Quando não dá para ser razoável

A aposta na queda do presidente, não importa o caminho, carece de segurança quanto à estabilidade das articulações políticas para 2022, tanto no fascismo quanto nos setores democráticos



✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

Há momentos em que o limite entre a razoabilidade e a omissão é praticamente indiscernível, restando a intuição, a experiência, o tino político para definir que caminho seguir ante impasses improteláveis da política. Um é o que temos agora, com Bolsonaro à frente do Estado brasileiro numa situação crítica para a saúde pública, sem que este tenha competência para administrar a crise e, mais, com ele trabalhando contra o controle desta situação, demitindo o ministro que fazia bem o seu trabalho etc.

Pois que, nesse momento, parece irrazoável que ele permaneça no poder, ainda mais com um cardápio de crimes de responsabilidade, na letra da lei, para iniciar um processo que suspenderia o seu mandato. Por outro lado, há a questão da preservação da democracia, visto que o poder do voto, e tudo o que ele representa no crescimento da consciência democrática, não deve ser desconsiderado. Se a pessoa entende que pode tirar do poder o presidente que lhe desagrada, conforme ocorreu por três vezes na curta história de 32 anos da Nova República, sente-se sempre à vontade em votar sem refletir sobre os candidatos que têm à sua disposição.

continua após o anúncio

Uma eventual queda de Jair Bolsonaro da Presidência da República traria fraturas imensas para a democracia brasileira, insuflaria o golpismo em sua base social (que não cairá de 30%, a menos que ele incorra no erro de Dilma, de jogar contra os anseios da própria base, limite que Bolsonaro não dá mostras de cruzar), e jogaria o Brasil em eleições novamente desqualificadas em 2022. Ao invés de um possível acordo entre as forças políticas democráticas do país, à esquerda e à direita, para derrotar Bolsonaro num eventual segundo turno, teríamos neste cenário hipotético um país gerido por um inexpressível presidente Mourão, com um herdeiro político capitalizando o bolsonarismo e as demais forças políticas mais à vontade para seguir com suas estratégias políticas particularistas. Isto é, seria relaxada a tensão anti-Bolsonaro e enfraquecida a ideia de união contra sua reeleição. Continuaria minada a credibilidade institucional da política, abrindo caminho para um novo azarão, que muito facilmente seria o próprio Bolsonaro com um rosto diferente.

A aposta na queda do presidente, portanto, não importa o caminho, carece de segurança quanto à estabilidade das articulações políticas para 2022, tanto no fascismo quanto nos setores democráticos.

continua após o anúncio

Entretanto, manter Bolsonaro, hoje, é expor o Brasil e o seu povo ao risco de mais dois anos e meio de enfrentamento ao coronavírus e condução do pós-pandemia (não sabemos ao certo quanto tempo a Covid-19 vai estar por aí), o que envolve milhares de vidas e milhões de desempregados e afetados pela depressão econômica que virá. O ano de 2022 pode ser muito distante, caso se faça a opção de trabalhar o princípio, de fato razoável, de que a política deve seguir seus ritos institucionais porque assim se torna cada vez mais forte, na medida em que mais enraizada na população. 

Portanto, diferentemente do que vem argumentando, com propriedade, admita-se, e com razão num cenário já excepcional como o do ano passado, um importante analista político brasileiro, os ritos da democracia e o poder pedagógico do voto não devem estar à mesa. Não sem que se pese a ameaça civilizacional que se avizinha com Bolsonaro à frente da maior gestão de crise da história brasileira desde a Guerra do Paraguai. 

continua após o anúncio

Se for necessário recomeçar os passos da República no pós-bolsonarismo, que seja. Fato é que o presidente deve cair, porque o atalho para a redemocratização do país através do voto em 2022 pode não se mostrar acessível, se no caminho houver o pântano da ingovernabilidade e da insensatez em meio ao que deve ser o desastre humano e econômico do século, que está começando apenas a sua primeira década, mas não deve viver algo igual em 80 anos. 

Ressalte-se que, mesmo com a Segunda Guerra Mundial, a grande debacle econômica do século XX foi a de 1929. Na dúvida, basta olhar para a história, que não dá a verdade, visto os fatos serem dinâmicos, mas oferece as pistas sobre o que vivemos nesse momento.

continua após o anúncio

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Este artigo não representa a opinião do Brasil 247 e é de responsabilidade do colunista.

Comentários

Os comentários aqui postados expressam a opinião dos seus autores, responsáveis por seu teor, e não do 247

continua após o anúncio

Ao vivo na TV 247

Cortes 247