações acadêmicas definidas pelo programa de pós-graduação em que está vinculado, além do estrito respeito ao prazo para a entrega do resultado final do trabalho, em formato de dissertação ou tese. Tudo isso sem contar com qualquer direito trabalhista ou previdenciário que garanta estabilidade para seu futuro.
Apesar de todas essas demandas por parte das agências, o valor dos salários de pesquisadores (anacronicamente ainda referido como “bolsa de pesquisa”) atingiu o menor nível em sua história, tornando impossível para um pesquisador que possui dependentes consentir com a exigência de dedicação exclusiva sem qualquer outra fonte de renda. A título de exemplo, em 1995, o salário de um doutorando correspondia ao valor de dez salários mínimos e possibilitava a compra de até 12 cestas básicas. Em fevereiro de 2023, o salário de doutorando corresponde a 1,8 salário mínimo e permite comprar apenas três cestas básicas.
Desde 2013 não há qualquer reajuste no valor pago pelas agências aos pesquisadores da pós-graduação. A inflação acumulada desde então soma 66%. As consequências da crescente precarização da pós-graduação brasileira não afetam apenas os pesquisadores, mas toda a ciência nacional que se vê condenada ao permanente subdesenvolvimento. Com isso, a área tem deixado de atrair bons alunos, que preferem buscar empregos que oferecem maiores salários e estabilidade do que as agências.
Muitos programas de pós-graduação altamente qualificados não conseguem preencher suas vagas em seleções públicas, evidenciando o risco de um “apagão” na ciência nacional, atualmente incapaz de atrair jovens talentos. Se a situação enquanto pesquisador em formação é dramática, para os que alcançam a titulação (como mestres e doutores, por exemplo), há ainda o problema do desemprego ou do subemprego devido às quase extintas oportunidades na área acadêmica e ao baixo valor do salário de pós-doutorandos. Tudo isso leva muitos pesquisadores a buscarem ocupações em países estrangeiros - a chamada “fuga de cérebros”.
Em janeiro deste ano, o ministro da Educação Camilo Santana (PT) anunciou o anúncio (sim, soa redundante, leitor!) do reajuste dos salários de pesquisadores para o final daquele mês, posteriormente postergado para fevereiro. Durante a 13ª Bienal da UNE (União Nacional dos Estudantes) a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos (PCdoB), contradisse o ministro ao afirmar que o reajuste sairia “ainda no primeiro semestre”, sem data definida. O comentário infeliz da ministra matou a previsão de Santana e gerou insatisfação entre os pesquisadores. Diante da pressão, a ministra voltou atrás e indicou que o reajuste deve sair ainda nesta semana (sim, foi mais um anúncio do anúncio).
De qualquer maneira, o urgente reajuste do salário de pesquisadores da pós-graduação é apenas a ponta do iceberg. É fundamental repensar o trabalho acadêmico atual. Muitos professores pesquisadores das universidades federais estão submetidos a uma carga de trabalho abusiva que resulta em acúmulo de funções e leva ao adoecimento físico e mental. A carreira docente de 40 horas semanais com Dedicação Exclusiva não tem futuro. É preciso diminuir a carga horária e aumentar o número de quadros preparados para que seja possível absorver e manter no Brasil toda a mão de obra qualificada que está em formação ou já está formada. Os desafios são inúmeros, mas temos de enfrentá-los. A valorização da educação, da ciência e da tecnologia nacional é a chave para o desenvolvimento e a consolidação do Brasil como país soberano, próspero e altivo.
*Carolina Giovanetti é doutoranda em educação na UFMG.
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