Preservar a política pública
Como parece inevitável a aprovação do Orçamento impositivo, 50% do valor das emendas parlamentares deveria ser destinado à saúde
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O papel do congressista não é sugerir locais para a realização de obras, ou receber pedidos de prefeitos para a realização de obras, ou indicar recursos para serem gastos com a realização de obras.
A possibilidade de destinar recursos da União por meio da emenda parlamentar distorce o papel primordial do congressista: fiscalizar o Executivo e defender a população.
As emendas são, porém, um fato consumado. Nesse sentido, adotar um Orçamento puramente impositivo seria um verdadeiro disparate.
O instrumento, segundo seus defensores, acabaria com distorções na relação do governo com sua base de apoio no Congresso Nacional.
Mas, na verdade, a relação entre o Executivo e o Legislativo não deve condicionar votações ao atendimento de emendas parlamentares.
Embora grande parte dos congressistas atue com correção, quem não se lembra dos anões do Orçamento? Da chamada máfia dos sanguessugas, das ambulâncias? Quantos escândalos não estiveram vinculados a emendas parlamentares?
Tornar obrigatório o atendimento das emendas parlamentares, sem sujeição ao planejamento, significa dificultar a gestão do Orçamento, reduzir a margem de liberdade que o governo federal tem para executar sua política econômica.
Os contingenciamentos, muitas vezes necessários ao equilíbrio das contas públicas, são uma maneira de lidar com a conjuntura.
A emenda parlamentar desorganiza e, se for impositiva, implicará a desestruturação do trabalho dos ministérios com a elaboração das políticas públicas. Acaba o planejamento e a gestão de longo prazo.
Quando ocupava o cargo de ministro da Saúde, enfrentei essa dificuldade. A pasta definia, a partir das discussões que começavam numa região, o que era fundamental. Por exemplo: reforçar as unidades básicas de saúde. As emendas parlamentares, quando destinavam recursos para aquela área geográfica, previam outros usos para o recurso, em geral a distribuição de ambulâncias ou a aquisição de equipamentos que muitas vezes não tinham a ver com a demanda da população. A ação do governo acabava ficando comprometida.
O caráter impositivo, descomprometido com o planejamento, agrava esse problema ao reforçar o aspecto eleitoreiro das emendas.
A Câmara dos Deputados aprovou, em 13 de agosto, com 378 votos, a PEC 565/2006, matéria que ainda será avaliada no Senado.
Esse resultado, com 70 votos favoráveis além dos necessários, poderá fazer com que o Poder Executivo seja obrigado a reservar 1% da receita corrente líquida para o atendimento das emendas parlamentares.
Hoje, isso representaria R$ 6,8 bilhões a serem destinados a áreas que o governo federal definir previamente como obrigatórias. Com base na receita corrente líquida de 2012, cada congressista poderia indicar a destinação obrigatória de R$ 10,4 milhões em emendas.
Como parece inevitável a aprovação da proposta que torna as emendas parlamentares impositivas, o Congresso deverá adotar a elevada posição política de destinar 50% desse valor à área da saúde.
É um absurdo que os congressistas estejamos lutando para incrementar a verba da saúde e, no entanto, com a aprovação do Orçamento impositivo, concordemos em comprometer, anualmente, "ad aeternum", 1% da receita corrente líquida da União para o atendimento a emendas parlamentares.
Com a virtual aprovação da obrigatoriedade, o Congresso deverá impor que as emendas financiem necessariamente a área da saúde, em sintonia com o Ministério da Saúde.
Se o importante é reforçar as unidades básicas de saúde, as unidades de pronto atendimento, o Samu, que os recursos sirvam para isso. Desse modo, será possível promover benefício para a população. A obrigatoriedade do atendimento às emendas parlamentares tem que estar casada com o planejamento.
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