Para um novo ano
Aprendemos agora, quando a serpente chega e morde as nossas vidas, que não há conquistas e defesas inexpugnáveis contra o fascismo
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Há três anos, assim víamos o futuro:
Sem o talento dos adivinhadores para os dias que virão, desejamos da realidade futura algo diverso e de menor peso que hoje. Queremos apenas saber como o nosso destino será inscrito no destino de toda a humanidade nos próximos dias. Se o futuro que se quis se faz no presente, se o futuro imediato se faz ao fim deste presente fugaz, então o mais longe, que bem desejamos, não será feito sem a intervenção da nossa vontade. Vontade ativa, que vai além do perguntar à rosa dos ventos para que lado sopra o futuro.
Hoje, percebo que a reflexão abstrata nada sabia do governo Bolsonaro. Sentia os sinais da serpente, ouvia o chocalho da sua cauda, mas não lhe via a cara no escuro. Pois era difícil prever toda a desgraça há três anos. É sempre um vício nosso ver o futuro como uma extensão do presente. Então aprendemos agora, quando a serpente chega e morde as nossas vidas, que não há conquistas e defesas inexpugnáveis contra o fascismo. O combate é permanente e sem trégua, sem intervalo para descanso. Aquele provérbio romano de antes, que tantas vezes esquecemos: se queres a paz, prepara-te para a guerra.
É certo que esse provérbio muitas vezes é citado por ferrenhos anticomunistas. Mas a advertência é universal, as armas que procuram para nos destruir, com mais razão devemos tê-las na medida de nossas forças. Opomos à cultura das armas as armas da cultura, inclusive. Intranquilos, mas serenos, se assim podemos dizer. O certo é que antes dormíamos em insensata paz, uma vez que não esperávamos o assalto destruidor às conquistas históricas do povo, como se elas estivessem para sempre consolidadas. Então, se possuímos hoje a visão, ainda difusa, de onde erramos, o que devemos fazer para a frente?
Eu gostaria muito de possuir o talento de um analista político de gênio, algo como o vigor prático do pensamento de um Lênin. Dirão, com acerto, “o rapaz não quer nada...”. Mas como semelhante altura é impossível, nem por isso devemos nos conformar com a falta da arma específica. Mudemos de arma. Assim como um coxo muda o seu andar a seu pesar, mudemos para uma lâmina à nossa maneira.
Pois a vida é o que resiste, pude escrever no mais recente romance “A mais longa duração da juventude”. Com ele, pude ver a contradição mais estranha, que a vida, tão breve, é tudo que resiste. Então agora, neste presente do último dia do calendário, que se dirige para o futuro na resistência, que é vida, podemos desejar. Queremos as formas e conteúdos de todas as resistências, de todas as maneiras. “Abaixo, fora, Bolsonaro” se tornou uma unidade de todos os modos para o 2021 que desejamos.
E seja o que nossa resistência quiser. E permitir.
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