Que merda é essa, Porchat?

Se Porchat caiu em alguma armadilha, esta foi armada pelo seu subconsciente racializador, característico de "racistas em desconstrução" como ele.

Fabio Porchat e Leo Lins
Fabio Porchat e Leo Lins (Foto: Reprodução/Youtube | Reprodução/Instagram)


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Eu nunca me iludi com esse papo de antirracismo. Muito menos ainda, com racistas que se dizem em desconstrução. Principalmente, depois que comecei a ler "O pacto da branquitude", da professora Cida Bento, onde ela explica como os brancos, e, até mesmo os antirracistas, acabam sempre convergindo em algum ponto sensível às outras etnias. Afinal, a lógica racista sob a qual eles foram educados, com raras exceções, tem em sua essência a ideia de que eles são os normais, o padrão universal.

Como Cida Bento bem expressa em seu livro, "é evidente que os brancos não promovem reuniões secretas às cinco da manhã para definir como vão manter os seus privilégios e excluir os negros. Mas é como se assim fosse. ", e isso se dá, naturalmente, através de um pacto de cumplicidade que, quando não está excluindo pretos de forma direta, está relativizando suas questões, invisibilizando a sua representatividade e questionando as suas reivindicações. Tudo para manter o sacrossanto privilégio da branquitude. Mesmo que este se apresente de forma profana indecente e criminosa.

O humorista Fábio Porchat, que alega ter caído numa armadilha, ao se posicionar no twitter a respeito de uma decisão da justiça que derrubou do YouTube um vídeo do também humorista, Léo Lins, por conter piadas racistas, homofóbicas e contra outras minorias, classificou como "uma vergonha" e "inaceitável", a decisão do Ministério Público de São Paulo, que também proibiu cautelarmente o humorista de voltar  a manifestar o seu humor ácido, em razão de raça, cor, etnia, religião, cultura, origem, orientação sexual ou de gênero e condição de pessoa com deficiência. Algo que deveria estar sendo celebrado pela sociedade como uma conquista civilizatória. Mas, Fábio Porchat não gostou.

Ele voltou ao twitter para dizer que  é, evidentemente, contra o racismo e que, inclusive, é "muito aliado nessa luta faz tempo" Porchat escreveu ainda que já declarou que "o tal do limite do humor é a constituição", que acha ruim, triste, velho e desagradável fazer piada ofensiva, mas que não vê crime nisso. "Eu não faço, mas tem gente que faz. E tem gente que ri.", diz ele. Numa estranha defesa da liberdade de expressão,  sobretudo, para quem se diz um aliado na luta contra o racismo, Porchat também escreveu que "se tem gente que quer usar essa liberdade para ofender, pena. Mas pode.", e ainda terminou a sua bostagem, digo, postagem, dizendo que estava lutando contra a censura, não apenas dos comediantes, mas também de todas as pessoas que seriam impedidas de contar uma piada racista e homofóbica para os seus amigos de bairro. Segundo ele, "não é porque você se sentiu ofendido que aquilo não pode ser dito. " What?

Confesso que ao ler o conteúdo fiquei com a impressão de estar lendo o texto de uma esquete de humor, onde ele ironizava brancos que se diziam antirracistas, mas que defendiam o direito de humilhar pretos sob a égide da brincadeira e da liberdade de expressão. Pelo menos, ao meu ver, qualquer outra leitura que se faça a respeito de seu posicionamento é piada. E de muito mal gosto. Uma outra leitura, também possível, é que o perfil de Fábio tenha sido hackeado por Monark, aquele que defende o direito de ser nazista, e já declarou que piada racista não é crime. Mas isso é pouco provável.

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Se Porchat caiu em alguma armadilha, esta foi armada pelo seu subconsciente racializador, característico de racistas em desconstrução, que costumam se entregar em lapsos de branquitude colonialista e externar, sem querer querendo, a lógica de dominação branca herdada de seus ancestrais e que fez parte do seu processo educacional desde a infância. Uma prova disso  é quando ele defende que, mesmo sabendo que ofende ao outro, eu tenho o direito de dizer. E dane-se! Quem se sentir ofendido que procure a justiça. É sob essa mesma lógica intelectual reacionária, que se assenta os declaradamente racistas que, sabendo que a justiça é cega quando quer e branca quando precisa, seguem cometendo delitos raciais, seja a pretexto do humor ou por instintivo criminoso, certos de que não serão punidos como prevê a lei. Que também é branca e tem a predileção por submeter as minorias, em especial, os pretos,  ao seu rigor.

É lamentável saber que Fábio Porchat será seu próprio entrevistado, naquele programa onde famosos contam histórias surreais, pitorescas e divertidas de suas vidas. Ao terminar de contar a história de um cara que era antirracista, mas que defendia o direito à descaracterização e a desumanização de pessoas pretas sob a ótica do humor, ouvirá de uma plateia confusa e incrédula a pergunta: Que merda é essa, Porchat?

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