Perguntas para o STF sobre o in(s)ulto de Daniel Silveira

O Presidente desta mesma República, humilha o Brasil ao conceder um indulto intempestivo e casuístico que, aí sim, comoveu o país. O indulto é um insulto!

Jair Bolsonaro-Daniel Silveira
Jair Bolsonaro-Daniel Silveira (Foto: Reprodução)


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O Brasil foi surpreendido no último dia de Tiradantes, inspirador da Independência do nosso país. Bolsonaro, que ocupa o lugar central do Poder Executivo, resolveu conceder uma graça (perdão) presidencial a um criminoso que atentou contra a República e sua Constituição. Alegando nas “Considerandas” de um decreto[1] republicano que havia comoção nacional na condenação de Daniel Silveira, um deputado aparentemente corrupto, porém, confessadamente (nas redes sociais) um criminoso quanto, o Presidente desta mesma República, humilha o Brasil ao conceder um indulto intempestivo e casuístico que, aí sim, comoveu o país. O indulto é um insulto! 

É fundamental deixar claro: ocupando este tão importante cargo, Jair Bolsonaro pode muito, mas não pode tudo! 

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Vamos a um esforço hermenêutico que dedique razoabilidade às questões públicas/estatais e se tente analisar o perdão presidencial a partir da formalidade e materialidade da lei. 

 Sobre o indulto ao Sr. Daniel Silveira, perguntas a fazer: 

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1) Constituição Federal, art. 84, que disciplina as competências do Presidente do Brasil: 

“XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei”. 

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O que quer dizer esse comando: "com audiência, se necessário"? Podemos afirmar que outras leis estariam a regulamentar essas "audiências" e mesmo o "necessário" como estabelecimento de critério?

 2) Decreto-Lei n° 3689/1941, ou Código de Processo Penal: 

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  “Art. 734. A graça poderá ser provocada por petição do condenado, de qualquer pessoa do povo, do Conselho Penitenciário, ou do Ministério Público, ressalvada, entretanto, ao Presidente da República, a faculdade de concedê-la espontaneamente.” 

O fato desta Lei de 1941, portanto, muito antes da promulgação da Constituição de 1988, afirmar que há uma possibilidade de o Presidente da República poder "conceder a graça de forma espontânea", quer dizer que não se deve obedecer a critérios "necessários" e passar pelo crivo de "audiência" que reza o art. 84, XII, da CF-1988? A "ressalva" que reza o dispositivo não seria apenas para a ausência do peticionamento externo? Um agir por auto-provocação (à exemplo, o STF ter instaurado o Inquérito 4.781/DF - das fake News, cuja atipicidade do poder investigativo da República restou evidenciada a partir de uma excepcionalidade que se baseou no art. 43 do Regimento Interno da Corte) não requer oitivas e protocolos (audiências)? 

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Finalmente, 3) Lei 7.210/1984, ou Lei de Execução Penal: 

“Art. 189. A petição do indulto, acompanhada dos documentos que a instruírem, será entregue ao Conselho Penitenciário, para a elaboração de parecer e posterior encaminhamento ao Ministério da Justiça”. E, “Art. 191. Processada no Ministério da Justiça com documentos e o relatório do Conselho Penitenciário, a petição será submetida a despacho do Presidente da República, a quem serão presentes os autos do processo ou a certidão de qualquer de suas peças, se ele o determinar”. 

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Culminados estes dois artigos da LEP, não resta claro que há um fluxo processual a ser seguido, mesmo que obedecendo a espontaneidade do Presidente da República para a ato de petição[2] no auto provocar-se? Face que a Constituição de 88 determina “audiência” e a Lei de 1984, portanto, posterior a de 1941, atribuir o critério de “audiência” do Conselho Penitenciário, não estaria eivado de ilegalidade o Decreto do Indulto do Sr. Daniel Silveira? 

 Feitas estas inquirições sujeitas a análises outras na hermenêutica jurídica e diante de um fato de (anti) repercussão geral, as jurisprudências (e suas maiorias) no Pleno do Supremo estão passíveis de serem reinterpretadas sobre questões de indultos presidenciais, neste evento, casuístico, a fim de não se abrir um precedente perigoso a outros atos irresponsáveis de quem detém poder na República e não obedece – na maioria dos casos – à responsabilidade do cargo? 

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 Indaga-se, por derradeiro, neste caso aos partidos políticos, legitimados para propor o controle de constitucionalidade, se não é o caso de se impetrar uma Arguição de Descumprimento de Prefeito Fundamental (ADPF) provocando a Suprema Corte a se manifestar sobre a efetiva noção de garantia da liberdade e da liberdade de expressão por parte do réu beneficiado versus o real interesse da coletividade, ameaçada diretamente por uma ruptura da democracia que é um dos mais caros direitos de uma sociedade? 

 Ou a pergunta ao inverso, se a estratégia da Ação não se tramitaria no exigir do Poder Judiciário a Declarar a Constitucionalidade da última parte do artigo 734 do Decreto-Lei n° 3689/1941 (Código de Processo Penal), especificamente este comando: “ressalvada, entretanto, ao Presidente da República, a faculdade de concedê-la espontaneamente”; se guarda simetria constitucional com o art. 84, XII, da Constituição Federal no tangível à necessidade de se exigir “audiência”, isto é, por força de outras normas, ao menos se ouvir o parecer do Conselho Penitenciário, nos termos do art. 189 da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução Penal)?  

[1] No Decreto de 21 de abril de 2022, o último considerando chega a nos dar ojeriza. “Considerando que a sociedade encontra-se em legítima comoção (...)”. 

Faz a gente pensar que o Presidente do Brasil, ou é muito dissimulado com requintes de sociopatia, ou tem alguma deficiência mental que o retira de racionalidade objetiva. Como pode dizer que o povo brasileiro se comoveu com a condenação do deputado Daniel Silveira? Qual é a pesquisa que demonstra essa comoção? Há manifestações nas ruas acerca disso? Pelo menos uma entrevista de algum cidadão em prantos de dor pelo tal feito do STF diante deste Sr., se viu? Ou seja: o Brasil, ou não acompanhou a repercussão deste julgamento, ou se acompanhou, torceu pela condenação deste réu em comento (à exceção dos 25% de bolsonaristas alienados por vídeos produzidos com enviesamento dos fatos). 

[2] Ainda é relevante fazer uma pergunta sobre os comandos desta Lei. Em seu artigo 188, in verbis: “O indulto individual poderá ser provocado por petição do condenado, por iniciativa do Ministério Público, do Conselho Penitenciário, ou da autoridade administrativa”. Podemos inferir que no conjunto das “autoridades administrativas”, está o Presidente da República, que tem esta competência de peticionar, ou auto-peticionar a provocação do indulto? 

A pergunta, neste caso, se fez existir porque tem sido bastante veiculado pela imprensa a manifestação de diversos juristas em que analisam o Princípio da Impessoalidade regido pelo Art. 37 da CF-1988. Ora, este valor principiológico é atribuída aos agentes públicos, os que são, entre outras, autoridades públicas. Se o Presidente está para a dimensão de autoridade pública neste escopo, também está para a interpretação de que deve, como autoridade pública, mesmo que tendo a competência de oferecer o indulto ao criminoso que queira dedicar perdão, passar pelo Relatório do Conselho Penitenciário. O indulto não deixa de acontecer. A discricionariedade permanece sendo do Presidente. Entretanto, há que ser acompanhada do parecer, nos termos da lei.

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