Presidente frouxo permite militarização do poder

"A militarização do governo é o principal obstáculo para o retorno da democracia no Brasil. Um governo sem legitimidade, sem capacidade de governar, que desagrega quando deveria comandar o país numa crise grave como esta, abre o caminho para a instauração de um poder militar dentro do Estado", escreve o sociólogo Emir Sader sobre o governo Bolsonaro

Jair Bolsonaro
Jair Bolsonaro (Foto: REUTERS/Adriano Machado)


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Não há vazio em política. Sempre que se dá esse vazio, aparecem instituições que o preenchem. As FFAA têm se prestado a esse papel e voltam a fazê-lo.

Em 1964 forjaram esse vazio para intervir, atuando fortemente para desgastar o já fraco governo do Jango. Apoiados na Doutrina de Segurança Nacional, corroeram a legitimidade do governo e deram o golpe, substituindo os ineptos políticos tradicionais e dando sua direção ao país por mais de duas décadas. Com o “pega ladrão” de que a democracia estava em perigo, liquidaram ela durante mais de duas décadas.

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Agora, de novo os partidos tradicionais entraram em crise, derrotados sistematicamente pelo PT, sem alternativas para disputar apoio popular, por assumirem o neoliberalismo.

Bolsonaro se valeu da nova crise dos partidos tradicionais para se propor como alternativa. Foi um bom candidato para a direita. Era o único que tinha um caudal de preferências nas pesquisas, graças a haver captado o apoio das bases tradicionalmente tucanas que tinham se radicalizado para posições de extrema direita. Com isso, Alckmin não tinha possibilidades e Bolsonaro era a única aposta possível da direita para montar uma monstruosa manobra, que terminou levando-o a ganhar fraudulentamente as eleições.

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Seu estilo desbocado, agressivo, grosseiro, projetou uma imagem de líder popular. Nomeou um ultra neoliberal na economia, para garantir o apoio dos grandes empresários. Apresentou-se como a única possibilidade para impedir a volta do PT ao governo. Montou gigantescas manipulações, diante dos olhos cúmplices do Judiciário e da mídia e assaltou o governo.

Nao tinha partido, apenas um grupo de aventureiros. Nao agrega, seu estilo, ao contrário, é desagregador. Foi um bom candidato para a direita, mas é um péssimo governante.

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Já tinha se reaproximado dos militares, para contar com o apoio da instituição e com pessoal para ocupar os cargos do Estado. E também para contar com uma instituição comprometida com a repressão e a defesa da ordem.

Conforme o partido do Bolsonaro foi se desagregando, se afastando dele, o governo foi ficando cada vez mais recheado de militares, da ativa e de retirados. Hoje eles compõem o governo, o próprio Palácio do Planalto, enquanto Bolsonaro se esvazia, perde apoio e perde capacidade de ação, situação ainda mais grave pela pandemia que se espalha pelo país.

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O vazio da capacidade de governar de Bolsonaro já está preenchido pelos militares, cada vez mais comprometidos, inclusive como instituição, com esse governo. Não sairão daí, se conseguirem ficar. Poder tentar a perigosa operação de substituição de substituição pelo Mourao ou simplesmente ir militarizando cada vez mais o governo, se constituírem em poder de veto das ações do governo e em único núcleo capaz de dar certo grau de governabilidade a um governo completamente perdido.

Não é a melhor forma para as FFAA, mas foi a que lhe caiu no colo e nao vao deixar de se aproveitar, tendo como objetivo fundamental a preservação do governo, modificado ou nao, e a construção de uma institucionalidade que trate de impedir o retorno do PT ao governo.

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Com a desagregação do esquema de governo do Bolsonaro, que perde não apenas apoio popular, mas também perdeu o apoio da mídia, de grandes setores da classe média, o militares se tornam estratégicos, condição de existência do governo, tendendo a ser, mais do que isso, coluna vertebral do governo. Um processo que se choca frontalmente com a restauração da democracia. A militarização do governo é o principal obstáculo para o retorno da democracia no Brasil. Um governo sem legitimidade, sem capacidade de governar, que desagrega quando deveria comandar o país numa crise grave como esta, abre o caminho para a instauração de um poder militar dentro do Estado.

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