Prenderam Napoleão, mas tomaram cuidado para não criar um mártir
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Definitivamente derrotado em Waterloo, a 18 de junho de 1815, Napoleão ficou à mercê dos ingleses que, sob comando do Duque de Wellington acabaram com sua fama de general invencível.
Quando ele se entregou às autoridades inglesas, acompanhado por 40 criados, o pior dos destinos estava à sua espera.
Fuzilamento e forca eram os castigos mais brandos previstos nas leis daquela época, como ocorreu com o Marechal Ney, comandante de Waterloo, que tombou diante de um pelotão ordenado pelo Rei Luiz XVIII, de volta ao poder depois do Governo de 100 dias de Bonaparte.
O mesmo poderia ter sido feito com ele. O rei francês havia chamado ingleses, russos e belgas para o derrotarem, Wellington poderia ter entregue Bonaparte aos franceses, como troféu.
Preferiu, porém, cobrar a conta pela colaboração, que ficou em 700 milhões de francos.
Documentos revelam que a decisão inglesa de o que fazer com Napoleão depois de destronado não teve a marca da vingança. Temia-se que, enforcado ou executado, viraria mártir. E então sim seria eternamente invencível.
Os ingleses optaram por confiná-lo numa ilha do Atlântico Sul, chamada Santa Helena. Determinaram que seria estreitamente vigiado (já fugira, anteriormente, da ilha de Elba), mas não ficaria num presídio e sim numa casa confortável, à altura da sua posição e decorada com seus objetos pessoais e poderia circular livremente, até certos limites. Não era prisão domiciliar.
Permitiram que levasse com ele à ilha 12 pessoas de sua preferência, inclusive médico, cozinheiro, criados, mulher e amigos para ter com quem conviver e comer o que mais lhe aprouvesse.
Tiraram seus bens, mas os transformaram em valores que foram investidos e os juros utilizados para custear a sua estadia com o conforto que a renda permitisse.
Foi elaborado um memorial com instruções estritas de que Napoleão deveria ser tratado com o mínimo de “coação” possível:
Carta do Conde Nathurts, Secretário de Estado, aos Lords do Almirantado
Downing-street, 30 de julho de 1815
My Lords. Desejo que Vossas Senhorias tenham a bondade de comunicar ao Contra-Almirante Sir George Cockburn uma cópia do memorial seguinte que lhe há de servir de instrução para dirigir o seu comportamento enquanto o General Bonaparte estiver a seu cuidado.
O Príncipe Regente, confiando aos oficiais ingleses uma comissão de tanta importância, conhece que é escusado expressar-lhes seu mais ardente desejo de que não se empregue coação pessoal mais do que se julgar necessário para fielmente desempenharem as obrigações que o Almirante e o Governador de Santa Helena nunca devem perder de vista, a saber: a detenção perfeitamente segura de Bonaparte. Tudo que, não se opondo ao grande objeto pode conceder-se como indulgência, S.A.R. está convencido que se prestará ao General.
MEMORIAL
Quando o General Bonaparte sair do Bellerophon para ir para bordo do Northumberland será o momento mais propício para o Almirante Cockburn examinar os efeitos que Bonaparte leva consigo.
O Almirante deixará toda a bagagem, vinho e provisões que o General levar consigo passar para bordo do Thumberland.
Na bagagem se entenderá incluído o serviço de mesa, salvo se for tão considerável que lhe pareça mais um artigo para se converter em dinheiro corrente de que para uso real.
O seu dinheiro, diamantes e efeitos preciosos (conseguintemente também letras de câmbio), de qualquer natureza que sejam, lhe serão tirados.
O Almirante declarará ao General que o governo inglês de nenhuma sorte pretende confiscar sua propriedade, mas simplesmente tomar a sai a administração dos seus efeitos, para que ele não os empregue como meios de promover a sua fuga.
O exame será feito em presença de uma pessoa nomeada por Bonaparte; o inventário dos efeitos, que se há de reter será assinado por essa pessoa e também pelo Contra-Almirante e pela pessoa que ele nomear para fazer o inventário.
O juro do principal (segundo os seus bens forem mais ou menos consideráveis) será aplicado ao seu sustento e a este respeito se lhe deixarão as principais disposições.
Por esta razão ele pode, de quando em quando, expressar os seus desejos ao Almirante até a chegada do novo governador de Santa Helena e depois a este; e se não houver oposição às suas propostas, o Almirante ou o governador podem dar as ordens necessárias e a despesa será paga em letras sobre o Erário de S.M.
Em caso de morte, ele pode dispor de seus bens por testamento e estar seguro de que a sua última vontade será fielmente executada.
Como se pode pretender fazer parte dos seus bens por bens das pessoas que o acompanham deve-se declarar que os bens dos seus companheiros ficam sujeitos às mesmas disposições.
O General deve ser constantemente acompanhado por um oficial nomeado pelo Almirante ou se for necessário pelo governador. Se se permitir ao general sair fora dos limites em que estão sentinelas o oficial será acompanhado ao menos por um segurança.
Quando chegarem navios e enquanto estiverem à vista, o General fica estreitado aos limites em que estão postas sentinelas. Durante este tempo se proíbe toda a comunicação com os habitantes. Seus companheiros em Santa Helena são sujeitos em todo este tempo às mesmas regras e devem persistir com ele.
Deve participar-se ao general quem, se fizer alguma tentativa para fugir então será posto debaixo de prisão; e deve notificar-se seus companheiros que, se acaso se achar que eles conluiam para preparar a fuga do general serão separados dele e postos em rigorosa prisão.
Todas as cartas dirigidas ao general ou às pessoas da sua comitiva serão entregues ao Almirante que as lerá antes que permitam que sejam entregues àqueles a quem se dirigem. Cartas escritas pelo general ou por sua comitiva serão sujeitas à mesma regra.
Dar-se-ão ordens para embaraçar, depois de certo intervalo necessário que vá a Santa helena algum navio estrangeiro ou mercante.
Se o General for atacado de uma doença grave, o Almirante e o Governador nomearão um médico cada um, que goze de sua confiança, a fim de tratarem do General em comum com o seu médico.
Em caso de morte, o Almirante dará ordens para trazer o seu corpo para a Inglaterra.
Napoleão viveu na Casa de Longwood, em Santa Helena, onde foi muito bem tratado, até 5 de maio de 1821, quando, aos 51 anos, uma úlcera gástrica o levou. Suspeitou-se, mais tarde, de assassinato por arsênico, encontrado na autópsia, o que nunca ficou comprovado porque quantidades insignificantes do elemento químico e venenoso integravam seus medicamentos.
Mártir ou não, é o francês mais conhecido no mundo 200 anos depois da morte.
Napoleão morreu, mas não morreu.
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