Racismo reverso existe?
Racismo é um sistema de opressão e, para haver racismo, deve haver relações de poder e os negros nunca possuíram poder institucional para ser racistas; a população negra foi sequestrada e escravizada e sofre um histórico de opressão e violência que ainda a exclui; porque para haver o tal racismo reverso, deveria ter existido navios branqueiros, escravização por mais de 300 anos da população branca
✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.
"O profetismo heroico de Zumbi, Mandela, Luther King e tantos outros, ainda não logrou descontaminar nossa cultura do ranço do preconceito e da discriminação." (Frei Beto).
O artigo "AFINAL, SOMOS RACISTAS?" tem gerado muitas manifestações e opiniões que chegam a mim pelas redes sociais ou por email.
Fato é que nós somos racistas e temos de debater tema com honestidade para superar e semear a paz nas relações humanas, pois é isso que somos: seres humanos.
Uma das manifestações recorrentes, daqueles que não se reconhecem racistas, mesmo sendo, é afirmar que também existe racismo de negros em relação aos brancos, chamado de "racismo reverso".
Bem, antes é necessário registrar que, antropologicamente, a palavra "raça", referindo-se a seres humanos, está superada, pois biologicamente significa "subespécie" e conota um preconceito contra certos grupos humanos, o que vem a ser "racismo". Às vezes se usa o termo "raça" para identificar um grupo cultural ou étnico-linguístico, mas seriam preferíveis os termos "população", "etnia" ou "cultura", o que significa dizer que a simples utilização do termo raça é, em si, erro e racismo.
Sendo assim acreditar num racismo dos negros em relação aos brancos é como ter convicções em colidência com evidências e provas.
Por quê?
Porque racismo é um sistema de opressão e, para haver racismo, deve haver relações de poder e os negros nunca possuíram poder institucional para ser racistas; a população negra foi sequestrada e escravizada e sofre um histórico de opressão e violência que ainda a exclui; porque para haver o tal racismo reverso, deveria ter existido navios branqueiros, escravização por mais de 300 anos da população branca, negação de direitos a essa população. Brancos são mortos por serem brancos, como escreveu a pesquisadora Djamila Ribeiro recentemente.
A verdade é que no nosso país o preconceito à negritude tem suas raízes na mais longa história de escravidão das três Américas, foram 350 anos e ainda que nossas leis condenem a discriminação, os negros são duplamente discriminados: por serem negros e pobres.
Ao escravo liberto foi negado acesso à terra, ele foi impedido de acesso às carreiras eclesiástica e militar - salvo na guerra do Brasil contra o Paraguai – e às escolas particulares.
Frei Beto conta que na década de 1950, no Colégio Dom Silvério, em Belo Horizonte, ouviu um dos irmãos apregoar na sala de aula que negros eram inaptos à matemática e às ciências abstratas.
Darcy Ribeiro afirmou que a característica e originalidade do racismo brasileiro é que ele não incide sobre a origem racial das pessoas, mas sobre a cor da pele; afirma ainda que negro é o negro retinto, o mulato já é o pardo e como tal meio branco, e se a pele é um pouco mais clara, já passa a incorporar a comunidade branca. Mas a mestiçagem por aqui nunca foi punida, mas louvada. As uniões inter-raciais nunca foram tidas como crime nem pecado, provavelmente porque o povoamento do Brasil não se deu por famílias europeias já formadas, cujas mulheres brancas combatessem todo o intercurso de mulheres negras. Nós surgimos, efetivamente, do cruzamento de uns poucos brancos com multidões de mulheres índias e negras.
Acresce que aqui se registra, também, uma branquização puramente social ou cultural. É o caso dos negros que, ascendendo socialmente, com êxito notório, passam a integrar grupos de convivência dos brancos, a casar-se entre eles e, afinal, a serem tidos como brancos.
E Darcy Ribeiro afirma ainda que por aqui a definição de negro não se aplica aos artistas ou profissionais de sucesso e exemplifica essa situação num diálogo de um artista negro, o pintor Santa Rosa, com um jovem, também negro, que lutava para ascender na carreira diplomática, queixando-se das imensas barreiras que dificultavam a ascensão das pessoas de cor. O pintor teria dito muito comovido: "Compreendo perfeitamente o seu caso, meu caro. Eu também já fui negro".
Inegável que a inconsciência branca é constrangedora e bárbara; pode ser verificada na promoção turística da mulata carnavalesca, ela sim liberada, por leis e censores, a exibir em público seu corpo nu, como mercadoria; essa mesma inconsciência protesta contra o direito de cotas para negros nas universidades e encara com suspeita o negro encontrado em espaços predominantemente ocupados por brancos; induz a polícia a expor garras ferozes ao revistar jovens negros, impondo a eles constrangimentos quase sempre injustos.
A Igreja católica já se pronunciou diversas vezes contra o preconceito baseado na cor da pele ou na etnia, proclamando, firmada na divina Revelação, a dignidade de toda a pessoa criada à imagem de Deus, a unidade do gênero humano no plano do Criador e a reconciliação com Deus de toda a humanidade pela Redenção de Cristo, que destruiu o muro de ódio que separava os mundos contrapostos, para que em Cristo se recapitulassem todos os seres humanos.
Com essas premissas, a Igreja prega o respeito recíproco dos grupos étnicos e a sua convivência fraterna, afinal a mensagem de Cristo foi para todos os povos e nações, sem distinção, nem preferências. É o tema repetido por São Paulo: "Não há distinção entre judeu e grego, porque todos têm um mesmo Senhor..." (Rm 10,12); "já não há judeu nem grego, nem escravo nem livre..., pois todos vós sois um em Cristo Jesus" (Gal 3, 28); coerente com o evangelho
O Papa Francisco tem lembrado que a Igreja Católica condena qualquer forma de racismo e intolerância e que essas questões devem ser enfrentadas de forma conjunta: onde uma minoria, perseguida e marginalizada devido a suas convicções religiosas ou por motivos étnicos, devem ser protegidas por todos, pois o valor do esforço conjunto, pois "Não às muralhas e construir, em compensação, pontes entre nossas culturas e tradições" é fundamental.
Essa é a reflexão.
iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popularAssine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:
Este artigo não representa a opinião do Brasil 247 e é de responsabilidade do colunista.
Comentários
Os comentários aqui postados expressam a opinião dos seus autores, responsáveis por seu teor, e não do 247