"Qual sua ideologia?": PF interroga por telefone cidadão comum que criticou Bolsonaro na rede social

PF ligou para Roger Orsi e perguntou se ele era filiado a partido político e por que criticava Bolsonaro na rede social. "Estado policial", disse a advogada dele ao jornalista Joaquim de Carvalho. Assista à entrevista com Orsi

Roger Orsi e a PF (Foto: reprodução)
Roger Orsi e a PF (Foto: reprodução) (Foto: Roger Orsi e a PF (Foto: reprodução))


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Por Joaquim de Carvalho

O profissional autônomo Roger Orsi foi investigado pela Polícia Federal por compartilhar no Facebook um meme que mostrava Jair Bolsonaro em um caixão e uma frase de Neymar: “Saudade do que a gente não viveu ainda”.

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A publicação foi feita em julho de 2019. Seis meses depois, Roger recebeu em seu celular a ligação de uma escrivã da Polícia Federal para intimá-lo a comparecer na Superintendência em São Paulo no mesmo dia ou no dia seguinte. Confira seu relato na entrevista em vídeo ao final desta coluna. 

Desempregado e vivendo de bicos, ele chegou a pensar que era um trote. “É sério mesmo? Tanta coisa acontecendo no país e eu recebo essa intimação. O que eu fiz?”, perguntou.

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A escrivã, como mostra a gravação feita por um aplicativo em seu celular, não revelou os motivos da investigação. “É uma ordem de Brasília”, respondeu. “É uma precatória lá de Brasília”, acrescentou.

“Precatória? O que é isso?”, questionou Orsi, que, aos 45 anos de idade, só havia entrado uma única vez numa delegacia de polícia, para registrar BO por roubo de seus documentos.

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Uma autoridade do setor da inteligência da PF em Brasília encaminhou a um delegado em São Paulo um conjunto de perguntas para que Orsi respondesse.

Entre as perguntas, estava uma que questionava sua ideologia e se ele tinha filiação partidária.

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“Foi uma ação ilegal”, diz Tânia Mandarino, do Coletivo Advogados pela Democracia, que assumiu a defesa de Orsi, mas não pode acompanhar seu depoimento, que acabou sendo realizado por telefone quando o seu cliente disse que não tinha dinheiro para o transporte até a delegacia.

“Todo cidadão tem o direito de saber por que está sendo investigado antes de prestar depoimento. A Polícia Federal não respeitou esse princípio que é básico no Estado Democrático de Direito”, observa a advogada.

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Roger nunca foi filiado a partido político, mas não se intimidou quando a escrivã questionou. “Qual é sua ideologia?”

Ele disse que é de esquerda e que acreditava estar sendo alvo da PF apenas por esse motivo. A policial quis saber por que ele havia criticado Bolsonaro.

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Ele então disse que Bolsonaro não tinha abandonado o discurso de ódio que caracterizou toda a sua carreira política, inclusive quando homenageou um torturador ao votar sim ao golpe contra Dilma Rousseff.

Também comentou que o governo Bolsonaro conduzia uma política econômica que prejudicava os mais pobres, como a reforma da Previdência.

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“Eu sou pobre, e não posso concordar com o governo”, disse.

A policial o interrogou mesmo ciente de que ele já tinha advogada e perguntou onde ele trabalhava.

Ele disse que era emprego temporário de 40 dias, e revelou que prestava serviços em uma rede de concessionárias.

"Quanto você recebe por mês?", quis saber a policial. "O que isso tem a ver com o meme que compartilhei?", respondeu.

A policial insistiu na pergunta e ele contou: "Dois mil reais por mês, mais ajuda de custo para transporte e alimentação". 

Para Tânia Mandarino, o episódio que envolveu Roger era o início de uma escalada que resultou na prisão de militantes esta semana em Brasília por protestaram contra a gestão catastrófica de Bolsonaro no enfrentamento da pandemia.

“Temos que enfrentar esse estado policial antes que seja tarde, se é que já não é tarde”, disse.

Procurada, a PF informou que a investigação que envolveu Orsi foi relatada e encaminhada à justiça, que arquivou o caso por iniciativa do Ministério Público Federal.

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