Prisão de Lula poderá abalar o governo Temer

Não é tão simples assim prender um ex-presidente da República, principalmente quando ele, como é o caso de Lula, é o favorito nas próximas eleições. O governo Temer deverá avaliar se vale a pena dar esse passo que poderá desestabilizar a já delicada conjuntura política e até abalar o seu governo que precisa de uma situação política estável para recuperar a economia

Não é tão simples assim prender um ex-presidente da República, principalmente quando ele, como é o caso de Lula, é o favorito nas próximas eleições. O governo Temer deverá avaliar se vale a pena dar esse passo que poderá desestabilizar a já delicada conjuntura política e até abalar o seu governo que precisa de uma situação política estável para recuperar a economia
Não é tão simples assim prender um ex-presidente da República, principalmente quando ele, como é o caso de Lula, é o favorito nas próximas eleições. O governo Temer deverá avaliar se vale a pena dar esse passo que poderá desestabilizar a já delicada conjuntura política e até abalar o seu governo que precisa de uma situação política estável para recuperar a economia (Foto: Alex Solnik)


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Pipocam ali e acolá, com frequência cada vez maior, notas na imprensa sugerindo que a força-tarefa da Lava Jato ultima os preparativos para prender o ex-presidente Lula.

Apontam, como indícios, o retorno à prisão de seu amigo José Carlos Bumlai, a intimação de sua mulher e de seu primogênito para deporem acerca do sítio de Atibaia e do tríplex do Guarujá, a consolidação da delação de Delcídio do Amaral e a aprovação da delação-bomba de Marcelo Odebrecht.

Não há consenso em torno da data em que isso poderá acontecer, embora esteja tudo mais ou menos encaminhado do ponto de vista jurídico.

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Dizem, alguns, que será depois da Olimpíada, quando a imprensa estrangeira não estará mais aqui para repercutir o escândalo. Para outros, será ainda mais adiante, depois da aprovação do impeachment, quando Temer receber, finalmente, a faixa presidencial.

Todas as cinco prisões sofridas por presidentes ou ex-presidentes da República do Brasil, em 127 anos de história republicana – Marechal Hermes da Fonseca, Washington Luís, Arthur Bernardes, Café Filho e Juscelino Kubitcheck – deram-se em contextos políticos nos quais o regime democrático não vigorava total ou parcialmente e decorreram de decisões monocráticas ou de presidentes da República ou de altas autoridades militares que passaram por cima do Poder Judiciário, exorbitando de suas funções previstas na constituição.

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E sempre por motivos políticos, não devido a acusações vinculadas a corrupção.

Nenhum presidente ou ex-presidente da República ficou preso por mais de seis meses.

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Nenhum deles tinha o apoio popular que tem Lula, razão pela qual as consequências de sua eventual prisão são consideradas imprevisíveis e protestos violentos nas ruas não podem ser desconsiderados.

Trata-se de uma iniciativa com fortes implicações políticas que não poderá ser tomada apenas pelo juiz Sergio Moro sem consulta prévia a autoridades do governo e ao próprio presidente Temer. Eis porque não será viável enquanto ele for interino. Há exemplos na história de prisões que provocaram convulsões sociais de enormes proporções e até decretação do estado de sítio.

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A primeira prisão de ex-presidente deu-se em 1922.

Em 1921, Epitácio Pessoa havia convocado o Exército para conter rebeliões populares no Recife. O marechal Hermes da Fonseca, ex-presidente da República (1910-1914) foi contra e exortou as tropas a não reprimirem o povo.

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A tensão entre o governo, que era civil e os militares chegou ao ápice com a nomeação do civil Pandiá Calógeras para o ministério da Guerra.

A situação piorou quando, em outubro de 1921, uma carta manuscrita, que chamava o marechal Hermes da Fonseca de "sargentão sem compostura" e dizia que o Exército era formado por elementos "venais" foi publicada no "Jornal do Povo".

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A autoria foi creditada a Arthur Bernardes, candidato do governo à sucessão de Epitácio Pessoa, que negou.

Mas então uma segunda carta, semelhante à primeira saiu no mesmo jornal.

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Nada disso impediu a vitória de Artur Bernardes em março de 1922, apesar de contestada veementemente pela oposição.

A fim de sufocar os protestos, o ainda presidente Epitácio Pessoa decidiu, no dia 2 de julho, por meio de decreto presidencial prender o ex-presidente Hermes da Fonseca e fechar o Clube Militar, presidido por ele.

A repercussão foi terrível. Em todos os quartéis do do Rio de Janeiro começou a ser tramado um levante contra o governo.

O movimento seria desencadeado na madrugada de 5 de julho, no Forte de Copacabana, quartel general da rebelião, que, no entanto, foi cercado pelas tropas leais ao governo. O filho do marechal Hermes da Fonseca, capitão Euclides da Fonseca também foi preso.

O líder dos revoltosos, tenente Siqueira Campos, foi pressionado pelo ministro da Guerra, por telefone, para se entregar, mas resolveu resistir: deixou os portões do Forte abertos para os 301 rebeldes optarem por ficar ao seu lado ou abandonar a causa, conseguindo adesão de 29 militares.

Num gesto teatral e patriótico, um dos momentos mais lendários da história do Brasil do século XX, Siqueira Campos cortou uma bandeira nacional em 29 pedaços, entregando cada pedaço a um combatente. Encorajados por esse amuleto, os revolucionários, já reduzidos a apenas 20, na tarde de 6 de julho cruzaram os portões do Forte de Copacabana rumo à Praça Serzedelo Correa, onde as forças governistas os esperavam, certas de que iriam se entregar.

Mas eles não se renderam. O que se viu, em seguida, foi uma batalha sangrenta nas ruas da capital do país, no fim da qual todos os rebeldes tombaram mortos, inclusive Siqueira Campos. O episódio ficou conhecido com a Revolta dos 18 do Forte.

O banho de sangue não comoveu o presidente da República, que manteve o marechal Hermes da Fonseca encarcerado.

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Arthur Bernardes tomou posse na presidência da República em novembro de 1922, sob estado de sítio e com Hermes da Fonseca ainda preso. Ele seria libertado somente no mês seguinte, quando completou seis meses de cárcere.

A crise política não arrefeceu, tornou-se mais aguda, até que, em julho de 1924, em novo levante, um grupo de tenentes assumiu o controle da cidade de São Paulo manu miltari.

Sob fogo pesado das tropas do governo, eles resistiram por três semanas, depois do que partiram em retirada para o Paraná, onde se juntaram a rebeldes gaúchos, formando com eles um grupo de resistência que nos dois anos seguintes se deslocaria pelo interior do Brasil com o intento de derrubar o governo de Bernardes e que ficou conhecido como a Coluna Prestes.

Bernardes se manteve no poder, sempre protegido pelo estado de sítio que lhe dava o direito de prender quem quer que fosse e censurar a imprensa até novembro de 1926, quando passou o bastão ao novo presidente, Washington Luís.

Na eleição seguinte, em 1929, o presidente Washington Luís lançou seu conterrâneo Júlio Prestes, presidente do estado de São Paulo à sua sucessão rompendo a política do "café-com-leite": depois dele, um paulista "café", seria a vez do mineiro "leite".

Os mineiros não se conformaram. Uniram-se ao Rio Grande do Sul e à Paraíba e, num gesto de desapego ao poder abriram mão da disputa, apoiando o gaúcho Getúlio Vargas à presidência e o paraibano João Pessoa a vice.

Graças ao apoio de todos os outros 17 estados, não havia como Júlio Prestes não sair vitorioso nas urnas, o que foi confirmado a 1º. de março de 1930, mas, contra todas as evidências o resultado foi contestado pela Aliança Liberal que iniciou uma campanha pública contra Prestes, sob alegação de fraude.

Embora a alegação não procedesse – seria impossível três estados ganharem de 17 – o discurso dos getulistas se impôs como verdade, ganhou as ruas e tornou-se mais forte ainda quando o vice da chapa de Getúlio, João Pessoa foi assassinado.

Os getulistas aproveitaram para atribuir o crime aos aliados de Washington Luis e de Prestes, outra alegação inverídica, aumentando a onda a seu favor. Embalados pelo apoio da população, resolveram tomar o poder à força num golpe militar iniciado em 3 de outubro de 1930.

No dia 24 de outubro, os ministros militares, mancomunados com os getulistas, deram um ultimatum para Washington Luís renunciar, mas ele se recusava a deixar o Palácio do Catete, mesmo tendo sido derrotado militarmente. Para convencê-lo a se render foi preciso chamar uma autoridade religiosa, o Cardeal-Arcebispo do Rio de Janeiro, Sebastião Leme.

Acompanhado pelo religioso, ele seguiu até o carro presidencial, um Ford bigode, não sem antes perpetrar uma manobra que entraria para a história. Reza a lenda que ele ou um funcionário de sua confiança teria espalhado galhos no caminho, nas ceranias do palácio para que o automóvel fosse obrigado a diminuir a marcha.

Nesse momento, o intrépido jornalista Roberto Marinho, que estava de tocaia, disparou o seu flash produzindo uma foto histórica que foi publicada em oito colunas na primeira página do seu jornal no dia seguinte.

Graças a ela ficamos sabendo que o presidente deposto foi conduzido ao Forte de Copacabana em trajes de gala, usando cartola e fraque. E assim trajado entrou no presídio, onde ficou 27 dias.

Em 1930, Arthur Bernardes apoiou a candidatura de Getúlio e o golpe militar, chamado de a Revolução de 1930, mas mudou de lado dois anos depois, ajudando São Paulo a se levantar contra o "revolucionário" gaúcho, por ter perdido influência política em Minas, na Revolução Constitucionalista de 1932.

Na tentativa de levar a Força Pública de Minas a aderir aos paulistas foi preso, ao que saiba no meio de um canavial, tornando-se assim no terceiro presidente da República (no caso ex-presidente) preso da história do Brasil. Foi enviado para o exílio em Portugal, onde permaneceu por um ano e meio.

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Com a divulgação dos resultados oficiais do pleito de 1956, Juscelino Kubitcheck eleito presidente e João Goulart vice, a UDN deflagrou uma campanha contra a posse deles, sob a tese da necessidade de maioria absoluta, que a constituição não previa.

Os setores mais extremados do partido, liderados por Carlos Lacerda, intensificaram sua pregação favorável à deflagração de um golpe militar para evitar a posse dos eleitos. Entretanto, Café Filho, que assumira a presidência depois do suicídio de Vargas e o general Lott reafirmaram seu compromisso com a legalidade.

A crise se agravou a partir do discurso pronunciado pelo coronel Jurandir de Bizarria Mamede em 1º de novembro, durante o enterro do general Canrobert Pereira da Costa, falecido na véspera. Falando como porta-voz da diretoria do Clube Militar, Mamede posicionou-se contra a posse de JK e Jango, numa atitude considerada por Lott como desrespeitosa à hierarquia militar.

Mamede servia na ocasião na Escola Superior de Guerra (ESG), órgão vinculado à Presidência da República, o que obrigava o ministro da Guerra a pedir autorização a Café Filho para puni-lo.

O presidente, por sua vez, também estava sofrendo pressões de outra natureza. No dia 2 de novembro, recebeu um memorial assinado pelos três ministros militares solicitando o fechamento do jornal Imprensa Popular e de outros órgãos considerados comunistas, mas a medida foi considerada inconstitucional pelo ministro Prado Kelly.

Assoberbado pelo acúmulo de problemas, na manhã do dia 3 de novembro Café Filho foi acometido por um distúrbio cardiovascular e internado no Hospital dos Servidores do Estado, no Rio, o que forçou seu afastamento das atividades políticas. Mas, na interpretação do general Lott, então o militar número 1 do país, isso significou que ele não puniu Mamede, o que lhe traria consequências nefastas no futuro próximo.

Fora de combate, o presidente hospitalizado foi substituído a 8 de novembro, como determinava a constituição, pelo presidente da Câmara, Carlos Luz, político muito mais identificado com a golpista UDN que com o PSD, pelo qual fora eleito.

Como disfarçado, mas convicto udenista, o presidente interino se recusou a punir Mamede, provocando a demissão do general Lott. Em seu lugar colocou mais um simpatizante anti-JK e Jango, o general Álvaro Fiuza de Castro.

Tudo caminhava para um desfecho favorável aos udenistas, Lott começou, inclusive, a preparar a transmissão de cargo, mas, nesse ínterim foi instado por vários generais, especialmente por Odílio Denis a reagir, permanecer no cargo e depor Luz, em defesa da constituição. Em parte, é claro, pois ao defender a constituição por um lado ele a maculava, por outro.

Lott ordenou, na madrugada do dia 11 a ocupação da capital federal por tropas do Exército, impedindo a entrada de Luz no Palácio do Catete e obrigando-o a uma renúncia branca, horas depois, quando foi embarcado no cruzador Tamandaré, rumo a Santos.

No decorrer do dia 11, para que a ilegalidade fosse legitimada, o Congresso Nacional, em sessão extraordinária aprovou o "impedimento" de Carlos Luz por 228 votos contra 81, empossando Nereu Ramos, vice-presidente do Senado em exercício, na presidência da República.

Lott foi então reconduzido ao Ministério da Guerra, como homem-forte do regime.

No dia 13, Nereu Ramos visitou Café Filho no hospital, afirmando que permaneceria no governo apenas até sua recuperação.

Entretanto, Lott e outros generais decidiram vetar o retorno de Café Filho por considerá-lo suspeito de envolvimento na conspiração contra a posse dos candidatos eleitos – ao deixar de punir o golpista Mamede.

Mesmo assim, no dia 21, já restabelecido, Café Filho enviou a Nereu Ramos e aos presidentes da Câmara, do Senado e do STF uma declaração de que pretendia reassumir imediatamente seu cargo.

A notícia não agradou a Lott, que repetiu a ação desencadeada em relação a Luz, impedindo com suas tropas o acesso de Café Filho ao Palácio do Catete e a outros pontos nevrálgicos da capital.

Café Filho dirigiu-se então à sua residência, também cercada por forte aparato militar, que incluía grande número de veículos blindados. Deixaram que ele entrasse, mas não o deixaram sair. Ficou em prisão domiciliar.

Na madrugada de 22 de novembro, o Congresso também aprovou o "impedimento" de Café por 208 votos contra 109, confirmando Nereu Ramos como presidente até a posse de Juscelino em janeiro seguinte.

Em 14 de dezembro essa decisão foi confirmada pelo STF, que recusou o mandado de segurança impetrado por Prado Kelly em favor da posse de Café. Afastado da presidência, Café Filho ficou em prisão domiciliar até à posse de Juscelino.

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Na noite de 13 de dezembro de 1968, o ministro da Justiça do governo Costa e Silva, Luís Antônio da Gama e Silva, anunciou, em rede nacional de televisão, a promulgação do Ato Institucional nº 5 (AI-5), que suspendeu as garantias individuais dos brasileiros.

Naquela noite, o ex-presidente JK (1956-60) estava no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, onde atuava como paraninfo de uma turma de formandos em engenharia.

À saída, foi abordado por um oficial à paisana e conduzido, sem nenhuma ordem judicial, para um quartel em Niterói, onde permaneceu por vários dias, sem roupa para trocar e nada para ler, num pequeno quarto onde todos os seus movimentos eram observados, o tempo todo, através de um buraco no teto.

Libertado do quartel, nem assim ganhou a liberdade: seguiu para o seu apartamento, na zona sul do Rio, onde cumpriu pena de um mês de prisão domiciliar, novamente sem acusação formal nem julgamento.

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Não é tão simples assim prender um ex-presidente da República, principalmente quando ele, como é o caso de Lula, é o favorito nas próximas eleições.

O governo Temer deverá avaliar se vale a pena dar esse passo que poderá desestabilizar a já delicada conjuntura política e até abalar o seu governo que precisa de uma situação política estável para recuperar a economia.

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