Se o Exército tem honra, que exija a retomada da economia

A decisão de contratar 7 mil reservistas para emprego temporário no INSS não é somente uma estupidez administrativa, mas um acinte às Forças Armadas e ao povo



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Os exércitos da Antiguidade lutavam pelos saques e butins obtidos com a vitória em guerras de conquista. Os da Idade Média, por dinheiro sonante, pago antes mesmo da batalha, decidida mais pela sorte do que pelos combates dos cavaleiros. Os da Idade Moderna, da escola de Napoleão, pela honra de servir o Imperador e a Pátria. Para que servem agora e como são remunerados os exércitos brasileiros? Servem pelo butim de guerra, pelo dinheiro, pela honra? Ou simplesmente por Jair Bolsonaro, o déspota, que faz deles gato e sapato?

A decisão de contratar 7 mil reservistas para emprego temporário no INSS não é somente uma estupidez administrativa, mas um acinte às Forças Armadas e ao povo. Do ponto de vista administrativo é absolutamente inócua. O trabalho nas agências do INSS é altamente técnico, especializado e extenuante. Bolsonaro pensa reconhecer isso quando oferece aos reservistas que pretende levar para Instituto o valor correspondente a 30% do salário deles . Em termos da renda que auferem, será como um aumento no provento de 30%.

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O problema não se encontra aí. Bolsonaro não se deu conta de que sua proposta viola todos os cânones da legislação trabalhista, inclusive a de Temer. Disse ele, textualmente, na sua linguagem tosca: “Está tendo um equívoco. Por que (contratar) militar da reserva? Porque a legislação garante. Se você contratar civis, para mandar embora entra na Justiça, direito trabalhista, complica o negócio. O militar é fácil. Eu contrato hoje e demito amanhã sem problema nenhum, problema zero.” Ou seja, é o Presidente que prega salário precário.

De fato, estamos diante de um Presidente da República que anuncia à Nação que vai pagar a reservistas das Forças Armadas um salário, equivalente a 30% de sua remuneração normal, para que ele faça serviços especializados exigidos de servidores públicos concursados. Isso é violação de organização do serviço público e da lei do salário mínimo, promovida pelo próprio Estado, o que comporta a abertura de um processo penal e ou de processo de impeachment,  Curiosamente, a mídia não entendeu ou não quis entender essa violação.

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Note que os reservistas serão treinados pelos servidores seniores do INSS. A reação natural deste será, no melhor dos casos, um certo desinteresse pelo trabalho pedagógico. No pior, uma sabotagem deliberada por conta da desvantagem em termos de desequilíbrio na remuneração salarial. Assim, o gênio que soprou no ouvido de Bolsonaro a “grande” solução para a estupidez criada administrativamente pela chamada reforma da Previdência não passa de imbecil. Ou o imbecil, desculpe, é o próprio Presidente.

Essa patacoada presidencial decorre da crença de Bolsonaro de que o Exército resolve de forma mágica todos os problemas do país. Incêndio na Amazônia, chame o Exército depois de muita tergiversação; óleo nas praias, chame o Exército; desmatamento, lá vai de novo o Exército; desastre em Brumadinho, chame o Exército. O substrato ideológico disso é o seguinte: como o Estado está sendo desmontado de acordo com a cartilha neoliberal, e como, não se pode contratar servidores, a solução é usar a mão de obra de “graça” do Exército.

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Foi ameaçando com a mobilização do Exército que o governo Bolsonaro desarticulou, ainda no nascedouro, o movimento dos caminhoneiros contra o aumento do diesel e de outros combustíveis. Em outras palavras, o serviço público direto e o serviço público através do braço privado estão sendo desmantelados no altar do neoliberalismo, num processo cujo resultado final é o esmagamento da sociedade civil debaixo da bota dos militares, manipulada por um governo que não respeita nem os civis, nem os militares.

O curioso dessa história é que Bolsonaro ganhou as eleições pelo efeito de discursos demagógicos junto a caminhoneiros e oficiais de baixa patente ou sem patente nas Forças Armadas. Assim como os caminhoneiros, o pessoal de baixa patente, de coronel para baixo, desenvolveu um devoção canina para com ele, com base em expectativa salarial e de renda. Essa fé irracional no “mito” estimulou Bolsonaro, já como presidente, a praticar uma traição infame: Guedes o convenceu a fazer uma política inconsistente para o diesel e para as Forças.

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Assim, a essência da política de proventos das Forças Armadas se materializou na reforma previdenciária: tudo para os de alta patente, nada para os de baixo. Engana-se quem pensa que uma instituição como o Exército, de grandes contingentes, aceita com simpatia essa política que privilegia apenas o cume da pirâmide de renda e esmaga a tropa. Ao contrário. Os oficiais do Exército estão indignados, mas manietados: pensam que nada podem fazer. O determinante do sistema é Guedes, que faz do Estado mínimo seu projeto único.

A tragédia econômica brasileira, matriz da tragédia social, nos empurra para decisões de destino. O resgate da honra do Exército deve vir junto com o resgate da economia, pois ninguém aceitaria pacificamente que apenas uma fração da sociedade se beneficiasse de uma eventual retomada da prosperidade. Para isso, contudo, é fundamental que Paulo Guedes seja expelido do comando da economia. Se isso implicar a explosão de todo o sistema econômico de Bolsonaro, seja lá o que isso significa, que seja feito já. A Nação é que não pode esperar!  

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