Projeto “anticrime” do Moro deixa brasileiros mais inseguros
Apesar de toda a propaganda, enganosa, deste projeto do Moro, o Brasil permanece à espera de uma verdadeira proposta para a área de segurança pública
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Não restam dúvidas de que a insegurança representa umas das principais preocupações do brasileiro. O poder público não pode se eximir em apresentar soluções. No entanto, o governo tenta vender ao povo gato por lebre com a proposta do ministro da Justiça. Como ressaltam inúmeros juristas, mesmo os alinhados com Sérgio Moro, não se trata de um projeto de segurança pública, mas simplesmente de uma mudança nas leis penais que não trarão nenhuma redução da criminalidade. Ao contrário, o problema poderá ser agravado com a licença para matar concedida às polícias e a flexibilização de garantias constitucionais do cidadão.
Ao contrário do que possa parecer, os cidadãos comuns já são muito frágeis perante o Estado. Contra um aparato constituído por diversas polícias, ministério público e todo o sistema Judiciário, o indivíduo conta tão somente com o seu advogado na função de defesa. Não foi por outro motivo que a Constituição Cidadã de 1988 trouxe instrumentos importantes para a proteção das garantias fundamentais, como liberdade de ir vir e direito ao julgamento justo.
Como em qualquer democracia do mundo, obviamente, as polícias também devem estar submetidas a instrumentos de controle para evitar ações excessivas. Dar à polícia licença para matar não interessa a ninguém, muito menos aos bons policiais. A lei já garante proteção aos agentes da lei quando reagem em legítima defesa. O que o projeto de Moro prevê é uma “legítima defesa preventiva”, ao falar em não punição caso o policial mate alguém em função de “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. Quem poderá valorar a quantidade de medo ou emoção que justifica essa ação extremada?
A polícia brasileira já é a que mais mata no mundo. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostra que, em 2017, foram 5.144 mortes cometidas por policiais na ativa, uma média de 14 por dia. E as maiores vítimas, como sempre, são os mais vulneráveis do ponto de vista social. Pesquisa sobre letalidade das polícias civis e militares paulistas, organizada pela Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo no ano passado, revelou que a população negra e periférica representa 65% das vítimas da violência policial.
É justo que o cidadão que sofre com a violência no dia-a-dia exija maior rigor na punição dos crimes. No entanto, é preciso deixar claro que leis com punições mais severas não vão reduzir milagrosamente a criminalidade. O que garante menor violência, como mostram diferentes experiências em diversas partes do mundo, é a combinação de dois fatores – garantia de punição e oferta de educação de qualidade aliada à proteção social.
Diferente do que possa parecer, o Brasil conta com leis muito rigorosas. Desde a promulgação do Código Penal, em 1940, até 2015, o país ganhou mais de 150 leis penais, quase 80% delas com punições mais severas. Mas, nesse mesmo período, a criminalidade só aumentou. Em 2016 atingiu a maior taxa até então registrada na história – 30 assassinatos por 100 mil pessoas. Em 1980, eram 11 assassinatos por 100 mil habitantes.
Está claro, por esses números, que endurecer penas representa unicamente uma falácia no que se refere ao combate ao crime. Até porque o já Brasil tem a segunda maior população carcerária do mundo, com quase 800 mil presos, sendo mais de um terço deles sequer passou por julgamento. Do que serve lei mais rigorosa se muitos dos crimes não são sequer julgados?
Mas o problema é ainda mais grave, pois o país certamente tem uma das menores taxas de resolução de homicídios do mundo – de aproximadamente 6%. E falo só de homicídios porque dos demais crimes não há sequer estatísticas. Na Inglaterra, para fins de comparação, a resolução de delitos chega a 90% dos casos, na França, a 80%, e nos Estados Unidos, a 65%.
Fica patente que um projeto de segurança pública de verdade deve passar necessariamente por melhores condições para o trabalho policial. Investimento em salários, em inteligência, em cooperação. Para não mencionar áreas conexas, como educação e melhores condições de vida.
Não custa lembrar que os países com menores índices de delinquência hoje são exatamente aqueles onde houve Estado de bem-estar social. A Escandinávia, por exemplo, tem menos de um assassinato por 100 mil habitantes. O índice também é baixo em outros países que adotaram a mesma fórmula de combinar educação de qualidade e proteção social com certeza de punição, como Japão, Coreia do Sul, Singapura e Taiwan.
E a proposta de lei apresentada pelo ministro sequer arranha essas áreas. Visivelmente mesmo aqueles que tinham uma simpatia por Moro esperavam mais dele, concordam que ele apresentou um projeto sem nenhuma solução efetiva para a Segurança Pública.
Aponto a necessidade urgente de nacionalizar a Segurança Pública num grande esforço em parceria com os estados para combater o narcotráfico nas nossas fronteiras e o crime organizado. É preciso integrar as forças de segurança no país, fazer uso de novas tecnologias, buscar as melhores práticas internacionais.
Apesar de toda a propaganda, enganosa, deste projeto do Moro, o Brasil permanece à espera de uma verdadeira proposta para a área de segurança pública.
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