Pelo direito de ser no trabalho
É preocupante a aliança do vice-presidente Michel Temer com setores fundamentalistas do parlamento que não aceitam a diversidade humana e atuam para que a legislação só reconheça como sujeito de direitos o padrão homem, branco, heterossexual e proprietário
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Quando pensamos no Dia Internacional do Trabalhador, logo nos remetemos a uma extensa pauta de reivindicações em prol da redução da jornada de trabalho, da garantia de direitos sociais e trabalhistas, da luta por aumento real de salário, enfim, de uma série de melhorias das condições de vida de trabalhadores e trabalhadoras.
Rememoramos as grandes lutas históricas, a exemplo daquela travada em 1º de maio de 1886, em Chicago, EUA, quando trabalhadores por realizarem uma greve geral com objetivo de exigir uma jornada de trabalho de oito horas diárias, foram perseguidos, presos e mortos pelas forças policias. Este fato emblemático da opressão vivida pelo operariado transformou-se na origem de uma data de comemoração e luta de todos os trabalhadores e trabalhadores em nível mundial.
Partindo do pressuposto de que o trabalho continua cumprindo um papel de centralidade na vida contemporânea e pensando o trabalho como expressão fundante do ser humano - definidor de suas diversas formas de sociabilidade -, é necessário trazer também para este contexto as discussões sobre quem é esse trabalhador do século XXI, que não pode ser mais visto apenas como um apêndice de máquinas, mero recurso, mas, sobretudo, como um ser humano na sua integralidade.
A sociedade contemporânea trouxe em seu bojo uma infinidade de transformações sociais, econômicas, políticas e culturais, que produziram mudanças nos modos de ser dos sujeitos e em suas formas de agir na sociedade. Invariavelmente, essas mudanças tiveram implicações, também, no mundo do trabalho.
Esse novo contexto marcado pela flexibilidade, transitoriedade, efemeridade e descontinuidade produziu alterações significativas na relação entre identidade e trabalho. Se antes todos os trabalhadores e trabalhadores eram encerrados no interior do conceito totalizante de classe trabalhadora, atualmente, nos deparamos com o desafio das especificidades, de identidades múltiplas e cambiantes.
Somos trabalhadores e trabalhadoras, mas não deixamos de ser homens, mulheres, gays, lésbicas, transexuais, pais, mães, negros, indígenas, religiosos, ateus, e tantas outras formas de ser e estar no mundo. Portanto, o universo do trabalho não pode retirar de nós mesmos a nossa complexa condição de humanidade, nossa história, raízes, crenças, comportamentos e desejos.
Neste aspecto, é fundamental o debate acerca do respeito aos direitos humanos e à diversidade no contexto do mundo trabalho. São recorrentes casos de mulheres que sofrem assédio moral e sexual; de homossexuais alvos de violência, que vão desde a atribuição de tarefas secundárias, até piadas homofóbicas; ou mesmo de negros e negras, historicamente subalternizados. Preconceitos e discriminações produzem enorme sofrimento psíquico, desestruturam as relações e tornam o ambiente de trabalho extremamente insalubre.
Enfrentar essa realidade requer lutar por reconhecimento, pela legitimidade de assumir as identidades que nos constituem enquanto seres humanos, na perspectiva de que o trabalho pode e deve ser um ambiente acolhedor às diversidades, de que é possível ao trabalhador reafirmar sua própria humanidade no trabalho.
O reconhecimento da diversidade e das especificidades inerentes a cada um desses segmentos minorizados é o primeiro passo para a construção de um ambiente aberto à diferença, a uma cultura de valorização e respeito à alteridade.
Do ponto de vista das organizações, estudos recentes comprovam que o encontro dos diferentes têm impactos positivos na própria dinâmica laboral, uma vez que proporciona um terreno fértil para o desenvolvimento criativo, o florescimento de novas ideias, de soluções inovadoras para problemas cotidianos.
As questões identitárias e sua inter-relação com o universo do trabalho não podem ser negligenciadas ou tratadas como menores, pois elas trazem inúmeros novos desafios que se impõem cada vez mais às organizações, às políticas públicas governamentais e ao próprio parlamento.
Ao mesmo tempo em que necessitamos reafirmar esses novos modos de ser e estar no mundo, vivemos um período em que a defesa dos direitos humanos dos segmentos historicamente oprimidos passa por fortes ameaças, pois o Brasil atravessa um momento de recrudescimento dos discursos de ódio e intolerância.
É preocupante a aliança do vice-presidente Michel Temer com setores fundamentalistas do parlamento que não aceitam a diversidade humana e atuam para que a legislação só reconheça como sujeito de direitos o padrão homem, branco, heterossexual e proprietário.
Há, ainda, uma aliança construída nas sombras com setores conservadores do empresariado brasileiro para que Temer possa ser conduzido ao poder sem a legitimidade das urnas. A ruptura com a legalidade democrática instaurará um amplo processo de perda de direitos, ao colocar em risco não somente conquistas sociais e trabalhistas, mas por comprometer o avanço da perspectiva de aprofundamento da própria democracia e das liberdades.
Objetivamente, trata-se do desmantelamento de inúmeras políticas públicas transversais e intersetoriais que objetivam a construção de uma sociedade menos desigual e injusta, a exemplo, de programas como o Pró-Equidade de Gênero e Raça, adotado pela Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, voltado para a construção da igualdade entre homens e mulheres em empresas públicas e privadas.
Mais do que nunca é preciso reafirmar que o direito à cidadania, à diversidade e à dignidade humana está umbilicalmente ligado ao Estado Democrático de Direito. Não há direitos sem democracia, nem democracia sem a garantia de direitos humanos fundamentais.
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