Se Lava Jato não parar, Temer cai e Dilma volta
Lá pelo fim de 2016, portanto, talvez venha a ser fácil para Dilma conseguir os três senadores que lhe faltam para rejeitar o impeachment no Senado e para, em um final surpreendente de tudo isso, recuperar o cargo que recebeu em 2014 da maioria democrática dos brasileiros
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Sempre me espanto com a incapacidade de grande, enorme, imensa, descomunal parcela das pessoas – muitas e muitas vezes, eu mesmo incluído – de não enxergar um tantinho mais à frente do balé cotidiano dos fatos. De não sermos capazes de calcular o que este ou aquele processo político – por exemplo – poderá gerar em breve.
Há quase três anos completos (em junho de 2013), uma quantidade assustadora de pessoas não enxergou que aquilo tudo ia dar merda – e era tão previsível, então… Nos tempos presentes, porém, demorei a enxergar aonde tudo o que está acontecendo iria dar.
Até uns seis meses atrás, o impeachment parecia a vitória definitiva da direita e o esmagamento da esquerda. Era difícil imaginar, então, que, tendo o Judiciário, o Legislativo, a Mídia, o Ministério Público e a Polícia Federal contra, Dilma poderia dar a volta por cima.
Na verdade, pouco antes e pouco depois da votação do impeachment na Câmara – evento que exibiria ao mundo a mediocridade e a profunda deformação moral do Poder Legislativo brasileiro – a queda definitiva da presidente parecia favas contadas…
Não era.
A esta altura, o governo Michel Temer deveria estar deslizando pelo cenário político em velocidade de cruzeiro, sem sobressaltos, com a mídia reproduzindo e produzindo (muito) só o que lhe seria favorável.
Acima de más notícias, no Congresso as diretrizes econômicas de longo prazo – aquelas que até há pouco vinham sendo negadas a Dilma – passariam a ser realidade como se estivessem deslizando sobre manteiga.
E, por fim, a exibição de “comando” de Temer no Congresso, com a aprovação fácil da meta fiscal.
Tudo estaria correndo às mil maravilhas para os golpistas se não fosse uma série de gravações feitas pelo ex-presidente da Transpetro e delator da Operação Lava Jato, Sergio Machado, que atingiu o governo de facto em cheio.
Romero Jucá era um dos homens-chave do golpe. Teria posição de protagonismo, seria o operador de Temer na Nova Ordem. A facilidade com que foi abatido, porém, mostra o potencial da Lava Jato se não for paralisada, mas mostra, também, que céus e terras se moverão para abafar um processo que pode gerar, se não o maior fenômeno social e político do Ocidente no século XXI, pelo menos o mais rico em ineditismos sócio-políticos-institucionais.
Como se fosse pouco a Lava Jato ter potencial para alcançar o novo governo, inclusive o próprio titular do novo governo, Michel Temer, a Operação teria potencial para alcançar o PSDB do senador Aécio Neves.
Salve-se quem puder, essa é a ordem do dia na política brasileira.
Não se salvará quase ninguém. E o que é pior: alguns correm o risco de ser sacrificados injustamente, nos dois – ou nos três, nos quatro ou mais – lados dessa guerra cívico-político-judicial-institucional em curso.
Tucanos e peemedebistas, entre tantos outros parlamentares e chefes do poder executivo, já estão até buscando advogados. A novidade é que a montanha de escândalos nunca apurados de tucanos e seus aliados está sofrendo um começo de avalanche. As pedras começam a se soltar e a montanha é quilométrica.
Com o PT fora do poder, massacrá-lo ainda mais tornou-se “desnecessário”. Ninguém chuta cachorro que pensa que está morto.
Enquanto isso, a disputa pelo poder prossegue. Neste momento, o melhor seria abafar a Lava Jato, mas a denunciação constante que os alvos do golpe têm feito contra as pretensões de enterrar investigações antes que cheguem a tucanos e até à própria mídia, tem surtido efeito.
A imprensa internacional já caiu matando após a divulgação da gravação entre o agora ex-ministro (após 12 dias) Romero Jucá e o ex-presidente da Transpetro Sergio Machado. Veículos estrangeiros podem enviar equipes de jornalismo investigativo para cobrir nossa crise política porque, como vem sendo cogitado, ela pode derivar de interesses geopolíticos de potencias estrangeiras.
Trocando em miúdos: o plano golpista contra Dilma foi bem tramado demais para ser obra (só) de brasileiros.
Enquanto isso, enquanto a dita “grande imprensa” brasileira tenta se fazer de trouxa diante da divulgação de que o impeachment foi levado a cabo para parar a Lava Jato derrubando sua única fiadora, Dilma Rousseff, a correspondente internacional da mídia brasileira não se deixa enganar e já decreta que o impeachment foi golpe, sim.
As dificuldades do governo golpista do Brasil no cenário internacional serão muitas. Haverá esfriamento de acordos e os investimentos estrangeiros e nacionais continuarão fora da ordem do dia devido àquilo que os nossos vizinhos sul-americanos chamam de “incertidumbre”, ou seja, incerteza.
Ninguém sabe quem vai estar governando o Brasil daqui a seis meses…
A questão mais perigosa, porém, vem agora. Trata-se da fraqueza do “presidente da República” de facto, Michel Temer. Além de seu “machistério” envolvido em corrupção, o próprio líder (de fachada) dos golpistas está enrolado até o pescoço na Lava Jato.
Em planilhas apreendidas pela Polícia Federal na casa de um executivo da Camargo Corrêa, Temer é citado 21 vezes entre 1996 e 1998, quando era deputado pelo PMDB, ao lado de quantias que somam US$ 345 mil.
A investigação ocorreu em 2009, durante a Operação Castelo de Areia, cujo alvo era a empreiteira, e apurava suspeitas de corrupção e pagamento de propina a políticos para obter contratos com o governo. Temer refutou as acusações e a Castelo de Areia não foi adiante.
Em 2014, a Operação Lava Jato prendeu três diretores da Camargo Corrêa e descobriu uma nova planilha que também apontava para Temer e políticos tucanos. O documento relaciona o vice-presidente a dois pagamentos de US$ 40 mil por projeto de pavimentação em Araçatuba e pela duplicação de uma rodovia em Praia Grande, cada um deles estimados em US$ 18 milhões.
Em 2015, Júlio Camargo, ex-consultor da empresa Toyo Setal, em acordo de delação premiada com a Lava Jato, afirmou que o lobista Fernando Baiano era operador da cota do PMDB no esquema de corrupção da Petrobras, representando principalmente o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e Michel Temer.
No ano passado, o nome de Temer apareceu ligado também à OAS, ao lado de Eduardo Cunha e Renan Calheiros. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, divulgou indícios de que Temer recebera R$ 5 milhões do dono da empreiteira, José Aldemário Pinheiro, condenado a 16 anos de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
A suspeita partiu de conversas registradas no celular de Pinheiro, apreendido em 2014, em que Cunha questiona o empreiteiro por ele pagar os cinco milhões de reais a Temer de uma vez e adiar o repasse aos outros líderes do PMDB.
Essa foi uma das informações que fundamentou a ordem do Supremo Tribunal Federal à Polícia Federal para que fosse deflagrada a Operação Catilinárias, que atingiu as principais lideranças do PMDB, como Eduardo Cunha, Renan Calheiros, o senador Edison Lobão (MA) e os ministros Celso Pansera e Henrique Eduardo Alves.
Em fevereiro deste ano, o senador Delcídio do Amaral (MS), em acordo de delação premiada, envolveu Temer em um caso de aquisição ilícita de etanol por meio da BR Distribuidora, ocorrido entre 1997 e 2001, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
No depoimento, Delcídio afirma que Temer chancelou a indicação de João Augusto Henriques e Jorge Zelada a cargos de direção da Petrobras; ambos foram condenados na Operação Lava Jato, sendo que Henriques é apontado como principal operador do esquema e teria sido apadrinhado por Temer.
Enfim, é “só” isso que pesa contra Temer.
Como a velocidade dos fatos está sendo muito superior à de um golpe que só será irreversível daqui a seis meses, não se descarta a possibilidade de que o atual governo chegue às eleições de 2016 totalmente exangue, ou que caia antes disso, com um processo correndo contra Temer em um Congresso fortemente pressionado pela opinião pública.
Lá pelo fim de 2016, portanto, talvez venha a ser fácil para Dilma conseguir os três senadores que lhe faltam para rejeitar o impeachment no Senado e para, em um final surpreendente de tudo isso, recuperar o cargo que recebeu em 2014 da maioria democrática dos brasileiros.
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