PM não bate por acaso nem por necessidade

Obra de uma PM terceirizada por governos tucanos, a criminalização dos protestos contra Temer é a mais nova esperança de um governo espúrio, que teve votos entre senadores para derrubar Dilma mas não tem legitimidade para pacificar o país. Autorizadas de forma explícita pelo artigo 5 da Constituição, as manifestações são a resistência natural de quem não aceita a ideia de ser governado pelo medo, traço comum a todas as ditaduras.



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       Desconfie de quem pretende transformar a violência no tema principal dos protestos contra o governo Temer. É um velho truque, destinado a esconder o que mais importa: só em São Paulo mais de 100 000 foram a rua.

      Uma mobilização grandiosa, que revela um descontentamento profundo, que tende a se ampliar. Para desorientar e desorganizar uma força desse tamanho, nada mais conveniente do que a política do medo, que tenta transformar a luta política indispensável a cidadania num exercício de risco. Vamos criminalizar movimentos democráticos e, em sua essencia, pacíficos. 

         O protesto de domingo aconteceu quatro dias depois do afastamento de Dilma, numa demonstração de que mesmo seus eleitores – sem dúvida, a maioria do protesto -- não sentiram a queda da presidente como uma derrota sua, dessas que faz a pessoa ir para casa e se esconder embaixo da cama.

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         Ou porque restava pouca identidade com um governo de quem tomaram distância desde o ajuste econômico do início do mandato. Ou porque já não acreditavam na chance de uma virada no Senado e estavam prontos para prosseguir a luta por direitos – vitais, permanentes -- por outro caminho.  

         Esse comportamento mostra que o esforço de Temer para consolidar o golpismo de coalizão como um método viável de governo enfrenta mais dificuldades do que se poderia imaginar.  A resistência é maior, mais profunda. Não se assiste à capitulação imediata dos adversários, situação que costuma acompanhar a instalação de todo regime de força.

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         Terceirizada pelo principal governo estadual do PSDB, a PM não bate por casualidade. Quer machucar e fazer feridos para produzir um efeito fácil reconhecer – o governo pelo medo, traço comum a todas as ditaduras. Sua questão não é a segurança pública. Mas a proteção particular a um governo.

         Dias antes, não custa lembrar, a Dona Folha de que falou Gregório Duvivier exigiu repressão dos “fanáticos da violência”, chamados de “elite vermelha” em suas páginas, sob ameaça do país acabar como a “Alemanha dos anos 30.” 

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         Consumada a barbárie, Dona Folha nada mais pode fazer a não ser lavar as mãos. Com candura patética, lembrou que a “Polícia Militar paulista necessita preparar-se melhor para lidar com esses confrontos, a começar pela obrigação óbvia de não inicia-los”. Para quem gosta de  exemplos: a desmoralização da imprensa alemã foi uma das condições  essenciais da ascensão e sobrevivência do regimde Hitler. Depois que grandes jornais se apequenaram, os próprios os líderes da ditadura nazista lançaram suas próprias publicações e passaram a ganhar bom dinheiro com eles, recorda Ian Kershaw, em sua antológica biografia “Hitler”.

         O que se pretende, no Brasil de 2016, é construir a fantasia de que a violência terceirizada pela PM paulista contra os militantes que foram a rua denunciar Michel Temer tem uma justificativa moral, uma natureza defensiva, de quem é obrigado a enfrentar vândalos e proteger a ordem.

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         Dando sustentação ao argumento do coronel que comandou a ação policial no domingo (“a PM salvou vidas”, chegou a dizer), o governador Geraldo Alckmin partiu sem rodeios para a luta ideológica. “Querem passar a história de que a polícia é culpada. “

         A linha de raciocínio ficou mais clara graças ao tenente coronel Henrique Motta, que estava no comando das operações no Largo da Batata. Referindo-se à estudante que dias antes teve um olho perfurado, e pode ficar cega, o tenente coronel escreveu no facebook: “Quem planta rabanete colhe rabanete”.

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      Os mais antigos, com raciocínio típico da República Velha imaginavam que a questão social era caso de polícia. Não era e não é caso de porrete nem de rabanete. Sempre foi caso de política.

      Embora conjuntura possa provocar dores, ferimentos e derramamento de sangue, não há dúvida, entre o que é certo e o que é errado. Vamos parar com asneiras: a PM está totalmente errada, o governador também. 

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       Não cabe à polícia agir fora da lei e cometer crimes. Não estamos falando de uma situação com dois pontos de vista. Se parece difícil, basta fingir por um minuto que somos civilizados e ler o artigo 5 da Constituição, que define com clareza os direitos de todo cidadão e a prioridade do Estado:

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         "Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente".

        

        É disso que se trata, desde a revolução de 30. Há 86 anos. Nem Michel Temer havia nascido quando isso aconteceu.

         Claro que este mandamento não agrada autoridades sem legitimidade e sem popularidade.

         Numa situação em que o golpe de Estado foi o primeiro recurso, muito rapidamente a   violência pode tornar-se a última esperança de quem se agarra ao poder a qualquer custo.

          No Brasil, o último governo pelo medo durou 21 anos, mesmo prazo do fascismo na Itália de Mussolini, que só veio abaixo quando a resistência interna recebeu apoio de tropas estrangeiras. (Apesar de seus jornais, o nazismo não chegou a quinze anos, embora projetasse um milênio).  

       "Vivemos dias tristes para nossa democracia. Triste do país que seus cidadãos precisam aguentar tudo de boca fechada", disse o juiz Rodrigo Tellini, em sua decisão, quando mandou soltar 16 estudantes que a PM prendeu porque achava que iriam cometer atos criminosos no domingo. Assim. 

          É um sinal dos tempos viver uma situação em que um juiz de Direito merece honras de herói. Não deveria ser assim. Estamos falando da Constituição, o café da manhã que nossas autoridades juraram cumprir e fazer cumprir, todos os dias. A leitura do artigo 5 mostra que os estudantes não precisavam ser libertados na segunda feira porque nunca deveriam ter sido presos.

          Os abraços e lágrimas às portas da prisão lembram imagens do Brasil de 64, quando mães e mulheres de jovens que não se rendiam a ditadura em construção eram presos. Ali se forjou a consciência da democracia e dos direitos humanos que denunciava a tortura, inspirou o artigo 5 da Constituição e sempre foi combatida com bombas e cassetetes pela PM paulista.

         

 

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