Paulo Coelho merece um Nobel
Para mim, por mim, Paulo Coelho já ganhou o Prêmio Nobel de caráter, de bom-caráter. Para mim, por mim, é fora de dúvida o valor estético do que ele criou ao lado de Raul Seixas – ora, o Brasil inteiro já reconhece esse valor e canta suas canções até hoje. Reconheço que devo ler com urgência o que ele escreveu ao longo da sua laboriosa vida
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Quando o governo fascista de Bolsonaro cortou o patrocínio do Festival de Jazz do Capão, na Bahia, sob os argumentos mais reacionários, o escritor Paulo Coelho tomou uma atitude prática, da trincheira da humanidade. Ele anunciou sem demora:
"A Fundação Coelho & Oiticica se oferece para cobrir os gastos do Festival do Capão, solicitados via Lei Rouanet. Entrem em contato via DM [mensagem privada] pedindo a alguém que sigo aqui que me transmita. Única condição: que seja antifascista e pela democracia" (Negrito meu)
Ontem, 22 de julho, veio a confirmação da promessa nas redes sociais do escritor: “Festival do Capão, antifascista e democrático. Transferência feita, avisem quando chegar".
Viva! A questão, a felicidade que dá na gente o seu gesto, não é só da grana, dos 145 mil reais transferidos. Pelo que se sabe de Paulo Coelho, ele seria capaz de oferecer até mais. A questão e a felicidade são: primeiro, a condição com que ele transfere o dinheiro, de o Festival ser antifascista e democrático; segundo, é o momento de luta e luto que atravessamos no país destruído pelos piores excrementos da sociedade brasileira.
Para mim, por mim, Paulo Coelho já ganhou o Prêmio Nobel de caráter, de bom-caráter. Para mim, por mim, é fora de dúvida o valor estético do que ele criou ao lado de Raul Seixas – ora, o Brasil inteiro já reconhece esse valor e canta suas canções até hoje. Mas para mim e por mim, eu que tenho sido tão preconceituoso em minhas leituras, reconheço que devo ler com urgência o que ele escreveu ao longo da sua laboriosa vida. Enquanto não começo o caminho perdido, posso agora recuperar um texto que escrevi há algum tempo, quando imaginei o dia em que Paulo Coelho recebe o Prêmio Nobel de Literatura. Espero que tenha sido mais que imaginação. E vamos ao texto que pode ser uma profecia.
A notícia correu o mundo desde a manhã. The Guardian, The Times anunciaram em primeira mão: o escritor Paulo Coelho, um dos mais importantes autores de língua inglesa do século, é o vencedor do Prêmio Nobel de Literatura. E mais: “a Academia sueca, que decide quem vai receber o prestigioso prêmio de US$ 1,5 milhão, fez o anúncio descrevendo Mr. Coelho como um ‘autor de épicos sobre a experiência mística, que, com fervor e poder visionário, expôs uma civilização dividida entre o ser e o pós-ser’ ”. Os brasileiros, ainda mal inseridos no mundo globalizado, bem que tentam repor o Nobel em seu lugar de origem.
O Globo, após alguns salamaleques de ofício à civilização inglesa, ousa insinuar que Paulo Coelho é brasileiro, da cidade do Rio de Janeiro, com residência física em Copacabana. Mas que, a julgar pela qualidade das traduções dos seus livros para o “idioma de Shakespeare”, é compreensível que divida as honras com o antigo império. A Folha de São Paulo, em sua natural objetividade, exclama que o autor Paulo Coelho é tão bom, que mais deveria ser dito que ele está em um patamar além-Brasil. Mas um pouco antes do prêmio, os seus críticos literários haviam escrito que para o Senhor Paulo Coelho, em lugar de um patamar, o mais próprio seria um patíbulo. Mas agora tudo é diferente: “Os seus livros trazem um resumo da filosofia de vida de Coelho e são baseadas nas histórias e fatos de diferentes culturas e partes do mundo.”
O fato, descobrem: Paulo Coelho é o autor brasileiro – natural do Brasil – mais lido em todo o mundo. O Alquimista é um dos mais importantes fenômenos impressos dos séculos XX e XXI. Por isso os chefes de redação se põem à caça do Nobel japonês Kenzaburo Oe, para arrancar dele frases de sagração, como antes o autor japonês dissera: “Paulo Coelho conhece o segredo da alquimia literária". Os textos de vitória da seleção brasileira da literatura vêm nas páginas com destaques do gênero “Paulo Coelho é um dos cinco autores mais vendidos do mundo. Mas em vez de oferecer aos leitores relatos aliciantes de violência, sexo ou suspense, Coelho escreve acerca de pessoas normais que se colocam em situações extraordinárias com a finalidade de incentivarem o seu eu interior, e fá-lo com uma prosa simples e despretensiosa." Ora, que tesouro tínhamos e não sabíamos.
Por isso agora os repórteres cercam o mago, que mal teve tempo de pôr de lado o seu grandioso arco. Eles vêm em horda, simpáticos, cordiais, íntimos, íntimos como só os repórteres conseguem ser.
– É verdade que o senhor escreveu O Alquimista em quinze dias?
– Sim. Todos os meus livros são escritos num período de duas a quatro semanas.
– O que faz um Nobel de Literatura?
– Escreve.
– E que mais?
– Bebe, come... e descome. Mas só se o sistema digestivo estiver em paz com as melhores obras.
– Entendo.... O senhor é um demônio? (Outras vozes) O senhor é alquimista? O senhor é autobiográfico?
– Acredito no conceito "Anima Mundi"…
– Entendi... Vários de seus livros são narrados do ponto de vista feminino. Como um homem consegue retratar tão fielmente as mulheres?
– Quando escrevo um livro estou sobretudo tentando resolver algo comigo mesmo.
– Mas o senhor é gay? O senhor já teve experiência gay? Quais são seus autores preferidos?
– Borges, William Blake, Jorge Amado, Henry Miller.
– Só?
– Só?! Agora eu pergunto ao repórter tão cumpridor da sua pauta: que livros o senhor já leu de Paulo Coelho?
– Muitos. O Alqumista. O Bruxo…
– Hum... Mas o que o jovem gostou mais do livro “O Bruxo”?
- Ah, de tudo, não é?
– Maravilha.
– O senhor sabia que o publicitário Olivetto declarou que o senhor é a nossa Coca-Cola?
– Lindo. E qual o slogan do produto, eu poderia saber?
– Paulo Coelho é que é.
O escritor, como um guerreiro da luz, então pega o arco e a flecha. E aponta. Os repórteres, ainda que não tenham lido a Odisseia, e por isso não lembrem da volta de Odisseu ao palácio, os repórteres ainda assim abandonam o campo, rápido. Não há cultura mais urgente que a da autopreservação.
Enquanto correm não sabem que na Europa, nos Estados Unidos e na Ásia toda a imprensa proclama já o valor do novo Nobel de Literatura. Assim foi, assim é para o novo Nobel: primeiro, estranha-se, depois entranha-se.
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