Ouvidos de mercador

Sabe-se agora porque o senador mineiro Aécio Neves nunca disse uma palavra sobre o maior desastre ecológico do país, o de Mariana. É que foi no seu governo, em 2007, que o Estado concedeu a licença prévia à Samarco para a construção da barragem de Fundão

Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) realiza sabatina interativa de indicados para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). À bancada, senador Aécio Neves (PSDB-MG). Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) realiza sabatina interativa de indicados para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). À bancada, senador Aécio Neves (PSDB-MG). Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado (Foto: Ribamar Fonseca)


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Sabe-se agora porque o senador mineiro Aécio Neves nunca disse uma palavra sobre o maior desastre ecológico do país, o de Mariana, em seu Estado, que poluiu o rio Doce, destruiu cidades, causou prejuízos incalculáveis aos moradores da região e danos irreparáveis ao meio ambiente, além de 17 mortes. É que foi no seu governo, em 2007, que o Estado concedeu a licença prévia à Samarco para a construção da barragem de Fundão, licença essa que, segundo o Ministério Público, "foi decisiva para que ocorresse a tragédia". Está explicado agora, também, porque a TV Globo fez verdadeira acrobacia para esconder, ao noticiar o fato, o governo responsável pela concessão da licença: quis preservar o senador tucano, sempre blindado nas notícias negativas.

A exemplo do que há anos faz com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, sobre quem não publica nenhuma noticia desabonadora – nem mesmo quando alguém o acusa de receber propina – essa mídia também evita veicular qualquer nota contraria ao presidente nacional do PSDB. Em compensação, escandaliza qualquer coisa, até mesmo mentiras, contra o ex-presidente Lula ou contra a presidenta Dilma Roussef, não poupando nem mesmo os familiares de ambos, na esperança de que isso possa servir para alijá-los do poder e da politica. Na busca desesperada para encontrar algo contra os dois, vale qualquer coisa, até mesmo uma suposta influência do ex-marido da Presidenta, o advogado Carlos Araujo, junto ao governo, para destravar empréstimos.

A reportagem, de capa, foi publicada pela revista "Época", da Globo, sem qualquer prova, apenas para produzir desgastes junto à opinião pública, pois o que não falta é anencéfalo que dê crédito a semelhante matéria. O ex-ministro Delfim Neto, aliás, recentemente declarou: "Eu fico espantado como as pessoas acreditam na imprensa!" É o caso, por exemplo, do deputado Caio Narcio, do PSDB mineiro, que considerou a acusação ao ex-marido da Presidenta de "muito grave". Estranhamente, porém, ele não viu gravidade na acusação a FHC e Aécio sobre o recebimento de propinas de milhões de reais. Na verdade, nem ele e muito menos a mídia, que se esforça para esconder tudo o que possa atingir os dois líderes tucanos que, posando de vestais, cinicamente vivem apontado o dedo sujo para os outros.

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Eles também são poupados pelos investigadores que atuam nas operações Lava-Jato e Zelotes, os quais estão empenhados em pegar Lula, incluindo nessa caçada até mesmo familiares do ex-presidente. Para eles os fins justificam os meios e, por isso, chegam a pressionar os presos, segundo denúncia de advogados, para que, em delação premiada, incriminem Lula de alguma coisa. O deputado Wadih Damous, do PT do Rio, ao criticar o comportamento dos investigadores, disse que "o relato de advogados de defesa é que sempre se pergunta acerca do Lula, como se houvesse um direcionamento. Isso é um lixo jurídico." O parlamentar considerou um "absurdo" a transformação de órgãos do Estado em "órgãos de exceção", confirmando o que disse o advogado Técio Lins e Silva, segundo o qual a atuação da Lava-Jato é pior do que na ditadura.

Recentemente mais de 100 advogados, em carta aberta sobre a Operação Lava-Jato, acusaram os seus condutores de desrespeitarem "os direitos e garantias fundamentais dos acusados". A certa altura, diz a carta: "O menoscabo à presunção de inocência, ao direito de defesa, à garantia da imparcialidade da jurisdição e ao princípio do juiz natural, o desvirtuamento do uso da prisão provisória, o vazamento seletivo de documentos e informações sigilosas, a sonegação de documentos às defesas dos acusados, a execração pública dos réus e a violação às prerrogativas da advocacia, dentre outros graves vícios, estão se consolidando como marca da Lava Jato, com consequências nefastas para o presente e o futuro da justiça criminal brasileira".

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A reação à manifestação dos advogados, evidenciando corporativismo, foi imediata. O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo Costa, interpretou a carta como uma forma de pressão e uma tentativa para desqualificar as investigações. Mas acabou se traindo em seguida, ao afirmar que "eles tiraram de lado a necessidade de provar a inocência dos clientes deles": confirmou com essa declaração a acusação dos advogados de que na Lava-Jato desapareceu a presunção de inocência, prevalecendo a de que todos são culpados até provarem que são inocentes. Afinal, de acordo com os preceitos de justiça, não são os advogados que devem provar a inocência dos presos, mas os acusadores é que tem de provar a culpabilidade deles.

A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), também se manifestou para condenar a carta dos advogados. Em nota disse que o trabalho da Justiça Federal é "imparcial e exemplar". A Justiça, como instituição, obviamente deve ser imparcial, mas não é isso o que se observa no comportamento de alguns juízes. A Associação Nacional dos Procuradores da Republica igualmente criticou, em nota, a carta dos advogados, dizendo, entre outras coisas, que a operação atende "aos anseios de uma sociedade cansada de presenciar uma cultura da impunidade no que diz respeito à corrupção e às organizações criminosas". E finaliza afirmando que não existe qualquer evidência de que o MPF "esteja vazando informações indevidas, porque esta prática não é adotada por Procuradores da República".

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Os mais de 100 advogados, em sua carta, ao contrário do que pretende fazer crer a Associação dos Procuradores, não questiona o combate à corrupção realizado pela operação Lava-Jato, que realmente atende aos anseios da sociedade, mas os métodos adotados, que afrontam o estado democratico de direito. Quanto ao vazamento seletivo de informações, referido na nota, até hoje não houve nenhuma acusação ao Ministério Público que, no entanto, peca por omissão, na medida em que não toma nenhuma providência para impedi-lo, tornando-se, desse modo, conivente. E o resultado é que, com tais vazamentos, os presos são humilhados e enxovalhados. O renomado advogado Lins e Silva disse, a propósito, que "não é normal colocar fotos de investigados, fotos do prontuário, com dados sigilosos, para humilhar", como aconteceu com a capa da revista "Veja". E nenhum dos órgãos envolvidos nas investigações sequer se manifestou sobre o fato. Isso é certo?

O que surpreende é que os poderes maiores, o Supremo Tribunal Federal e o Conselho Nacional de Justiça, parecem fazer ouvidos de mercador para os fatos denunciados. Talvez por isso tem gente que já diz ter saudades da ministra aposentada Eliane Calmon.

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